segunda-feira, 30 de novembro de 2009

SEMANA - ESTUDO DO EVANGELHO - CAPÍTULO 10 ÍTEM 1 - MARIA J. CAMPOS


PERDOAI, PARA QUE DEUS VOS PERDOE

FONTE BÁSICA

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

1. Por que os misericordiosos obterão misericórdia?
Porque somos regidos pela lei de causa e efeito, estabelecida pela sabedoria divina; assim, do modo côo agimos para com os outros, do mesmo modo agirão para conosco.

Sendo Deus a suprema misericórdia, quem não for misericordioso estará em sofrimento, por contrariar Sua lei..

2. Como se aplica a lei de causa e efeito, no caso do perdão?
Somente perdoando aos homens é que obteremos o perdão de Deus.

Deus nos criou para sermos felizes e onde há ódio não existe felicidade: quem não perdoa não pode ser feliz.

3. Que atitude devemos tomar, quando formos ofendidos por alguém?
Devemos procurá-lo em particular, para esclarecer a situação e buscar o entendimento, pondo fim à discórdia..

“Se contra vós pecou vosso irmão, ide fazer-lhe sentir a falta em particular, a sós com ele”.

4. De acordo com os ensinamentos de Jesus, até quantas vezes devemos perdoar ao irmão que os ofende?
Não há limite para o perdão: Jesus nos ensina a perdoar sempre.

“Jesus nos ensina que a misericórdia não deve ter limites, quando diz que cada um perdoe seu irmão, não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes”.

5. Em que consiste a misericórdia?
No esquecimento e no perdão das ofensas recebidas – atitudes próprias da alma elevada, que paira acima dos golpes que lhe possam desferir, e é toda calam, mansidão e caridade.

“A misericórdia é o complemento da brandura, porquanto aquele que não for misericordioso não poderá ser brando e pacífico”.

6. Quais as característica do espírito que não perdoa as ofensas recebidas?
Este é sempre ansioso, de sombria suscetibilidade, ressentindo-se por tudo e cheio de amargura; vê no próximo o inimigo, nunca o irmão.

Lembremo-nos de que o agressor sempre tem razão: se demos motivo, é justo que se ressinta; se não demos, é um infeliz que deus confia ao nosso amparo.

7. Para que haja o perdão verdadeiro, basta-nos dizer que perdoamos?
Não. O perdão verdadeiro não é o dos lábios, mas o do coração nobre e generoso, sem pensamento oculto, que evita, com delicadeza, ferir o amor próprio e a suscetibilidade do adversário, ainda quando este ultimo nenhuma justificativa possa ter.

É impossível uma reconciliação sincera de parte a parte quando o ofendido estende a mão ao ofensor com arrogância e ostentação.

8. É vergonhoso buscar a conciliação e a paz, perdoando a quem nos ofende?
Não. A lição de hoje nos ensina que, em qualquer desentendimento, o espírito mais elevado mostra-se mais conciliador e, com esta atitude, obterá sempre a simpatia das pessoas de bem e as graças de Deus.

Achamos difícil perdoar porque somos ainda almas inferiores, distanciadas de Deus, que compassivo, nossa decisão de cumprir Sua lei de amor.

Conclusão:
Somos regidos pela lei de causa e efeito, que nos faz experimentar as mesmas situações que proporcionamos aos outros; portanto, sejamos misericordiosos, para que possamos obter misericórdia; e perdoemos sempre, para que sejamos perdoados pelos homens e por Deus.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

ESTUDO DO LIVRO NOSSO LAR - CAPÍTULO 22 - JULIANA SOLARE


O BÔNUS-HORA

Notando que a senhora Laura entristecera subitamente ao recordar o marido, modifiquei o rumo da palestra, interrogando:
- Que me diz do bônus-hora? Trata-se de algum metal amoedado?
Minha interlocutora perdeu o aspecto cismativo, a que se recolhera, e replicou, atenciosa:
- Não é propriamente moeda, mas ficha de serviço individual, funcionando como valor aquisitivo.
- Aquisitivo? - perguntei abruptamente.
- Explico-me - respondeu a bondosa senhora -; em "Nosso Lar" a produção de vestuário e alimentação elementares pertence a todos em comum. Há serviços centrais de distribuição na Governadoria e departamentos do mesmo trabalho nos Ministérios. O celeiro fundamental é propriedade coletiva.
Ante meu gesto silencioso de espanto, acentuou:
- Todos cooperam no engrandecimento do patrimônio comum e dele vivem. Os que trabalham, porém, adquirem direitos justos. Cada habitante de "Nosso Lar" recebe provisões de pão e roupa, no que se refere ao estritamente necessário; mas os que se esforçam na obtenção do bônus-hora conseguem certas prerrogativas na comunidade social. O espírito que ainda não trabalha, poderá ser abrigado aqui; no entanto, os que cooperem podem ter casa própria. O ocioso vestirá, sem dúvida; mas o operário dedicado vestirá o que melhor lhe pareça; compreendeu? Os inativos podem permanecer nos campos de repouso, ou nos parques de tratamento, favorecidos pela intercessão de amigos; entretanto, as almas operosas conquistam o bônus-hora e podem gozar a companhia de irmãos queridos, nos lugares consagrados ao entretenimento, ou o contacto de orientadores sábios, nas diversas escolas dos Ministérios em geral. Precisamos conhecer o preço de cada nota de melhoria e elevação. Cada um de nós, os que trabalhamos, deve dar, no mínimo, oito horas de serviço útil, nas vinte e quatro de que o dia se constitui. Os programas de trabalho, porém, são numerosos e a Governadoria permite quatro horas de esforço extraordinário, aos que desejem colaborar no trabalho comum, de boa-vontade. Desse modo, há muita gente que consegue setenta e dois bônus-hora, por semana, sem falar dos serviços sacrificiais, cuja remuneração é duplicada e, às vezes, triplicada.
- Mas, é esse o único título de remuneração? - perguntei.
- Sim, é o padrão de pagamento a todos os colaboradores da colônia, não só na administração, como também na obediência.
Lembrando as organizações terrestres, indaguei, espantado:
- Todavia, como conciliar semelhante padrão com a natureza do serviço? O administrador ganhará oito bônus-hora na atividade normal do dia, e o operário do transporte receberá a mesma coisa? Não é o trabalho do primeiro mais elevado que o do segundo?
A senhora sorriu à pergunta e explicou:
- Tudo é relativo. Se, na orientação ou na subalternidade, o trabalho é de sacrifício pessoal, a expressão remunerativa é justamente multiplicada.
Examinando, porém, mais detidamente a sua pergunta, precisamos, antes de mais nada, esquecer determinados prejuízos da Terra. A natureza do serviço é problema dos mais importantes; contudo, na própria esfera da crosta é que o assunto apresenta solução mais difícil. A maioria dos homens encarnados está simplesmente ensaiando o espírito de serviço e aprendendo a trabalhar nos diversos setores da vida humana. Por isso
mesmo, é imprescindível fixar as remunerações terrestres com maior atenção. Todo o ganho externo do mundo é lucro transitório. Vemos trabalhadores obcecados pela questão de ganhar, transmitindo fortunas vultosas à inconsciência e à dissipação; outros amontoam expressões bancárias que lhes servem de martírio pessoal e de ruína à família. Por outro lado, é indispensável considerar que setenta por cento dos administradores terrenos não pesam os deveres morais que lhes competem, e que a mesma porcentagem pode ser adjudicada a quantos foram chamados à subordinação. Vivem, quase todos, a confessar ausência do impulso vocacional, recebendo embora os proventos comuns aos cargos que ocupam. Governos e empresas pagam a médicos que se entregam à exploração de interesses outros e a operários que matam o tempo. Onde, aí, a natureza de serviço? Há técnicos de indústria econômica, que nunca prezaram integralmente a obrigação que lhes assiste e valem-se de leis magnânimas, à maneira de moscas venenosas no pão sagrado, exigindo abonos, facilidades e aposentadorias. Creia, porém, que todos pagarão muito caro a displicência. Parece ainda distante o tempo em que os institutos sociais poderão determinar a qualidade de serviço dos homens, porque, para o plano espiritual superior, não se especificará teor de trabalho, sem a consideração dos valores morais despendidos.
Essas palavras despertavam-me para concepções novas. Percebendo-me a sede de instrução, a interlocutora continuou:
- O verdadeiro ganho da criatura é de natureza espiritual e o bônus hora, em nossa organização, modifica-se em valor substancial, segundo a natureza dos nossos serviços. No Ministério da Regeneração, temos o Bônus-Hora Regeneração; no Ministério do Esclarecimento, o Bônus-Hora Esclarecimento, e assim por diante. Ora, examinando o provento espiritual, é razoável que a documentação de trabalho revele a essência do serviço. As aquisições fundamentais constituem-se de experiência, educação, enriquecimento de bênçãos divinas, extensão de possibilidades. Nesse prisma, os fatores assiduidade e dedicação representam, aqui, quase tudo.
Em geral, em nossa cidade de transição, a maioria prepara-se com vistas à necessidade de regresso aos círculos carnais. Examinando esse princípio, é natural que o homem que empregou cinco mil horas, em serviços regeneradores, tenha efetuado esforço sublime, a benefício de si mesmo; o que despendeu seis mil horas de atividade, no Ministério do Esclarecimento, estará mais sábio. Poderemos gastar os bônus-hora conquistados; entretanto, é mais valioso ainda o registro individual da contagem de tempo de serviço útil, que nos confere direito a preciosos títulos.
Semelhantes instruções interessavam-me profundamente.
- Poderemos, porém, gastar nossos bônus-hora a favor dos amigos? - indaguei curioso.
- Perfeitamente - disse ela -; poderemos repartir as bênçãos de nosso
esforço com quem nos aprouver. Isto é direito inalienável do trabalhador fiel.
Contam-se por milhares as pessoas favorecidas em "Nosso Lar", pela movimentação da amizade e do estimulo fraternal.
A essa altura, a genitora de Lis ias sorriu e observou:
- Quanto maior a contagem do nosso tempo de trabalho, maiores intercessões podemos fazer. Compreendemos, aqui, que nada existe sem preço e que para receber é indispensável dar alguma coisa. Pedir, portanto, é ocorrência muito significativa na existência de cada um. Somente poderão rogar providências e dispensar obséquio os portadores de títulos adequados, entendeu?
- E o problema da herança? - inquiri de repente.
- Não temos aqui demasiadas complicações - respondeu a senhora Laura, sorrindo. Vejamos, por exemplo, o meu caso. Aproxima-se o tempo do meu regresso aos planos da crosta. Tenho comigo três mil Bônus-Hora-Auxílio, no meu quadro de economia pessoal. Não posso legá-los a minha filha que está a chegar, porque esses valores serão revertidos ao patrimônio comum, permanecendo minha família apenas com o direito de herança ao lar; no entanto, minha ficha de serviço autoriza-me a interceder por ela e preparar-lhe aqui trabalho e concurso amigo, assegurando-me, igualmente, o valioso auxílio das organizações de nossa colônia espiritual, durante minha permanência nos círculos carnais. Nesse cômputo, deixo de referir-me ao lucro maravilhoso que adquiri no capítulo da experiência, nos anos de cooperação no Ministério do Auxílio. Volto à Terra, investida de valores mais altos e demonstrando qualidades mais nobres de preparação ao êxito desejado.
Ia prorromper em exclamações admirativas, referentes ao processo simples de ganhar, aproveitar, cooperar e servir, confrontando aquelas soluções com os princípios imperantes no planeta, mas um brando burburinho aproximou-se da casa. Antes que pudesse emitir qualquer observação, a senhora Laura murmurou, satisfeita:
- Nossos queridos estão de volta.
E levantou-se para atender.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

ESTUDO DO LIVRO NO MUNDO MAIOR - CAPÍTULO 14 - JULIANA SOLARE


MEDIDA SALVADORA

Havíamos terminado ativa colaboração, num elevado ambiente consagrado à prece, quando certo companheiro se abeirou de nós, reclamando o concurso do Assistente num caso particular.
Calderaro decerto conheceria os pormenores da situação, porque entre ambos logo se estabeleceu curioso diálogo.
— Infelizmente — dizia o informante, nosso Antídio não sobreleva a situação; permanece em derrocada quase total. Vinculou-se de novo a perigosos elementos da sombra, e voltou aos desacertos noturnos, com grave prejuízo para o nosso trabalho socorrista.
— Não lhe valeram as melhoras da quinzena passada? — indagou fraternalmente o orientador.
— Aproveitou-as para mais presto volver à irreflexão — esclareceu o interlocutor com inflexão magoada.
— É de notar, porém, que se achava quase de todo louco.
— Sim, mas conseguiu fruir, outra vez, estado orgânico invejável, mercê de sua intervenção última; logo, porém, que se viu fortalecido, tornou desbragadamente aos alcoólicos. A sede escaldante, provocada pela própria displicência e pela instigação dos vampiros que, vorazes, se lhe enxameiam à roda, everteu-lhe o sistema nervoso. A organização perispirítica, semililberta do corpo denso pelos perniciosos processos da embriaguez, povoa-lhe a mente de atros pesadelos, agravados pela atuação das entidades perversas que à seguem passo a passo.
— Estará em casa a esta hora? — inquiriu Calderaro com interesse.
— Não — disse o outro, abatido, deixei-o, ainda agora, num centro menos digno, onde a situação do nosso doente tornou a características lamentáveis.
O instrutor estudou o caso em silêncio, durante alguns instantes, e considerou:
— Poderemos providenciar; contudo, se da outra vez consistiu o socorro em restitui-lo ao equilíbrio orgânico possível, no momento há que agir em contrário. Convém ministrar-lhe provisória e mais acentuada desarmonia ao corpo. Neste, como em outros processos difíceis, a enfermidade retifica sempre.
E, contemplando o benfeitor do necessitado distante, interrogou:
— De acordo?
— Perfeitamente — redargüiu ele, sem hesitação; o meu amigo é especialista em assistência, e eu lhe acato as determinações. O que nos interessa é a saúde efetiva do infeliz irmão, que se entregou sem defesa aos reclamos do vicio.
Rumamos para o local em que deveríamos acudir o amigo extraviado.
Penetramos o recinto, servido de amplas janelas e abundantemente iluminado.
O ambiente sufocava. Desagradáveis emanações se faziam cada vez mais espessas, à maneira que avançávamos.
No salão principal do edifício, onde abundavam extravagantes adornos, algumas dezenas de pares dançavam, tendo as mentes absorvidas nas baixas vibrações que a atmosfera vigorosamente insuflava.
Indefinível e dilacerante impressão dominou-me o ser. Não provinha da estranheza que a indiferença dos cavalheiros e a leviandade das mulheres me provocavam; o que me enchia de assombro era o quadro que eles não viam. A multidão de entidades conturbadas e viciosas que aí se movia era enorme. Os dançarinos não bailavam sós, mas, inconscientemente, correspondiam, no ritmo açodado da música inferior, a ridículos gestos dos companheiros irresponsáveis que lhes eram invisíveis. Atitudes simiescas surdiam aqui e ali, e, de quando em quando, gritos histéricos feriam o ar.
Calderaro não se deteve. Mostrava-se habituado à cena; mas, não conseguindo sofrear a estupefação que se assenhoreara de mim, solicitei-lhe uma intermitência, perguntando:
— Meu amigo, que vemos? criaturas alegres cercadas de seres tão inconscientes e perversos? pois será crime dançar? buscar alegria constituirá falta grave?
O orientador escutou pacientemente as indagações ingênuas que me escapavam dos lábios, ditadas pelo espanto que me assomara repentinamente, e esclareceu:
— Que perguntas, André! O ato de dançar pode ser tão santificado como o ato de orar, pois a alegria legítima é sublime herança de Deus. Aqui, porém, o quadro é diverso. O bailado e o prazer nesta casa significam declarado retorno aos estados primitivos do ser, com iniludíveis agravantes de viciação dos sentidos. Observamos, neste recinto, homens e mulheres dotados de alto raciocínio, mas assumindo atitudes de que muitos símios talvez se pejassem. Todavia, esteja longe de nós qualquer recriminação: lastimemo-los simplesmente. São trânsfugas sociais, e, na maioria, rebeldes à disciplina instituída pelos Desígnios Superiores para os seus trilhos terrestres. Muitos deles são profundamente infelizes, precisando de nossa ajuda e compaixão. Procuram afogar no vinho ou nos prazeres certas noções de responsabilidade que não logram esquecer. Fracos perante a luta, mas dignos de piedade pelos remorsos e atribulações que os devoram, merecem amparados fraternalmente.
E, passando os olhos de relance pela multidão de Espíritos perturbadores que ali se davam ao vampirismo e ao sarcasmo, obtemperou:
— Quanto a estes infortunados, que fazer senão recomendá-los ao Divino Poder? Tentam igualmente a fuga impossível de si mesmos. Alucinados, apenas adiam o terrível minuto de auto-reconhecimento, que chega sempre, quando menos esperam, através dos mil processos da dor, esgotados os recursos do amor divino, que o Supremo Pai nos oferece a todos. A mente deles também está apegada aos instintos primitivos, e, frágeis e hesitantes, receiam a responsabilidade do trabalho da regeneração.
Vendo-me boquiaberto e faminto de novas elucidações, o Assistente propôs-me:
— Vamos! deixemo-los divertir-se. A dança, nesta casa, não lhes deixa de ser, em última análise, um benefício. Chegaram nossos amigos encarnados e desencantados, aqui presentes, a nível tão desprezível que, sem dúvida, não fora o sapateado, estariam rodando, lá fora, em atos extremamente condenáveis, tal a predisposição em que se encontram para o crime. Que o Pai se comisere de todos nós.
Demandamos o interior, apressadamente.
Numa saleta abafada, um cavalheiro de quarenta e cinco anos presumíveis jazia a tremer. Não conseguia manter-se de pé.
Calderaro examinou-o detidamente e indagou do novo amigo que nos acompanhava:
— Voltou aos alcoólicos, há muitos dias?
— Precisamente, há uma semana.
— Vê-se que se esgotou rápido.
Enquanto encetava a aplicação de fluidos magnéticos, o orientador aconselhou-me notar os característicos do quadro dantesco sob nossos olhos.
Antídio, doente e desventurado, a despeito das condições precárias, reclamava um copinho, sempre nais um copinho, que um rapaz de serviço trazia, obediente. Tremiam-lhe os membros, denunciando-lhe o abatimento. Álgido suor lhe escorria da fronte e, de vez em quando, desferia gritos de terror selvagem. Em derredor, quatro entidades embrutecidas submetiam-no aos seus desejos. Empolgavam-lhe a organização fisiológica, alternadamente, uma a uma, revezando-se para experimentar a absorção das emanações alcoólicas, no que sentiam singular prazer. Apossavam-se particularmente da “estrada gástrica”, inalando a bebida a volatilizar-se da cárdia ao piloro.
A cena infundia angústia e assombro.
Estaríamos diante de um homem embriagado ou de uma taça viva, cujo conteúdo sorviam gênios satânicos do vicio?
O infortunado Antídio trazia o estômago atestado de liquido e a cabeça turva de vapores.
Semidesligado do organismo denso pela atuação anestesiante do tóxico, passou a identificar-se mais intimamente com as entidades que o per seguiam.
Os quatro infelizes desencarnados, a seu turno, tinham a mente invadida por visões terrificantes do sepulcro que haviam atravessado como dipsomaníacos. Sedentos, aflitos, traziam consigo imagens espectrais de víboras e morcegos dos lugares sombrios onde haviam estacionado.
Entrando em sintonia magnética com o psiquismo desequilibrado dos vampiros, o ébrio começou a rogar, estentôreamente:
— Salve-me! salve-me, por amor de Deus!
E indicando as paredes próximas, bradava sob a impressão de indefinível pavor:
— Oh! os morcegos!... os morcegos! afugentem-nos, detenham-nos...! Piedade! quem me livrará! Socorro! Socorro!...
Dois senhores, também obnubilados pelo vinho, aproximaram-se, espantados. Um deles, porém, tranquilizou o outro, dizendo:
— Nada de mais. É o Antídio, de novo. Os acessos voltaram. Deixemo-lo em paz.
Enquanto isso, o desditoso ébrio continuava bradando:
— Ai! ai! uma cobra... aperta-me, sufoca-me... Que será de mim? Socorro!
As entidades perturbadoras timbravam nas atitudes sarcásticas; gargalhavam de maneira sinistra. Ouvia-as o infeliz, a lhe ecoarem no fundo do ser, e gritava, tentando investir, embora cambaleante, os algozes invisíveis:
— Quem zomba de mim? quem?
Cerrando os punhos, acrescentava:
— Malditos! malditos sejam!
A cena prosseguia, dolorosa, quando Calderaro se acercou de mim, esclarecendo:
- É deplorável pai de família que, incapaz de reagir contra as atrações do vício, se entregou, inerme, à influência de malfeitores desencarnados, afins com a sua posição desequilibrada. Em atenção às intercessões da esposa e de dois filhinhos amoráveis que o seguem, assistimo-lo com todos os recursos ao alcance de nossas possibilidades; entretanto, o imprevidente irmão não corresponde ao nosso esforço. Emerge de todas as tentativas, mais e mais disposto à perversão dos sentidos; busca, acima de tudo, a fuga de si mesmo; detesta a responsabilidade e não se anima a conhecer o valor do trabalho. Atenuando-lhe a ânsia irrefreável de sorver alcoólicos, esperamos se reeduque. Para isso, porém, usaremos agora recurso drástico, já que o desventurado se revela infenso a todos os nossos processos de auxilio.
Fixando em mim expressivo olhar, concluiu:
— Antídio, por algum tempo, a partir de hoje, será amparado pela enfermidade. Conhecerá a prisão no leito, durante alguns meses, a fim de que se lhe não apodreça o corpo num hospício, o que se iniciaria dentro de alguns dias, lançando nobre mulher e duas crianças em pungente incerteza do porvir.
Dito isto, Calderaro encetou complicado serviço de passes, ao longo da espinha dorsal.
O enfermo aquietou-se, pouco a pouco, na velha poltrona em que se mantinha.
O Assistente passou a aplicar-lhe eflúvios luminosos sobre o coração, durante vários minutos. Notei que essas emissões se concentravam gradativamente no órgão central, que em certo instante acusou parada súbita.
Antídio parecia prestes a desencarnar, quando o orientador lhe restituiu as energias, em movimentação rápida. Premido pelo fenômeno circulatório, que lhe valeu tremendo choque, o desditoso amigo pôs-se a pedir auxílio em altos brados. Havia tamanha inflexão de dor, na voz lamentosa, que grande número de pessoas se aproximaram, penalizadas.
Um piedoso cavalheiro tomou-lhe o pulso, verificou a desordem do coração e, presto, requisitou um carro da assistência pública. Em breves momentos Antídio era transportado em maca de hospital, para receber socorro urgente, seguido, de perto, pelo solícito benfeitor espiritual.
Retirando-se em minha companhia, Calderaro acrescentou, tristonho:
— O infortunado amigo será portador de uma nevrose cardíaca por dois a três meses, aproximadamente. Debalde usará a valeriana e outras substâncias medicamentosas, em vão apelará para anestésicos e desintoxicantes. No curso de algumas semanas conhecerá intraduzível mal-estar, de modo a restabelecer a harmonia do cosmo psíquico. Experimentará Indizível angústia, submeter-se-á a medicações e regimes, que lhe diminuirào a tendência de esquecer as obrigações sagradas da hora e lhe acordarão os sentimentos, devagarinho, para a nobreza do ato de viver.
Notando-me a estranheza, o Assistente concluiu:
— Que fazer, meu amigo? As mesmas Forças Divinas que concedem ao homem a brisa cariciosa, infligem-lhe a tempestade devastadora... Uma e outra, porém, são elementos indispensáveis à glória da vida.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

SEMANA - ESTUDO DO EVANGELHO - CAPÍTULO 9 ÍTEM 10 - MARIA J. CAMPOS


A CÓLERA

FONTE BÁSICA

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

1. O que é a cólera?
É a manifestação de um sentimento que se expressa por atitudes rudes e grosseiras, em represália a uma contrariedade qualquer. É a causadora de muitos danos orgânicos que atingem aquele que a cultiva, além de constituir um comportamento antifraterno perante os que o cercam.

“A cólera... nada mais significa que um traço de recordação dos primórdios da vida humana em suas expressões mais grosseiras”.(Emmanuel/O consolador – questão nº 181).

2. É o organismo que determina o nosso proceder?
Não. Quem age e determina o proceder é o espírito, não o corpo. Este, constituído instrumento daquele, poderá dificulta a ação do espírito no bem, jamais, porém, impedi-la.

“O corpo não dá a cólera aquele que a tem, do mesmo modo que não dá os outros vícios”.

3. Por que, então, se costuma atribuir ao corpo físico a causa da cólera?
Trata-se de pretexto que o homem usa para desculpar as tendências negativas próprias de seu espírito, sob a alegação de que é impossível reformar a sua própria natureza.

Muitos assim pensam por ignorarem que reside no espírito a origem de todas as nossas manifestações e ações.

4. Podemos afirmar que físico vigoroso é sinônimo de violência e que físico debilitado ou apático é sinônimo de calma?
Não, pois não são esses requisitos que tornam uma pessoa agressiva ou não, mas o seu espírito que, sendo violento, fará o corpo que o anima também violento.

“(...) persuadi-vos de que um Espírito pacifico, ainda que num corpo bilioso será sempre pacifico, e que um espírito violento, mesmo num corpo linfático, não será brando ”.

5. O que podemos concluir com referencia a origem dos nossos acessos de cólera?
Concluímos que esses acessos partem de nosso espírito, e é a este que devemos dirigir os esforços no sentido de combatê-la, esforços estes que, portanto, dependem da nossa iniciativa.

“Todas as virtudes e todos os vícios são inerentes ao espírito.”daí, o imperativo do constante esforço no seu burilamento.

6. De que forma podemos dominar a cólera?
Através da nossa vontade podemos transformar as energias que emitimos, de modo a torná-las mais serenas, dosando, assim, as nossas reações ante aquilo que os contraria. Por outro lado, as nossas contrariedades são igualmente amenizadas quando usamos de paciência e resignação perante as provações da vida.

“A energia serena edifica sempre, na construção dos sentimentos purificadores” (Emmanuel? O consolador – questão nº181).

7. Onde buscarmos a força necessária?
No Evangelho de Jesus, onde encontramos repertório inesgotável de ensinamentos voltados para nossa reforma intima; e na prece, através da qual angariamos o auxilio do Alto e o equilíbrio renovador.

Residindo a origem da cólera no orgulho ferido, para dominá-la temos que combater justamente o orgulho, mediante a nossa reforma íntima, sob a égide da doutrina do Mestre.


Conclusão:
A verdadeira origem da cólera está no espírito. Este é que pode estar vicioso, não o corpo. Desculpar-se do proceder colérico, alegando mau funcionamento do organismo, é pretexto que se usa para dissimular as próprias imperfeições. Para combatê-la é necessário o homem reformar-se interiormente, mediante o uso da vontade, inteligência e livre arbítrio, dirigidos para o bem.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

ESTUDO DO LIVRO NOSSO LAR - CAPÍTULO 21 - JULIANA SOLARE


CONTINUANDO A PALESTRA

- A palestra, senhora Laura - exclamei com interesse -, sugere numerosas interrogações, relevar-me-á a curiosidade, o abuso...
- Não diga isso - retrucou, bondosa -, pergunte sempre. Não estou em condições de ensinar; todavia, é sempre fácil informar.
Rimo-nos da observação e indaguei em seguida:
- Como se encara o problema da propriedade na colônia? Esta casa, por exemplo, pertence-lhe?
Ela sorriu e esclareceu:
- Tal como se dá na Terra, a propriedade aqui é relativa. Nossas aquisições são feitas à base de horas de trabalho. O bônus-hora, no fundo, é o nosso dinheiro. Quaisquer utilidades são adquiridas com esses cupons, obtidos por nós mesmos, a custa de esforço e dedicação. As construções em geral representam patrimônio comum, sob controle da Governadoria; cada família espiritual, porém, pode conquistar um lar (nunca mais que um), apresentando trinta mil bônus-hora, o que se pode conseguir com algum tempo de serviço. Nossa morada foi conquistada pelo trabalho perseverante de meu esposo, que veio para a esfera espiritual muito antes de mim. Dezoito anos estivemos separados pelos laços físicos, mas sempre unidos pelos elos espirituais. Ricardo, porém, não descansou. Recolhido ao "Nosso Lar", depois de certo período
de extremas perturbações, compreendeu imediatamente a necessidade do esforço ativo, preparando-nos um ninho para o futuro. Quando cheguei, estreamos a habitação que ele organizara com esmero, acentuando-se nossa ventura. Desde então, meu esposo ministrou-me conhecimentos novos. Minhas lutas na viuvez haviam sido intensas. Muito moça ainda, com os filhos tenros, tive de enfrentar serviços rudes. A custa de testemunhos difíceis, proporcionei aos rebentos de nossa união os valores educativos, de que eu podia dispor, habituando-os, porém, muito cedo, aos trabalhos
árduos. Compreendi, depois, que a existência laboriosa me livrara das indecisões e angústias do Umbral, por colocar-me a coberto de muitas e perigosas tentações. O suor do corpo ou a preocupação justa, nos campos de atividade honesta, constituem valiosos recursos para a elevação e defesa da alma. Reencontrar Ricardo, tecer novo ninho de afetos, representava o céu para mim. Durante anos consecutivos, vivemos a vida de perene ventura, trabalhando por nossa evolução, unindo-nos cada vez mais, e
cooperando no progresso efetivo dos que nos são afins. Com o correr do tempo, Lísias, Iolanda e Judite reuniram-se a nós, aumentando nossa felicidade.
Após ligeiro intervalo, em que parecia meditar, minha interlocutora prosseguiu em tom grave:
- Mas a esfera do globo nos esperava. Se o presente estava cheio de alegria, o passado chamava a contas, para que o futuro se harmonizasse com a lei eterna. Não podíamos pagar à Terra com bônus-hora e sim com o suor honrado, fruto de trabalhos. Dada a nossa boa -vontade, aclarava-se-nos a visão, relativamente ao pretérito doloroso. A lei do ritmo exigia, então, nossa volta.
Aquelas afirmativas causavam-me viva impressão. Era a primeira vez que se feria tão fundo aos meus ouvidos, na colônia, o assunto referente a encarnações pregressas.
- Senhora Laura - exclamei, interrompendo-a -, permita, por obséquio, um aparte. Perdoe a curiosidade; no entanto, até agora, ainda não pude conhecer mais detidamente o que se relaciona com o meu passado espiritual. Não estou isento dos laços físicos? Não atravessei o rio da morte? A senhora recordou o passado, logo após sua vinda, ou esperou o concurso do tempo?
- Esperei-o - replicou, sorridente -; antes de tudo, é indispensável nos despojarmos das impressões físicas. As escamas da inferioridade são muito fortes. É preciso grande equilíbrio para podermos recordar, edificando. Em geral, todos temos erros clamorosos, nos ciclos da vida eterna. Quem lembra o crime cometido costuma considerar-se o mais desventurado do Universo; e quem recorda o crime de que foi vítima, considera-se em conta de infeliz, do mesmo modo. Portanto, somente a alma, muito segura de si, recebe tais atributos como realização espontânea. As demais são
devidamente controladas no domínio das reminiscências, e, se tentam burlar esse dispositivo da lei, não raro tendem ao desequilíbrio e à loucura.
- Mas a senhora recordou o passado de maneira natural? - perguntei.
- Explico-me - respondeu bondosamente -; quando se me aclarou a visão interior, as lembranças vagas me causavam perturbações de vulto. Coincidiu que meu marido partilhava o mesmo estado dalma. Resolvemos ambos consultar o assistente Longobardo. Esse amigo, depois de minucioso exame das nossas impressões, nos encaminhou aos
magnetizadores do Ministério do Esclarecimento. Recebidos com carinho, tivemos acesso em primeiro lugar à Seção do Arquivo, onde todos nós temos anotações particulares. Aconselharam-nos os técnicos daquele Ministério a ler nossas próprias memórias, durante dois anos, sem prejuízo
de nossa tarefa do Auxílio, abrangendo o período de três séculos. O chefe do serviço de Recordações não nos permitiu a leitura de fases anteriores, declarando-nos incapazes de suportar as lembranças correspondentes a outras épocas.
- E bastou a leitura para que se sentisse na posse das reminiscências? - atalhei, curioso.
- Não. A leitura apenas informa. Depois de longo período de meditação para esclarecimento próprio, e como surpresas indescritíveis, fomos submetidos a determinadas operações psíquicas, a fim de penetrar os domínios emocionais das recordações. Os espíritos técnicos no assunto nos aplicaram passes no cérebro, despertando certas energias adormecidas... Ricardo e eu ficamos, então, senhores de trezentos anos de memória integral. Compreendemos, então, quão grande é ainda o nosso
débito para com as organizações do planeta!...
- E onde está nosso irmão Ricardo? Como estimaria conhecê-lo!... - exclamei sob forte impressão.
A genitora de Lísias meneou significativamente a cabeça e murmurou:
- Em vista de nossas observações referentes ao passado, combinamos novo encontro nas esferas da crosta. Temos trabalho, muito trabalho, na Terra. Desse modo, Ricardo partiu há três anos. Quanto a mim, seguirei dentro de breves dias. Aguardo apenas a chegada de Teresa, para deixá-la junto aos nossos.
E de olhar vago, como se a mente estivesse muito longe, ao lado da filha ainda retida na Terra, a senhora Laura acentuou:
- A mãe de Eloísa não tardará. A passagem dela através do Umbral será somente de algumas horas, em vista dos seus profundos sacrifícios, desde a infância. Pelo muito que sofreu não precisará dos tratamentos da Regeneração. Poderei, portanto, transmitir-lhe minhas obrigações no Auxílio e partir sossegada. O Senhor não nos esquecerá.

ESTUDO DO LIVRO NOSSO LAR - CAPÍTULO 20 - JULIANA SOLARE


NOÇÕES DE LAR

Desejando colher valores educativos que fluíam naturalmente da palestra da senhora Laura, perguntei, curioso:
- Desempenhando tantos deveres, a senhora ainda tem atribuições fora de casa?
- Sim; vivemos numa cidade de transição; no entanto, as finalidades da colônia residem no trabalho e no aprendizado. As almas femininas, aqui, assumem numerosas obrigações, preparando-se para voltar ao planeta ou para ascender a esferas mais altas.
- Mas a organização doméstica, em "Nosso Lar", é idêntica à da Terra?
A interlocutora esboçou uma facies muito significativa e acrescentou:
- O lar terrestre é que, de há muito, se esforça por copiar nosso instituto doméstico; mas os cônjuges por lá, com raras exceções, estão ainda a mondar o terreno dos sentimentos, invadido pelas ervas amargosas da vaidade pessoal, e povoado de monstros do ciúme e do egoísmo. Quando regressei do planeta, pela última
vez, trazia, como é natural, profundas ilusões. Coincidiu, porém, que, na minha crise de orgulho ferido, fui levada a ouvir um grande instrutor, no Ministério do Esclarecimento. Desde esse dia, nova corrente de idéias me penetrou o espírito.
- Não poderia dizer-me algo das lições recebidas? - indaguei com interesse.
- O orientador, muito versado em matemática - prosseguiu ela -, feznos sentir que o lar é como se fora um ângulo reto nas linhas do plano da evolução divina. A reta vertical é o sentimento feminino, envolvido nas inspirações criadoras da vida. A reta horizontal é o sentimento masculino, em marcha de realizações no campo do progresso comum. O lar é o sagrado vértice onde o homem e a mulher se encontram para o entendimento indispensável. É templo, onde as criaturas devem unir-se espiritual antes que corporalmente. Há na Terra, agora, grande número de estudiosos das
questões sociais, que aventam várias medidas e clamam pela regeneração da vida doméstica. Alguns chegam a asseverar que a instituição da família humana está ameaçada. Importa considerar, entretanto, que, a rigor, o lar é conquista sublime que os homens vão realizando vagarosamente. Onde, nas esferas do globo, o verdadeiro instituto doméstico, baseado na harmonia justa, com os direitos e deveres legitimamente partilhados? Na maioria, os casais terrestres passam as horas sagradas do dia vivendo a indiferença ou o egoísmo feroz. Quando o marido permanece calmo, a mulher parece desesperada; quando a esposa se cala, humilde, o companheiro tiraniza.
Nem a consorte se decide a animar o esposo, na linha horizontal de seus trabalhos temporais, nem o marido se resolve a segui-la no vôo divino de ternura e sentimento, rumo aos planos superiores da Criação. Dissimulam em sociedade e, na vida íntima, um faz viagens mentais de longa distância, quando o outro comenta o serviço que lhe seja peculiar.
Se a mulher fala nos fílhinhos, o marido excursiona através dos negócios; se o companheiro examina qualquer dificuldade do trabalho, que lhe diz respeito, a mente da esposa volta ao gabinete da modista. É claro que, em tais circunstâncias, o ângulo divino não está devidamente traçado. Duas linhas divergentes tentam, em vão, formar o vértice sublime, a fim de construírem um degrau na escada grandiosa da vida eterna.
Esses conceitos calavam-me fundo e, sumamente impressionado, observei:
- Senhora Laura, essas definições suscitam um mundo de pensamentos novos. Ah! se conhecêssemos tudo isso lá na Terra!...
- Questão de experiência, meu amigo - replicou a nobre matrona -, o homem e a mulher aprenderão no sofrimento e na luta. Por enquanto, raros conhecem que o lar é instituição essencialmente divina e que se deve viver, dentro de suas portas, com todo o coração e com toda a alma. Enquanto as criaturas vulgares atravessam a florida região do noivado, procuram-se mobilizando os máximos recursos do espírito, e daí o dizer-se que todos os seres são belos quando estão verdadeiramente amando. O assunto mais trivial assume singular encanto nas palestras mais fúteis. O homem e a
mulher comparecem aí, na integração de suas forças sublimes. Mas logo que recebem a bênção nupcial, a maioria atravessa os véus do desejo, e cai nos braços dos velhos monstros que tiranizam corações. Não há concessões recíprocas. Não há tolerância e, por vezes, nem mesmo fraternidade. E apaga-se a beleza luminosa do amor, quando os cônjuges perdem a camaradagem e o gosto de conversar. Daí em diante, os mais
educados respeitam-se; os mais rudes mal se suportam. Não se entendem.
Perguntas e respostas são formuladas em vocábulos breves. Por mais que se unam os
corpos, vivem as mentes separadas, operando em rumos opostos.
- Tudo isso é a pura verdade! - aduzi comovido.
- Que fazer, porém, meu amigo? - replicou a bondosa senhora - na fase atual evolutiva do planeta, existem na esfera carnal raríssimas uniões de almas gêmeas, reduzidos matrimônios de almas irmãs ou afins, e esmagadora porcentagem de ligações de resgate. O maior número de casais humanos é constituído de verdadeiros forçados, sob algemas.
Procurando retomar o fio das considerações sugeridas por minha pergunta inicial, continuou a genitora de Lísias:
- As almas femininas não podem permanecer inativas aqui. É preciso aprender a ser mãe, esposa, missionária, irmã. A tarefa da mulher, no lar, não pode circunscrever-se a umas tantas lágrimas de piedade ociosa e a muitos anos de servidão. É claro que o movimento coevo do feminismo desesperado constituí abominável ação contra as verdadeiras atribuições do espírito feminino. A mulher não pode ir ao duelo com os homens, através de escritórios e gabinetes, onde se reserva atividade justa ao espírito masculino. Nossa colônia, porém, ensina que existem nobres serviços de extensão do lar, para as mulheres. A enfermagem, o ensino, a indústria do fio, a informação, os serviços de paciência, representam atividades assaz expressivas. O homem deve aprender a carrear para o ambiente doméstico a
riqueza de suas experiências, e a mulher precisa conduzir a doçura do lar para os labores ásperos do homem. Dentro de casa, a inspiração; fora dela, a atividade. Uma não viverá sem a outra. Como sustentar-se o rio sem a fonte, e como espalhar-se a água da fonte sem o leito do rio?
Não pude deixar de sorrir, ouvindo a interrogação. A mãe de Lísias, depois de longo intervalo, continuou:
- Quando o Ministério do Auxílio me confia crianças ao lar, minhas horas de serviço são contadas em dobro, o que lhe pode dar idéia da importância do serviço maternal no plano terreno. Entretanto, quando isso não acontece, tenho meus deveres diuturnos nos trabalhos de enfermagem, com a semana de quarenta e oito horas de tarefa. Todos trabalham em nossa casa. A não ser minha neta convalescente, não temos qualquer
pessoa da família em zonas de repouso. Oito horas de atividade no interesse
coletivo, diariamente, é programa fácil a todos. Sentir-me-ia envergonhada
se não o executasse também.
Interrompeu-se a interlocutora por alguns momentos, enquanto me perdia em vastas considerações...

domingo, 15 de novembro de 2009

SEMANA - ESTUDO DO EVANGELHO - CAPÍTULO 9 ÍTEM 9 - MARIA J. CAMPOS


A CÓLERA

FONTE BÁSICA

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

1. O que é a cólera?
É a manifestação de um sentimento que se expressa por atitudes rudes e grosseiras, em represália a uma contrariedade qualquer. É a causadora de muitos danos orgânicos que atingem aquele que a cultiva, além de constituir um comportamento antifraterno perante os que o cercam.

“A cólera... nada mais significa que um traço de recordação dos primórdios da vida humana em suas expressões mais grosseiras”.(Emmanuel/O consolador – questão nº 181).

2. Onde encontramos a causa da cólera?
No orgulho ferido, que faz com que o homem se revolte diante da menor contrariedade e de situações que o obriguem a aceitar-se como um ser ainda imperfeito e, portanto, com graves erros a corrigir.

“A energia serena edifica sempre... mas a cólera impulsiva... é um vinho envenenado cuja embriaguez a alma desperta sempre com o coração tocado de amargosos ressaibos”. (Emmanuel/O consolador – questão nº 181).

3. De que forma a cólera prejudica aquele que a ela se predispõe?
Alterando-lhe as funções orgânicas, debilitando-lhe a saúde e afastando-lhe os amigos, parentes e auxílio dos bons espíritos.

“Se ponderasse que a cólera a nada remedeia, que lhe altera a saúde e compromete até a vida, reconheceria ser ele próprio sua primeira vítima”.

4. Além de si próprio, como o homem colérico prejudica os outros?
As suas atitudes de revolta e rebeldia se refletem naqueles que o cercam, causando-lhes sofrimento e mal estar em razão de vê-lo nesse estado, fazendo-os se sentir infelizes.

“Se tem coração, não lhe será motivo de remorso fazer sofrer os entes a quem mais ama? E que pesar moral se, num acesso de fúria, praticasse um ato que houvesse de deplorar toda a sua vida!”.

5. Como defender os valores que julgamos corretos, sem nos encolerizar?
Agindo de conformidade com os mesmos, respeitando nos outros sua forma de pensar, sem perder a confiança em Deus e em sua sabedoria.

Para a definição consciente daquilo que realmente é correto, torna-se imprescindível a nossa constante ligação com Jesus.

6. Mas, e se formos bloqueados em nossa ação, que julgamos acertada, não haveria aí razão justa para nos revoltarmos?
Não. Isso não seria justificativa para a cólera. Tampouco, impor nossa vontade, quando não somos compreendidos, não resolve o problema. O segredo do sucesso está em aguardar pacientes, pois a verdade prevalecerá.

“(...) se a nossa paciência jaz tranqüila, na certeza de que temos procurado realizar o melhor ao nosso alcance, no aproveitamento das oportunidades que o Senhor nos concedeu, estejamos serenos na dificuldade e operosos na prática do bem...” (Emmanuel e André/Estude e Viva – nº14).

Conclusão:
A cólera é sentimento que contraria a lei de Deus e se expressa por atitudes rudes e grosseiras, acarretando sérios desajustes orgânicos àquele que a cultiva e fazendo deste a sua principal vítima. Além disso, revela um sentimento antifraterno de quem a ela se predispõe, perante os semelhantes. Trata-se de um mal cuja origem reside no orgulho ferido, que o homem terá de dominar, se deseja ser feliz.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

CURSO COM ALEXANDRE XAVIER DE CAMARGO


DIA 14 DE NOVEMBRO,

EM 4 SÁBADOS SEGUIDOS, DAS 20:00 às 21:00hs, COMEÇA O CURSO SOBRE O TEMA:






" COMO USAR O SUBCONSCIENTE E A LEI DA ATRAÇÃO ".


INSCRIÇÕES/CONTATO:

E-Mail: mariajscampos@yahoo.com.br
Paltalk nikyname: mariajscampos


EMMANUEL RESPONDE

1 - O que estrutura espiritualmente o corpo de carne?

Emmanuel: O corpo espiritual ou perispírito é o corpo básico, constituído de matéria sutil, sobre o qual se organiza o corpo de carne.
2 - O erro de uma encarnação passada pode incluir na encarnação presente, predispondo o corpo físico às doenças? De que modo?

Emmanuel : A grande maioria das doenças tem a sua causa profunda na estrutura semi-material do corpo espiritual. Havendo o espírito agido erradamente, nesse ou naquele setor da experiência evolutiva, vinca o corpo espiritual com desequilíbrios ou distonias, que o predispõem à instalação de determinadas enfermidades, conforme o órgão atingido.
3 - Quais os dois aspectos da Justiça?

Emmanuel: A Justiça na Terra pune simplesmente a crueldade manifesta, cujas conseqüências transitam nas áreas do interesse público, dilapidando a vida e induzindo à criminalidade; entretanto, esse é apenas o seu aspecto exterior, porque a Justiça é sempre manifestação constante da Lei Divina, nos processos da evolução e nas atividades da consciência.
4 - Qual a relação existente entre doenças e a Justiça?

Emmanuel: No curso das enfermidades, é imperioso venhamos a examinar a Justiça, funcionando com todo o seu poder regenerativo, para sanar os males que acalentamos.
5 - O que faz o Espírito, antes de reencarnar-se visando à própria melhoria?

Emmanuel: Antes da reencarnação, nós mesmos, em plenitude de responsabilidade, analisamos os pontos vulneráveis da própria alma, advogando em nosso próprio favor a concessão dos impedimentos físicos que, em tempo certo, nos imunizem, ante a possibilidade de reincidência nos erros em que estamos incursos.
6 - Que pedem, para regenerar-se, os intelectuais que conspurcaram os tesouros da alma?

Emmanuel: Artífices do pensamento, que malversamos os patrimônios do espírito, rogam impedimentos cerebrais, que se façam por algum tempo alavancas coercitivas, contra as nossas tendências ao desequilíbrio intelectual.
7 - Que medidas de reabilitação rogam os artistas que corromperam a inteligência?

Emmanuel: Artistas, que intoxicamos a sensibilidade alheia com os abusos da representação viciosa, imploramos moléstias ou mutilações, que nos incapacitem para a queda em novas culpas.
8 - Que emendas solicitam os oradores e pessoas que influenciaram negativamente pela palavra?
Emmanuel: Tarefeiros da palavra, que nos prevalecemos dela para caluniar ou para ferir, solicitamos as deficiências dos aparelhos vocais e auditivos, que nos garantam a segregação providencial.
9 - Que providências retificadoras pedem para si próprios aqueles que abraçaram graves compromissos do sexo?

Emmanuel: Criaturas dotadas de harmonia orgânica, que arremessamos os valores do sexo ao terreno das paixões aviltantes, enlouquecendo corações e fomentando tragédias, suplicamos as doenças e as inibições genésicas que em nos humilhando, servem por válvulas de contenção dos nossos impulsos inferiores.
10 - Todas as enfermidades conhecidas foram solicitadas pelo Espírito do próprio enfermo, antes de renascer?

Emmanuel: Nem sempre o Espírito requisita deliberadamente determinadas enfermidades de vez que, em muitas circunstâncias quais aqueles que se verificam no suicídio ou na delinqüência, caímos, de imediato, na desagregação ou na insanidade das próprias forças, lesando o corpo espiritual, o que nos constrange a renascer no berço físico, exibindo defeitos e moléstias congênitas, em aflitivos quadros expiatórios.
11 - Quais são os casos mais comuns de doenças compulsórias, impostas pela Lei Divina?

Emmanuel: Encontramos numerosos casos de doenças compulsórias, impostas pela Lei Divina, na maioria das criaturas que trazem as provações da idiotia ou da loucura, da cegueira ou da paralisia irreversíveis, ou ainda, nas crianças-problemas, cujos corpos, irremediavelmente frustrados, durante todo o curso da reencarnação, mostram-se na condição de celas regenerativas, para a internação compulsória daqueles que fizeram jus a semelhantes recursos drásticos da Lei. Justo acrescentar que todos esses companheiros, em transitórias, mas duras dificuldades, renascem na companhia daqueles mesmos amigos e familiares de outro tempo que, um dia, se cumpliciaram com eles na prática das ações reprováveis em que delinqüiram.
12 - A mente invigilante pode instalar doenças no organismo? E o que pode provocar doenças de causas espirituais na vida diária?

Emmanuel: A mente é mais poderosa para instalar doenças e desarmonias do que todas as bactérias e vírus conhecidos. Necessário, pois, considerar igualmente, que desequilíbrios e moléstias surgem também da imprudência e do desmazelo, da revolta e da preguiça. Pessoas que se embriagam a ponto de arruinar a saúde; que esquecem a higiene até se tornarem presas de parasitas destruidores; que se encolerizam pelas menores razões, destrambelhando os próprios nervos; os que passam, todas as horas em redes e leitos, poltronas e janelas, sem coragem de vencer a ociosidade e o desânimo pela movimentação do trabalho, prejudicando a função dos órgãos do corpo físico, em razão da própria imobilidade, são criaturas que geram doenças para si mesmas, nas atitudes de hoje mesmo, sem qualquer ligação com causas anteriores de existências passadas.
13 - Qual a advertência de Jesus para que nos previnamos dos males do corpo e da alma?

Emmanuel: Assinalando as causas distantes e próximas das doenças de agora, destacamos o motivo por que os ensinamentos da Doutrina Espírita nos fazem considerar, com mais senso de gravidade, a advertência do Mestre: “Orai e vigiai, para não cairdes em tentação”.

EMMANUEL
(Do livro “Leis Do Amor”, Francisco Cândido Xavier & Waldo Vieira)

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

ESTUDO DO LIVRO NO MUNDO MAIOR - CAPÍTULO 13 - JULIANA SOLARE


PSICOSE AFETIVA

Seguindo Calderaro, fomos, em plena noite, atender infortunada irmã quase suicida. Penetramos a residência. confortável, conquanto modesta, percebendo a presença de várias entidades infelizes.
O Assistente pareceu-me apressado. Não se deteve em nenhuma apreciação. Acompanhei-o, por minha vez, até humilde aposento, onde fomos encontrar jovem mulher em convulsivo pranto, dominada por desespero incoercível. A mente acusava extremo desequilíbrio, que se estendia a todos os centros vitais do campo fisiológico.
— Pobrezinha! — disse o orientador, comovidamente — não lhe faltará a Divina Bondade. Tudo preparou de modo a fugir pelo suicídio, esta noite;
entretanto, as Forças Divinas nos auxiliarão a intervir...
Colocou a destra sobre a fronte da irmã em lágrimas e esclareceu;
- É Antonina, abnegada companheira de luta. Órfã de pai, desde muito cedo, iniciou-se no trabalho remunerado aos oito anos, para sustentar a genitora e a irmãzinha. Passou a infância e a primeira juventude em sacrifícios enormes, ignorando as alegrias da fase risonha de menina e moça. Aos vinte anos perdeu a mãezinha, então arrebatada pela morte, e, não obstante seus formosos ideais femininos, foi obrigada a sacrificar-se pela irmã em vésperas de casamento. Realizado este, Antonina procurou afastar-se, para tratar da própria vida; muito cedo, verificou, porém, que o esposo da irmãzinha se caracterizava por nefanda viciosidade. Perdido nos prazeres inferiores, entregava-se ao hábito da embriaguez, diariamente, retornando ao lar, em hora tardia, a distribuir pancadas, a vomitar insultos. Sensibilizada ante o destino da companheira, nossa dedicada amiga permaneceu em casa, a serviço da renúncia silenciosa, aliviando-lhe os pesares e auxiliando-a a criar os sobrinhos e a assisti-los. Corriam os anos, tristes e vagarosos, quando Antonina conheceu certo rapaz necessitado de arrimo, a sustentar pesado esforço por manter-se nos estudos.
Identificavam-se pela idade e pela comunhão de idéias e de sentimentos.
Devotada e nobre, correspondeu-lhe à simpatia, convertendo-se em abnegada irmã do jovem. A companhia dele, de algum modo, projetava abençoada luz em sua noite de solidão e sacrifício ininterruptos. Repartindo o tempo e as possibilidades entre a irmã, quatro pequenos sobrinhos e o co-participe de sonhos fulgurantes, consagrava-se ao trabalho redentor de cada dia, animada e feliz, aguardando o futuro. Idealizava também obter, um dia, a coroa da maternidade, num lar singelo e pobre, mas suficiente para caber a felicidade de dois corações para sempre unidos diante de Deus. Todavia, Gustavo, o rapaz que se valeu de sua amorosa colaboração durante sete anos consecutivos após a jornada universitária sentiu-se demasiado importante para ligar seu destino ao da modesta moça.
Independente e titulado, agora, passou a notar que Antonina não era, fisicamente, a companheira que seus propósitos reclamavam. Exibindo um diploma de médico e sentindo urgente necessidade de constituir um lar, com grandioso programa na vida social, desposou jovem possuidora de vultosa fortuna, menosprezando o coração leal que o ajudara nos instantes incertos.
Fundamente humilhada, nossa desditosa irmã procurou-o, mas foi recebida com escarnecedora frieza. Gustavo, com presunção repulsiva, transmitiu-lhe a novidade, asperamente: Necessitava pôr em ordem os negócios materiais que lhe diziam respeito, e, por isto, escolhera melhor partido. Além disso, declarou, sua posição requeria uma esposa que não procedesse de um meio de atividades humilhantes; pretendia alguém que não fosse operária de laboratório, que não tivesse mãos calejadas, nem fios prateados na cabeça. A moça tudo ouviu debulhada em lágrimas, sem reação, e tornou à residência, ontem, minada pelo anseio de morrer, fosse como fosse. Sente que as esperanças se lhe esvaneceram, esfaceladas pelo golpe inopinado, que a existência se reduz em cinza e poeira, que a renúncia abre as portas da ruína e da morte. Conseguiu certa dose de substância mortífera, que pretende ingerir ainda hoje.
Dando pequeno intervalo às elucidações, recomendou-me:
— Examina-a, enquanto administro os socorros iniciais.
Detive-me em perquirição minuciosa, por longos minutos.
Dos olhos de Antonina caíam pesadas lágrimas; no entanto, da câmara cerebral partiam raios purpúreos, que invadiam o tórax e envolviam particularmente o coração. Torturantes pensamentos baralhavam-lhe a mente.
Registrando-lhe os secretos apelos, compungia ouvir-lhe os gritos de desespero e as súplicas ardentes.
Seria crime — pensava — amar alguém com tal excesso de ternura? onde
jazia a Justiça do Céu, que lhe não premiava os sacrifícios de mulher dedicada
à paz doméstica? aspirava a ser alegre e feliz, como as venturosas companheiras de sua meninice; anelava a tranquilidade do matrimônio digno, com a expectativa de receber alguns filhinhos, concedidos pela Bondade Infinita de Deus!
Seria aspiração condenável sonhar com a edificação de modesto lar, com a proteção de um companheiro simples e bondoso, quando as próprias aves possuiam seus ninhos? Não trabalhara sempre pela felicidade dos outros? por que desconhecidas razões a relegara Gustavo ao abandono? Os calos das mãos e os sinais do rosto não lhe roboravam a dedicação ao serviço honesto?
Teria valido a pena sofrer tantos anos, perseguindo uma realização que se lhe
afigurava, agora, impossível? Não! não pretendia demorar-se num mundo onde o vício triunfava tão facilmente, espezinhando a virtude! Não obstante a fé que lhe alentava o coração, preferia morrer, enfrentar o desconhecido... Sentia-se desajustada, sem rumo, quase louca. Não seria mais razoável — inquiria a si própria — buscar as trevas do sepulcro de que apodrecer num catre de hospício?
Estirada no leito, a infeliz mergulhava o rosto nas mãos, soluçando sozinha, inspirando-nos piedade.
Calderaro interrompeu o serviço de assistência, fitou-me com. significativa
expressão e comunicou:
— Tenho instruções para impor-lhe o sono mais profundo, logo depois da meia-noite.
E, verificando que o relógio informava não estar distante o momento prefinido, o Assistente começou a ministrar-lhe aplicações fluídicas ao longo do sistema nervoso simpático.
A vasta rede de neurônios experimentou a influência anestesiante.
Antonina tentou levantar-se, gritar, mas não conseguiu. A intervenção era demasiado vigorosa para que a enferma pudesse reagir.
O orientador prosseguiu atento, envolvendo-a mansamente, em fluidos calmantes. Dentro em pouco, cedendo à irresistível dominação, a moça recostou-se vencida nos travesseiros, no estado a que o magnetizador comum chamaria hipnose profunda).
Manteve-a Calderaro em completo repouso por mais de meia hora.
Decorrido esse tempo, duas entidades, aureoladas de intensa luz, deram entrada no recinto. Abraçaram meu instrutor, que mais apresentou cordialmente.
Estavam, agora, junto de nós, Mariana, que fora dedicada genitora de Antonina, e Márcio, iluminado espírito ligado a ela, desde séculos remotos.
Agradeceram, sensibilizados, a atuação de meu orientador, que passou a doente à direção materna.
A simpática senhora desencarnada inclinou-se sobre a filha e chamou-a, docemente, como o fazia na Terra. Parcialmente desligada do envoltório grosseiro, Antonina ergueu-se, em seu organismo perispirítico, encantada, feliz...
— Mamãe! mamãe! — gritou, desabafando-se, a refugiar-se entre os braços maternais.
Mariana recolheu-a, carinhosa, estringiu-a de encontro ao peito, pronunciando palavras enternecedoras.
— Mãezinha, ajude-me! não quero mais viver na Terra! não me deixe voltar ao corpo pesado... O destino escorraça-me. Sou infeliz! Tudo me é adverso...
Arrebate-me daqui... para sempre!
A nobre matrona contemplava-a, triste, quando Márcio se aproximou, fazendo-se visto pela estimada enferma.
A moça abriu desmesuradamente os olhos e ajoelhou-se instintivamente, amparada pela mãe. Parecia esforçar-se por trazer à lembrança alguém que ficara em pretérito longínquo... Observava-se-lhe a extrema dificuldade para recordar com precisão. Contemplava o emissário, banhada em pranto diferente: não vertia as lágrimas lutuosas de momentos antes; tocava-se, agora, de sublime conforto, de júbilo místico, que lhe nascia, inexplicavelmente, das profundezas do coração.
Acercou-se Márcio mais intimamente, pousou-lhe a luminosa destra sobre a fronte e falou com ternura:
— Antonina, porque esse desânimo, quando a luta redentora apenas começa? olvidaste, acaso, que não somos órfãos? Acima de todos os obstáculos paira a Infinita Bondade. Recusas a “porta estreita”, que nos proporcionará o venturoso acesso ao reencontro?
Talvez porque a interlocutora estivesse de si mesma postulando excessivo trabalho para reavivar paisagens perdidas no tempo, o mensageiro advertiu, fraternal:
— Não forces a situação! acalma-te! não nos bastará o presente, cheio de abençoado serviço e renovadora luz? Um dia, reconquistarás o patrimônio da memória total; por ora, contenta-te com as dádivas limitadas. Aproveita os minutos na recomposição do destino, vale-te das horas para reconduzir tuas aspirações a esferas superiores. Que motivos te sugerem esse crime, que é o provocar a morte? que razões te conduzem os passos na direção do precipício tenebroso? Tua mãe e eu sentimos, de longe, o perigo, e aqui estamos para ajudar-te...
Fez longa pausa, fixando-a amorosamente, e continuou:
- Ó minha abençoada amiga, como abriste assim o coração aos monstros do desespero? Dize-me! não te mantenhas silenciosa... Não sou teu juiz, sou teu amigo da eternidade. Não terei o consolo de ouvir-te?
A enferma desejava falar; entretanto, os suaves raios de luz, emitidos por Márcio, cercavam-na toda, sufocando-lhe a garganta, no êxtase daqueles instantes inesquecíveis.
Ele, porém, desejando evidentemente proporcionar-lhe oportunidade a mais amplo desabafo, levantou-a, cuidadoso, e insistiu:
— Fala!...
Animada, Antonina balbuciou, tímida:
— Estou exausta...
— Contudo, jamais foste esquecida. Recebeste mil recursos diversos da Providência, indispensáveis ao valioso serviço de redenção. O corpo terreno, as bênçãos do Sol, as oportunidades de trabalho, as maravilhas da Natureza, os laços afetivos e as próprias dores da experiência humana não serão inestimáveis dons do Divino Suprimento? Ignoras, querida, a felicidade do sacrifício, renegas a possibilidade de amar?
Foi então que vi a jovem mulher contemplá-lo mais confiadamente.
Sentindo-se forte, ante a insofismável demonstração de carinho, abriu-se com
franqueza fraternal:
— Tenho sonhado com a posse de um lar.
desejo viver para um homem que, a seu turno, me auxilie a levar a existência....
idealizo receber de Deus alguns filhinhos que eu possa acariciar! Será pecado,
celeste mensageiro, anelar tais coisas? Será delinqüente a mulher que busca
santificar os princípios naturais da vida? Depois de mourejar anos a fio pela
felicidade dos que me são caros, noto que o destino escarnece de minhas esperanças. Será virtude viver entre pessoas alegres e felizes, quando nosso coração queda morto?
Márcio ouviu-a fraternalmente, afagando-lhe as mãos, e, evidenciando suas altas aquisições de verdadeiro amor, acrescentou, mais compreensivo e mais terno:
— (Abnegada amiga, não permitas que a sombra de algumas horas te empane a luz dos séculos porvíndouros. É possível, Antonina, que te sintas tão lamentavelmente só, quando o Supremo Senhor te concedeu o sublime lar no mundo inteiro? A Humanidade é nossa família, os filhinhos da dor nos pertencem. Reconheço que transitórias humilhações do sentimento te dilaceram a alma, que desejarias arrimar-te ao carinhoso braço de um companheiro digno e fiel. No entanto, querida, é da Vontade Superior que recebas, por enquanto, as vantagens que podem ser encontradas na solidão. Se há períodos de florescimento nos vales humanos, dentro dos quais nos inebriamos em plena primavera da Natureza, existências se verificam, aparentemente isoladas e desditosas, nas culminâncias da meditação e da renúncia, a cuja luz nos preparamos para novas jornadas santificadoras.
(Não suponhas que a fatal passagem do sepulcro nos abra portas à liberdade: segue-nos a Lei, a toda parte, e o Supremo Senhor, se exerce a infinita compaixão, não despreza a justiça inquebrantável. Dá-nos, invariàvelmente, a Eterna Sabedoria o lugar onde possamos ser mais úteis e mais felizes.
(Declaras-te deserdada e infeliz, e, no entanto, ainda não recenseaste as
possibilidades sublimes que te rodeiam. Dizes-te incapacitada de abraçar os
pequeninos de Deus, mas, porque tamanho exclusivismo para os rebentos
consangüíneos? não enxergaste, até hoje, as crianças abandonadas, nunca viste os filhinhos da miséria e da privação? Se não podes ser mãe de flores da própria carne, por que motivo não te fazes tutora espiritual dos pequenos necessitados e sofredores? Acreditas, Antonina, que possamos ser absolutamente felizes, escutando gemidos à nossa porta? haverá perfeita alegria num coração que pulsa ao lado de um coro de lágrimas? O mundo não é propriedade nossa. Nós, os filhos do Altíssimo, é que fomos trazidos a cooperar nas obras que nos cercam.É verdadeira infelicidade acreditar-se alguém favorito dos Céus, como se o Pai Compassivo e Sábio não passasse
de frágil e parcial ditador! Sacode a consciência adormecida... Lembra-te de
que o Todo Poderoso não se adstringe ao nosso particularismo de criaturas falíveis, e não te esqueças de que nos pesam, perante a universalidade dele, inalienáveis deveres de trabalho, exercitando os preciosos recursos que nos concedeu, a fim de alcançarmos, um dia, a perfeição da sabedoria e do amor.
“Sofres em tua organização, que orientaste para o personalismo, porque um homem, cujo padrão psíquico se harmonizou com o teu em muitos aspectos, modificando depois seu rumo de vida, te relegou ao esquecimento.
Choras, porquanto esperavas encontrar em sua companhia algo da Divina
Presença, que traria serenidade às tuas angustiosas esperanças de mulher
delicada e sensível... As inquietações do sexo tomaram vulto na intimidade do
teu santuário, e padeces longo assédio de tribulações. Mas... dar-se-á que presumas no sexo a fonte exclusiva do amor? Serás também vítima desse fatal engano? O amor é sol divino a irradiar-se através de todas as magnificências da alma.
“Por vezes, somos privados de sensaçôes que ansiára nos, inibidos de usar as energias criadoras das formas físicas, a fim de buscarmos patrimônios mais altos do ser; nem por isso, contudo, tais percalços nos impedem a exteriorização do sublime sentimento; represar-lhe o curso redundaria em extinguir o Universo, O que tortura a mente humana em tais ocasiões é o clima do cárcere organizado por nós mesmos; amurados no egoísmo feroz, não sabemos perder por alguns dias, para ganhar na eternidade, nem ceder valores transitários, para conquistar os dons definitivos da vida”.
Ante a moça que o contemplava, embevecida, através de espesso véu de lágrimas, o mensageiro prosseguiu:
— Efetivamente, se não podes partilhar a experiência do homem escolhido, em face das circunstâncias que te compelem à renúncia, porque não lhe consagrar o puro amor fraternal, que eleva sempre? Estaríamos, acaso, impedidos de transformar em irmãos os seres que admiramos? Não deves outrossim esquecer que o noivo perjuro, atualmente belo na figura fisiológica, vestirá também, mais tarde, o puído traje do cansaço e da velhice, se em breve não afivelar ao rosto a máscara da enfermidade e da morte. Conhecerá o desencanto da carne e estimará no silêncio a procura do espírito. Se o amas, em verdade, porque torturá-lo com o sarcasmo do suicídio, ao invés de cobrar forças para esperá-lo, ao fim do dia da existência mortal? Se não podes ser o cântaro de água pura para o viajor querido, porque não ser o oásis que o aguardará no deserto das desilusões inevitáveis? Além disto, como chegaste a sentir tão clamoroso desamparo, se também te aguardamos, ávidos aqui de tua afeição e de teu carinho?
Antonina sorriu, em êxtase, a despeito do pranto que lhe rolava a flux.
Observando o salutar efeito de suas palavras animadoras, Márcio acariciou-lhe os cabelos, murmurando:
— Por que razão esperar os rebentos da carne para exemplificar o verdadeiro amor? Jesus não os teve, e, no entanto, todos nos sentimos tutelados de sua infinita abnegação. Prometes, Antonina, modificar as disposições mentais doravante? A mulher digna e generosa, excelsa e cristã, olvida o mal e sina sempre...
Comovidos, vimos a interlocutora ajoelhar-se de novo, e exclamar solenemente:
— Comprometo-me a modificar minha atitude, em nome de Deus.
Nesse instante, o emissário espalmou as mãos sobre a fronte da enferma, envolvendo-a em jactos de luz que não tocaram tão somente a matéria perispirítica, mas se estenderam além, até no corpo denso, fixando-se particularmente nas zonas do encéfalo, do tórax e dos órgãos feminis. Logo após, Antonina, empolgada pela mãezinha e pelo companheiro da espiritualidade superior, afastou-se para agradável e repousante excursão.
Incumbiu-se Calderaro de auxiliá-la a retomar o veículo pesado nas primeiras
horas da manhã clara.
Edificado com as observações da noite, regressei, em companhia dele, ao quarto da senhorita quase suicida.
Entre as seis e sete horas, a genitora desencamada trouxe a filha, em cuja
fisionomia fulgurava ignota e incompreensível felicidade.
O instrutor ajudou-a reapossar-se do envoltório fisiológico, cercando-lhe o cérebro de emanações fluídicas anestesiantes, para que lhe não fosse permitido o júbilo de recordar, em todas as suas particularidades, a experiência da noite; se guardasse a lembrança integral, disse Calderaro, provavelmente enlouqueceria de ventura. Destarte, as alegrias por ela intensamente vividas seriam arquivadas em seu organismo sob forma de forças novas, estímulos desconhecidos, coragem e satisfação de procedência ignorada.
Com efeito, daí a minutos Antonina despertou, como que outra criatura; sentia-se inexplicavelmente reanimada, quase feliz.
Um dos pequenos sobrinhos penetrou o aposento, chamando-a. A generosa tia contemplou-o, enlevada.
Alguma energia prodigiosa, que lhe não era dado conhecer, religara-a ao interesse pela vida. Achou indizível contentamento no Sol que atravessava a vidraça, bendizia o quarto humilde onde lutava por atender aos desígnios de Deus, e sorria-se de haver, na véspera, pensado em fugir, sem razão, ao aprendizado do mundo. Não fora aquinhoada pela Providência com maravilhoso número de bênçãos? Contemplou a encantadora criança pobremente vestida, a solicitar-lhe a companhia para descerem ao pequeno jardim, onde flores novas desabrochavam. Que importa insignificante malogro
do coração diante dos trabalhos sublimes que poderia executar, na sua posição
de mulher sadia e jovem? Os filhinhos da irmã não lhe pertenciam igualmente?
não seria mais nobre viver para ser útil, esperando sempre da Inesgotável
Misericórdia?
— Titia Antonina! Titia Antonina, vamos! Vamos ver a roseira nova! — gritava o trêfego menino de cinco anos, em alegre invite à vida.
Observando-lhe a restauração das forças, vimo-la, sinceramente rejubilados, levantar-se a responder, sorrindo:
— Espera! já vou, meu filho!

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

AUTODESCOBRIMENTO - UMA BUSCA INTERIOR



Pelo Espírito Joanna de Ãngelis
Psicografado por Divaldo Franco


SINÓPSE:
Este livro é mais um ensaio da Psicologia espírita, onde a Instrutora Espiritual analisa o ser real, os conflitos, o inconsciente e o subsconciente, a viagem interior, os transtornos comportamentais, o pânico, a amargura, a conquista de si etc, facultando que cada um descubra seus limites reais e verdadeiras aspirações.

PRECISO DE AJUDA! HISTÓRIAS QUE PODEM MUDAR A SUA VIDA


Pelo Espírito de Eduardo
Psicografado por Célia Xavier de Camargo


SINÓPSE:
Os jovens trabalhadores da colônia espiritual "Céu Azul" mostram inúmeras atividades socorristas dos benfeitores espirituais junto àqueles que cultivam a idéia da autodestruição. Transmitem a valorização da vida nascida do auto-respeito, fator primordial para que os indivíduos alcancem a felicidade plena.

domingo, 8 de novembro de 2009

SEMANA - ESTUDO DO EVANGELHO - CAPÍTULO 9 ÍTEM 8 - MARIA J. CAMPOS


OBEDIÊNCIA E RESIGNAÇÃO

FONTE BÁSICA

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

1. Em que consiste a obediência aludida no texto?
É o cumprimento da lei de Deus. Pelo estudo do Evangelho e pela prática do mesmo, vamos ficando mais obedientes ao Pai, mais brandos e, conseqüentemente, mais felizes.

“A obediência é consentimento da razão”.

2. O que é resignação?
São os bons sentimentos que alimentamos em nosso coração. É compreender a necessidade de não nos revoltarmos, de sermos bons, a fim de sermos felizes.

“A resignação é o consentimento do coração”.

3. De que modo Jesus exemplificou a obediência e a resignação?
Cumprindo a vontade de Deus, junto a nós, compreendendo nossa fraqueza, sofrendo pacientemente as nossas agressões, perdoando-nos.

“Ninguém ascende no rumo de Deus, sem esforço sacrificial de si mesmo. A marcha evolutiva é de todos, mas a opção da estrada é de cada um”. (Marco Prisco/Luz Viva – nº 23).

4. Obediência e resignação equivalem à negação do sentimento e da vontade?
Não. Ao contrário, quando nos mostramos obedientes aos mandamentos divinos e resignação diante da nossa prova, estamos impondo o nosso sentimento de amor a Deus ao próximo e a nós mesmo, e exercendo a nossa vontade em dominar as nossas más tendências.

“Perante a visão acanhada dos homens, essas visões podem equivaler à negação do sentimento e da vontade; contudo, perante Deus, a quem devemos realmente prestar contas, essas virtudes representam disciplinamento da nossa vontade, no atendimento aos seus desígnios”.

5. Como podemos aprender e desenvolver em nós essas duas virtudes?
A perfeita assimilação do Evangelho de Jesus, por cada um de nós – seja pela própria conscientização, pelo exemplo das pessoas de bem, pelas boas leituras ou, ainda, pela orientação das religiões de conduzem ao bem – nos levará a desenvolver essas e outras virtudes. Em último caso, a dor, decorrente dos nossos desvios, também contribuirá.

“Por essa razão, em nossa família fraternal encontraremos sempre neste ou naquele irmão infeliz, o necessitado em forma de algoz ou travestido em piedoso censor, fiscalizando nossos atos e palavras...” (Joanna de Ângelis/Lampadário Espirita – nº 20).

6. A dor é, então, um ensinamento?
Sim. Quando nos deixamos levar pelo orgulho e pelo egoísmo, damos as costas para Deus, que nos adverte, pela dor, a fim de voltarmos ao bom caminho.

“A Somos espíritos enfermos em tratamento de emergência nas mãos de Jesus, o Amigo Incomparável e Constante”. (Joanna de Ângelis/Lampadário Espirita – nº 20).

7. Qual a conseqüência para aquele que não adota essas virtudes como conduta?
Terá retardado o seu progresso e deixará de contribuir para o aqueles que lhe compartilham o lugar na sociedade. Entretanto, a lei do progresso, que deve ser obedecida por todos, impõe ao espírito rebelde e preguiçoso a retomada ao caminho do bem, através de duros sacrifícios.

“Adiar a divida significa reencontrá-la mais tarde com juros adicionados em caráter de cobrança em moratória.” (Joanna de Ângelis/Lampadário Espirita – nº 20)

Conclusão:
A obediência e a resignação são duas virtudes que refletem o nosso ajustamento das leis divinas e nos permitem saudar mais rapidamente as faltas do passado, propiciando-nos o progresso e a nossa aproximação de Deus.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

ESTUDO DO LIVRO NOSSO LAR - CAPÍTULO 19 - JULIANA SOLARE


A JOVEM DESENCARNADA

- Sua neta não vem à mesa para as refeições? - perguntei à dona da
casa, ensaiando palestra mais íntima.
- Por enquanto, alimenta-se a sós - esclareceu dona Laura -, a tolinha continua nervosa, abatida. Aqui, não trazemos à mesa qualquer pessoa que se manifeste perturbada ou desgostosa. A neurastenia e a inquietação emitem fluidos pesados e venenosos, que se misturam automaticamente às substâncias alimentares. Minha neta demorou-se no Umbral quinze dias, em forte sonolência, assistida por nós. Deveria ingressar nos pavilhões hospitalares, mas, afinal, veio submeter-se aos meus cuidados diretos.
Manifestei desejo de visitar a recém-chegada do planeta. Seria muito interessante ouvi-la. Há quanto tempo estava sem notícias diretas da existência comum?
A senhora Laura não se fez rogada quando lhe dei a conhecer meu desejo.
Demandamos um quarto confortável e muito amplo. Uma jovem muito pálida repousava em cômoda poltrona. Surpreendeu-se vivamente ao verme.
- Este amigo, Eloísa - explicou a genitora de Lísias, indicando-me -, é um irmão nosso que voltou da esfera física, há pouco tempo.
A moça fitou-me curiosa, embora os olhos perdidos nas fundas olheiras traduzissem grande esforço para concentrar atenção.
Cumprimentou-me, esboçando vago sorriso, dando-me eu a conhecer, por minha vez.
- Deve estar cansada - observei.
Antes, porém, que ela respondesse, adiantou-se a senhora Laura, procurando subtrai-la a esforços sobreposse fatigantes:
- Eloísa tem estado inquieta, aflita. Em parte, justifica-se. A tuberculose foi longa e deixou-lhe traços profundos; entretanto, não se pode prescindir, a tempo algum, do otimismo e da coragem.
Vi a jovem arregalar os olhos muito negros, como a reter o pranto, mas em vão. O tórax começou a arfar-lhe violentamente e, colando o lenço ao rosto, não conseguia conter os soluços angustiosos.
- Tolinha! - disse a meiga senhora abraçando-a - é necessário reagir contra isso. Estas impressões são os resultados da educação religiosa deficiente, nada mais. Sabes que tua mãe não se demorará e que não podes contar com a fidelidade do noivo, que, de modo algum, está preparado a te oferecer uma sincera dedicação espiritual na Terra. Ele ainda está longe do espírito sublime do amor iluminado. Naturalmente, desposará outra e deves habituar-te a esta convicção. Nem seria justo exigir-lhe a vinda brusca.
Sorrindo maternalmente, a senhora Laura acrescentou:
- Admitamos que viesse, forçando a lei. Não seria mais duro o sofrimento? Não pagarias caro a cooperação que houvesses desenvolvido nesse particular? Não te faltarão amizades carinhosas, nem colaboração fraternal, para que te equilibres aqui. E se amas, de fato, o rapaz, deves procurar harmonia para beneficiá-lo mais
tarde. Além disso, tua mãe não tarda a chegar.
Penalizou-me o pranto copioso da jovem. Procurei estabelecer novo rumo à conversação, tentando subtrai-la à crise de lágrimas.
- Donde vem você, Eloísa? - interroguei.
A mãe de Lísias, agora calada, parecia igualmente desejosa de vê-la desembaraçar-se.
Após longos instantes em que enxugava os olhos lacrimosos, a moça respondeu:
- Do Rio de Janeiro.
- Mas não deve chorar assim - objetei. Você é muito feliz. Desencarnou há poucos dias, está com os seus parentes e não conheceu tempestades na grande viagem...
Ela pareceu reanimar-se, falando mais calma:
- Não imagina, porém, quanto tenho sofrido. Oito meses de luta com a tuberculose, não obstante os tratamentos... a mágoa de haver transmitido a moléstia a minha carinhosa mãe... Além disso, o que padeceu por minha causa o pobre noivo, é inenarrável...
- Ora, ora, não diga isso - observou a senhora Laura a sorrir. Na Terra temos sempre a ilusão de que não há dor maior que a nossa. Pura cegueira:
há milhões de criaturas afrontando situações verdadeiramente cruéis, comparadas às nossas experiências.
- Arnaldo, porém, vovó, ficou sem consolo, desesperado. Tudo isso dá que pensar - acentuou contrafeita.
- E acreditas sinceramente nessa impressão? - perguntou a matrona com inflexão de carinho. Observei teu ex-noivo, diversas vezes, no curso da tua enfermidade. Era natural que ele se comovesse tanto, vendo-te o corpo reduzido a frangalhos; mas não está preparado para compreender um sentimento puro. Reconfortar-se-á muito depressa. Amor iluminado não é para qualquer criatura humana. Conserva, portanto, o teu otimismo. Poderás auxiliá-lo, sem dúvida, muitas vezes, mas no que concerne à união conjugal, quando puderes excursionar às esferas do planeta, em nossa companhia, já
o encontrarás casado com outra.
Admirado por minha vez, notei a surpresa dolorosa de Eloísa. Não sabia a convalescente como portar-se ante a serenidade e o bom senso da avó.
- Será possível?
A genitora de Lísias esboçou um gesto extremamente carinhoso e falou:
- Não sejas teimosa, nem tentes desmentir-me.
Vendo que a enferma parecia tomar a atitude íntima de quem deseja provas, a senhora Laura insistiu, muito meiga:
- Não te recordas da Maria da Luz, a colega que te levava flores todos os domingos? Pois nota: quando o médico anunciou, em caráter confidencial, a impossibilidade de restabelecer-te o corpo físico, Arnaldo, embora muito magoado, começou a envolvê-la em vibrações mentais diferentes. Agora que aqui estás, não demorarão muito as resoluções novas.
Ah! que horror, vovó!
- Horror, por quê? É preciso te habituares a considerar as necessidades alheias. Teu noivo é homem comum, não está alertado para as belezas sublimes do amor espiritual. Não podes operai milagres nele, por muito que o ames. A descoberta de si mesmo é apanágio de cada um.
Arnaldo conhecerá mais tarde a beleza do teu idealismo; mas, por agora, é preciso entregá-lo às experiências de que necessita.
- Não me conformo! - clamou a jovem, chorando - justamente Maria da Luz, a amiga que sempre julguei fidelíssima.
A senhora Laura, todavia, sorriu e falou, cautelosa:
- Não será, porém, mais agradável confiá-lo aos cuidados de uma criatura irmã? Maria da Luz será sempre tua amiga espiritual, ao passo que outra mulher talvez te dificultasse, mais tarde, o acesso ao coração dele.
Eu estava eminentemente surpreendido. Eloísa prorrompera em soluços. A bondosa senhora percebeu-me a intranqüilidade e, no propósito talvez de orientar tanto a neta quanto a mim, esclareceu sensatamente:
- Sei a causa do teu pranto, filhinha: nasce da terra inculta do nosso milenário egoísmo, da nossa renitente vaidade humana. Entretanto, a vovó não te fala para ferir, mas para acordar.
Enquanto Eloísa chorava, a mãe de Lísias convidou-me novamente à sala de estar, considerando que a doente necessitava de repouso.
Ao sentarmo-nos, falou em tom confidencial:
- Minha neta chegou profundamente fatigada. Prendeu o coração, demasiadamente, nas teias do amor-próprio. A rigor, o lugar dela seria em qualquer dos nossos hospitais; entretanto, o Assistente Couceiro julgou melhor situá-la junto ao nosso carinho. Isso, aliás, é muito do meu agrado, porque minha querida Teresa, sua mãe, está a chegar. Um pouco de paciência e atingiremos a solução justa. Questão de tempo e serenidade.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

LIVRO AÇÃO E REAÇÃO


Ação e Reação (editado em 1957 pela FEB)

Neste livro André Luiz relata muitas reações acarretadas com as ações desviadas do bem. Espíritos valorosos relatam as dificuldades para corrigir as más ações do passado. Explica a necessidade de, conforme Jesus nos orientou, reconciliarmo-nos com os nossos adversários para podermos seguir no caminho para a evolução.

André Luiz e Hilário passam um período longo na "Mansão Paz" e ao lado do instrutor Druso ou do assistente Silas estudam situações sobre viciação, aborto, suicídio, carma, reencarnação, mediunidade e muito mais. Vale ressaltar a explicação sobre a dor e também sobre resgates coletivos.

Foi o livro que mais profundamente penetrou em meu coração, pois senti intensamente o quanto falimos por ainda estarmos envolvidos no orgulho, no rancor e não corrigirmos nossos maus sentimentos. Se a bondade morasse com maior intensidade em nossos corações, nós entenderíamos os nossos companheiros de caminho e não guardaríamos maus sentimentos conosco. Pela nossa imperfeição é que ainda estamos tão longe da paz.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

ESTUDO DO LIVRO NO MUNDO MAIOR - CAPÍTULO 12


12
ESTRANHA ENFERMIDADE


Acompanhando o abnegado irmão dos sofredores, penetrei confortável residência, onde Calderaro me conduziu, incontinente, à presença de um nobre cavalheiro em repouso.
Achamo-nos em elegante aposento, decorado em ouro-velho. Magnífico tapete completava a graça ambiente, exibindo caprichosos arabescos em harmonia com os desenhos do teto.
Estirado num divã, o enfermo que visitávamos engolfava-se em profunda meditação. Ao lado, humilde entidade de nossa esfera como que nos aguardava.
Aproximou-se e cumprimentou-nos, gentil.
Às fraternas interpelações do Assistente, respondeu solícita:
— Fabrício vai melhorando; no entanto, continuam os fenômenos de angústia. Tem estado inquieto, aflito...
O orientador lançou expressivo olhar ao doen¬te e insistiu:
— Mantém ainda o autodomínio? não se abandonou totalmente às impressôes destrutivas?
A interlocutora, revelando contentamento, informou:
— A Divina Misericórdia não tem faltado. O desequilíbrio integral, por enquanto, não erigiu seu império. Em nome de Jesus, nossa colaboração tem prevalecido.
Calderaro, então, fraternalmente indagou, dirigindo-se a mim:
— Chegaste, alguma vez, a examinar casos declarados de esquizofrenia?
Não adquirira conhecimentos especializados da matéria; todavia, não ignorava constituir esse morbo uma das mais inquietantes questôes da psiquiatria moderna.
— Este ramo ingrato da Ciência, que estuda a patologia da alma — declarou o companheiro, compreendendo a minha Insipiência —, é, há muito tempo, campo de batalha entre fisiologistas e psicologistas; tal conflito é, em verdade, lamentável e bizantino, de vez que ambas as correntes possuem razões substanciais nos argumentos com que se digladiam. Somos, contudo, forçados a reconhecer que a psicologia ocupa a melhor posição, por escalpelar o problema nas adjacências das causas profundas, ao passo que a fisiologia analisa os efeitos e procura remediá-los na superfície.
Logo após, o Assistente recomendou-me examinar a esfera mental do visitado.
Auscultei-lhe o íntimo, ficando aterrado com as inquietudes que lhe povoavam o ser, O cérebro apresentava anomalias estranhas. Toda a face inferior mostrava manchas sombrias. Os distúrbios da circulação, do movimento e dos sentidos eram visíveis. Calderaro apresentara-me Fabrício, classificando-o como esquizofrênico; mas não es¬taríamos, ali, perante um caso de neurastenia cérebro-cardíaca?
O instrutor ouviu-me pacientemente e observou:
— Diagnóstico exato, no aspecto em que o nosso amigo se apresenta hoje. A esquizofrenia, contudo, originando-se de sutis perturbações do organismo perispirítico, traduz-se no vaso rico por surpreendente conjunto de moléstias variáveis e indeterminadas. No momento, temos aqui a doença de Kriahaber com todos os característicos especiais.
Mostrando grave expressão no semblante, acrescentou:
— Repara, contudo, além dos efeitos mutáveis. Analisa a mente e os domínios das sensações.
Lancei mais profundamente a sonda de minha observação sobre os quadros interiores do enfer¬mo e percebi-lhe imagens torturantes na tela da memória.
Ensimesmado, Fabrício não se dava conta do que ocorria no plano externo. Braços imóveis, olhos parados, mantinha-se distante das sugestões ambientes; no íntimo, todavia, a zona mental semelhava-se a fornalha ardente.
A imaginação superexcitada detinha-se a ouvir o passado... Recordava-lhe a figura de um velhinho agonizante. Escutava-lhe as palavras da última hora do corpo, a recomendar-lhe aos cuidados três jovens presentes também ali, na paisagem de suas reminiscências. O moribundo devia ser-me o genitor, e os rapazes, irmãos. Conversavam, entre si, lacrimosos. De repente, modificavam-se-lhe as lembranças. O ancião e os jovens pareciam revoltados contra ele, acusando-o. Nomeavam-no com descaridosas designações...
O doente ouvia as vozes internas, ansioso, amargurado. Desejava desfazer-se do pretérito, pagaria pelo esquecimento qualquer preço, ansiava de fugir a si próprio, mas em vão: sempre as mesmas recordações atrozes vergastando-lhe a consciência.
Verificava-lhe eu os estragos orgânicos, resultantes do uso intensivo de analgésicos. Aquele ho¬mem deveria estar duelando consigo mesmo, desde muitos anos.
Achava-me no exame da situação, quando uma senhora idosa surgiu no aposento, tentando chamá-lo à realidade.
— Vamos, Fabrício! não se alimenta hoje?
O interpelado vagueou o olhar pela sala, esboçou uma resposta negativa sem palavras e deixou-se ficar na mesma posição.
A matrona insistiu, afável, mas não conseguiu demovê-lo. E porque prosseguisse, atenciosa, bus¬cando ministrar-lhe um caldo, o enfermo levantou-se, de súbito, como se houvera repentinamente enlouquecido. Esbravejou expressões inconvenientes e ingratas; rubro de cólera, repeliu o oferecimen¬to, surpreendendo-me pela crise de nervos destrambelhados.
A esposa regressou ao interior da casa, enxugando os olhos, enquanto Calderaro me esclarecia, comovido:
— Está no limiar da loucura, e ainda não enveredou francamente pelo terreno da alienação mental, graças à dedicação de velha parenta desencarnada que o assiste, vigilante.
Logo após, o Assistente o submeteu a operações magnéticas de reconforto, vigorando-lhe a resistência.
Ante o neurastênico, mais calmo agora, narrou, com serenidade:
- Nosso irmão enfermo teve a infelicidade de apropriar-se indebitamente de grande herança, depois de haver prometido ao genitor moribundo velar pelos irmãos mais novos, na presença destes; ao se sentir, porém, senhor da situação, desamparou os manos e expulsou-os do lar, valendo-se de rábulas bem remunerados, desses que, sem escrúpulo, vivem de inquinar os textos legais. Por mais enérgicas e convincentes as reclamações arrazoa¬das, por mais comovedores os apelos à amizade fraterna, manteve-se ele em clamorosa surdez, arrojando os irmãos à penúria e a dificuldades de toda a sorte. Dois deles morreram num sanatório em catres da indigência, minados pela tuberculose que os surpreendeu em excessivas tarefas noturnas; e o outro desencarnou em míseras condições de infortúnio, relegado ao abandono, antes dos trinta anos, presa de profunda avitaminose, consequente da subalimentação a que fora compelido. Tudo isto nosso desditoso amigo conseguiu fazer, escapando à justiça terrena; entretanto, não pôde eliminar dos escaninhos da consciência os resquícios do mal praticado; os remanescentes do crime são guardados em sua organização mental como carvões em paisagem denegrida, após incêndio devorador; e esses carvões convertem-se em brasas vivas, sempre que excitados pelo sopro das recordações. O mau filho e perverso irmão, enquanto senhor dos patrimônios de resistência que a virilidade do corpo lhe permitia, lograva fugir de si mesmo, sem grandes dificuldades. O dinheiro fácil, a saúde sólida, os divertimentos e prazeres, desempenhavam para ele a função de pesadas cortinas entre o personalismo arrogante e a realidade viva. Todavia, o tempo cansou-lhe o aparelho fisiológico e consumiu-lhe a maioria das ilusões; pouco a pouco, encontrou-se a si mesmo; na viagem de volta ao próprio eu, viu-se, porém, a sós com as lembranças de que não conseguira escoimar-se. Debalde intentou descobrir o bom ânimo e o bem-estar: estes se lhe ocultavam. Impossível era concentrar-se no próprio ser, sem ouvir o pai e os irmãos, acusando-o, expro¬brando-lhe a vileza... A mente atormentada não achava refúgio consolador. Se rememorava o pretérito, este lhe exigia reparação; se buscava o presente, não obtinha tranquilidade para se manter no trabalho sadio; e, quando tentava erguer-se a plano superior, desejoso de orar ao Altíssimo, era surpreendido, ainda aí, por dolorosas advertências, no sentido de inadiável correção da falta cometida. Nesse estado espiritual, interessou-se tardiamente pelo destino dos irmãos. As informações colhidas não lhe deixavam margem ao pagamento imediato; haviam todos partido, precedendo-o na grande jornada do túmulo. Desde então, verificando a impraticabilidade de rápida retificação do tortuoso destino, o infeliz fixou-se nas zonas mais baixas do ser. Perdeu as ambições nobres e os ideais sadios, passou a ignorar os recursos da esperança. As vantagens materiais, ao invés de confortá-lo, infundiam-lhe, agora, pavoroso tédio e indizível desgosto. Engrazado à máquina das responsabilidades finan¬ceiras, criadas por ele mesmo sem o espírito de possuir para dar em nome do Bem Universal, não lhe foi possível esquivar-se às imposições da vida social, na qualidade de homem de alto comércio, até que baqueou, em supremo torpor. Sentindo-se incriminado no tribunal da própria consciência, começou a ver perseguidores em toda a parte. Adqui¬riu, assim, fobias lamentáveis. Para ele, todos os pratos estão envenenados. Desconfia de quase todos os familiares e não tolera as antigas relações.
O excesso de recursos materiais fê-lo descrente da amizade sincera, conferiu-lhe noções de privilégio que nunca mereceu, acentuou-lhe a independência destrutiva, extinguiu-lhe no coração a bendita luz do verbo “servir”. Como vemos, sua situação é absolutamente desfavorável ao necessário reerguimento. A condição, a que se impôs pelos desejos menos nobres que sempre nutriu, é de apatia e de esterilidade...
A essa altura da narrativa, Calderaro apontou em particular o cérebro doente, e explicou:
O sistema nervoso, que se liga à câmara encefálica através de processos indescritíveis na técnica da ciência humana, mais não é do que a representação de importante setor do organismo perispirítico, segundo acabamos de estudar. A mente falida de Fabrício, experimentando insistentes remorsos e aflitivas preocupações, intoxicou esses centros vitais com a incessante emissão de energias corruptoras. Consequentemente, verificou-se o que em boa psiquiatria poderíamos designar por desão generalizada do sistema nervoso». Tal desastre atingiu, em primeiro lugar, as sedes das conquistas mais recentes da personalidade, isto é, as células e os estímulos mais jovens, que se localizam nos lobos frontais e no córtex motor, inutilizando temporàriamente o nosso amigo, para a meditação elevada e para o trabalho sadio, e obrigando-o a regredir, no terreno espiritual, para dentro de si mesmo. De mente estacionária agora, em plena região instintiva da individualidade, nosso enfermo ainda não se acha positivamente desequilibrado, graças à contínua assistência de nosso plano.
Calando-se o Assistente, ousei interrogar:
— Mas há esperança de reequilibrio para breve?
— Absolutamente não — respondeu o interpelado, de maneira significativa —; no caso dele, funcionariam em vão as terapêuticas em uso. O espírito delinquente pode receber os mais variados gêneros de colaboração, mas será imperiosamente o médico de si mesmo. A Justiça Divina exerce invariável ação, embora os homens não a identifiquem no mecanismo de suas relações ordinárias. Os criminosos podem, por muito tempo, escapar ao corretivo da organização judiciária do mundo; no entanto, mais cedo ou mais tarde, vaguearão, perante os seus irmãos em humanidade, em baixo terreno espiritual, representado no quadro de aflições punitivas. Para os familiares e amigos, Fabrício é um esquizofrênico, incapaz de resistir às aplicações do choque insulínico em virtude do coração frágil e cansado; todavia, para nós é um companheiro acidentado na ambição inferior, curtindo amargos resultados de seus propósitos de dominar egoisticamente na vida.
Interrompendo-se o orientador, dei guarida a interrogações naturais no campo Intimo.
Se o doente não oferecia perspectivas de melhoras substanciais, qual o objetivo de nossa assistência? porque nos demorarmos à frente de um caso insolvível, qual aquele, pela impossibilidade de próximo reencontro entre o criminoso e suas vítimas?
Calderaro não me deixou sem resposta.
— Estamos aqui — elucidou, atencioso —, a fim de proporcionar-lhe morte digna. Não chegará a enlouquecer em definitivo. Com o nosso concurso fraterno, desencarnará antes do eclipse total da razão.
E porque me mostrasse espantado, o prestimoso amigo acrescentou:
— Fabrício desposou uma criatura, por todos os títulos credora do amparo celestial, e essa mulher quase sublime deu-lhe três filhos, pos quais ele se consagrou nobremente, preparando-os para elevado ministério social. São eles, presentemente, dois professores e um médico, dedicados ao ideal superior de servir ao bem coletivo. Fabrício não tem o direito de perturbar a família organizada à sombra de seu amparo material, mas educada sem o seu personalismo despótico. Pelo serviço que prestou à esposa e aos filhos, recebe do Alto o socorro de agora, de maneira a transferir residência, por imposição da morte, preparado para o futuro de reajustamento. As preces da companheira e dos filhos garantem-lhe uma “boa morte” próxima, para a qual vamos organizando as suas energias e habituando pari passu a família a permanecer em missão ativa no bem sem a presença material dele.
Silenciou o Assistente, dispondo-se a fazer-lhe aplicações magnéticas no aparelho circulatório. Demorou-se minutos longos administrando-lhe
forças ao redor dos vasos mais importantes e, em seguida, desenvolveu passes longitudinais, destinados à quietação dos nervos.
Ante minha admiração natural, Calderaro explicou-se:
— Preparamos acesso à trombose pela calcificação de certas veias. A desencarnação chegará suavemente, dentro de alguns dias, como providência compassiva, indispensável à felicidade do euferino e de quantos lhe seguem de perto o martírio.
O doente, mais calmo, parecia haver sorvido milagroso analgésico. Aquietou-se, descansando a cabeça nos travesseiros alvos.
Dentro do silêncio que se fizera entre nós, ia¬daguei, curioso:
— Considerando, no entanto, o decesso, em breves dias, como prosseguirá o processo de resgate do nosso amigo?
— A liquidação já começou — redarguiu o instrutor, sereno.
— Como?
Calderaro fêz expressivo gesto e recomendou:
— Espera.
Nesse mesmo instante, o enfermo acionou a campainha à cabeceira. A esposa atendeu, à pres¬sa. Encontrou-o melhor e sorriu, feliz.
O velho, mais tranquilo, rogou:
— Inês, posso ver o Fabricinho?
— Como não? — respondeu a companheira delicadamente — vou buscá-lo.
Em poucos minutos, regressava trazendo um menino de seus oito anos. O pequeno atirou-se-lhe aos braços esqueléticos, com extremado carinho, e perguntou:
— Está melhor, vovô?
O doente contemplou-o, enternecido, infor¬mando:
— Estou melhor, meu filhinho... Porque não veio de manhã?
— Vovó não deixou.
— Sim, é verdade; eu não me achava bem...
A senhora retirou-se, para acompanhar a cena do outro lado da cortina.
Avô e neto sentiram-se mais à vontade.
Totalmente transfigurado com a presença do menino, nosso quase demente amigo suplicou:
— Fabricinho, eu desejo que você reze por mim...
O petiz não se fêz rogado.
Ajoelhou-se ali mesmo e disse, respeitosa-mente, a oração dominical.
Terminada a prece, o doente pediu, de olhos umidos:
— Não se esqueça, meu filho, de orar por mim quando eu morrer.
O menino, agora de pé, enlaçou-lhe o busto e exclamou, chorando discretamente:
— O senhor não morrerá!... Mostrando-se aliviado, o velhinho correspondeu ao gesto afetivo, fitou o neto e inquiriu, com estranho fulgor no olhar:
— Fabricinho, você acredita que Deus perdoa aos pecadores como eu?
O pequeno respondeu, lacrimoso e confundido:
— Eu acho, vovô, que Deus perdoa todos nós.
Revelando as ansiedades que lhe povoavam a alma, voltou à indagação:
— Mesmo a um homem que trai a confiança paterna e rouba aos irmãos?
O netinho hesitou, incapaz de apreender toda a extensão daquela pergunta intencional; entretanto, no desejo de agradar ao doente, de qualquer modo, balbuciou com toda a simplicidade infantil:
— Eu penso que Deus perdoa sempre...
— É o que eu pretendia saber — acentuou o velhinho, mais confortado.
A conversação entre ambos prosseguiu afetuosa e amena.
Após detido exame, Calderaro apontou para a criança e esclareceu:
— Este menino é o ex-pai de Fabricio, que volta ao convívio do filho delinqüente pelas portas benditas da reencarnação. É o único neto do enfermo e, mais tarde, assumirá a direção dos patrimônios materiais da família, bens que inicialmente lhe pertenciam. A Lei jamaiS dorme.
Assombrado com a informação, remol as perguntas que me afloravam, espontâneas.
Como se redimiria, por sua vez, o velho Fabrício? Regressaria também, em dias futuros, àquele mesmo lar? Sofreria o desequilíbrio completo, depois da morte do corpo denso? Demorár-se-ia em perturbação?
Calderaro, dando por findos nossos trabalhos de assistência na casa, sorriu para mim, preparou-se para a retirada e obtemperou:
— Nosso amigo enfermo, guardando na mente os resíduos da ação criminosa, logo após o abandono do domicílio fisiológico experimentará, por muito tempo, os resultados de sua queda, até que o sofrimento alije os elementos malignos que lhe intoxicam a alma. Quando esse serviço purgatonal estiver completo, então...
— Regressará aos seus familiares? — inquiri, ansioso, ante a frase suspensa.
— Se o grupo consangüíneo atual houver elevado o padrão espiritual a luminosas culminâncias, será compelído a esforçar-se intensivamente pelo alcançar. Entretanto, jamais estará desamparado. Todos temos a imensa família, dentro da qual nos integramos desde a origem — a Humanidade.
Nesse instante, abandonávamos o aposento suntuoso.
Em breves segundos, tornávamos à Natureza gozando a bênção do céu muito límpido. E enquanto o meu instrutor se refugiava em si mesmo, atento às responsabilidades do serviço, dei expansão a novos pensamentos, relativos à amplitude e à grandeza do império da justiça.