quinta-feira, 30 de setembro de 2010

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 26 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



26 – Mãe e Filho

A alegria plena coroara o trio doméstico.
Mostrando a expectativa de uma colegial preocupada em receber a aprovação dos mentores, Odila ergueu os olhos lacrimosos para Irmã Clara, perguntando:
– Terei agido corretamente?
Lia-se-lhe no rosto a necessidade de uma frase estimulante.
A venerável amiga conchegou-a de encontro ao coração.
– Venceste, valorosa – disse, terna –; compreendeste o santo dever do amor. Abençoarás para sempre este maravilhoso dia de renúncia e doação de ti mesma.
Vimos Odila colar-se a ela, à maneira de uma criança nos braços maternais, chorando copiosamente.
– Não te comovas tanto assim! – apelou a benfeitora, osculando- lhe os cabelos.
Sensibilizando-nos igualmente, a primeira esposa de Amaro respondeu com dificuldade:
– Meu pranto não é de sofrimento... Sinto-me agora leve e feliz...
Como não compreendia eu assim, antes!...
– Sim – elucidou Clara, de modo significativo –, perdeste peso espiritual, habilitando-te à elevação de nível. Nossas paixões inferiores imantam-nos à Terra, como o visco prende o pássaro a distância das alturas...
E, afagando-a, acentuou, bondosa:
– Vamos! Deste agora o amor puro e, por isso, o amor puro não te faltará. De ora em diante, serás aqui bem-aventurada mensageira, de vez que o teu coração permanecerá em serviço dos anjos guardiães de nossos destinos, que velam por nós abnegadamente, esperando-nos na Vida Mais Alta. Cedendo o carinho de teu companheiro à outra mulher, de cuja colaboração necessita ele para redimir-se, conquistaste nele novo patrimônio de afetividade, e, aproximando a filhinha daquela a quem devemos querer como irmã, adquiriste o merecimento indispensável para recuperar o filhinho, cujo futuro poderás orientar... Hoje mesmo, estarás ao lado de teu Júlio...
Odila, transfigurada, estampou no semblante a luz da felicidade que lhe fluía do mundo interior.
O Sol inundava a Terra de raios vivificantes, quando a reconduzimos ao hospital, com a promessa de buscá-la, mais tarde, para a viagem ao Lar da Bênção.
Com efeito, transcorridas algumas horas, quando a pausa dos nossos compromissos de trabalho nos ofereceu a oportunidade precisa, convocamo-la ao reencontro.
Sustentada nos braços de Clara, a mãezinha de Júlio revelava inexcedível contentamento.
Era a primeira vez, depois da morte física, que se confiava a romagem tão linda, prorrompendo em exclamações admirativas, ante os surpreendentes jogos da luz.
Nas vizinhanças do sítio para o qual nos dirigíamos, inalava o ar tonificante a longos haustos, deslumbrando-se na visão da Natureza saturada de perfumes e adornada de flores.
Extasiou-se na contemplação das centenas de pequeninos, que brincavam festivamente. Muito pálida, de atenção presa à multidão infantil, na procura ansiosa do filho, achava-se mentalmente muito distanciada de nosso grupo. Por isso mesmo, deixava-se conduzir qual se fora um autômato.
Acompanhando Clarêncio, atingimos a residência de Blandina, que nos acolheu com a gentileza habitual.
Entramos.
Não houve necessidade de muitas palavras.
Atraída pelo grande berço que se levantava à nossa vista, Odila precipitou-se sobre o menino enfermo, bradando, alarmada:
– Meu filho! Júlio! Meu filho!...
Indubitavelmente, a Sabedoria Universal colocou imperscrutáveis segredos no carinho materno. Algo de milagroso e divino existe nos laços que unem mães e filhos que, por enquanto, não podemos apreender.
A criança doente transformou-se, de súbito.
Indefinível expressão de felicidade cobriu-lhe o semblante.
– Mãe! Mãe!... – gritou, respondendo.
E alongou os braços, agarrando-se-lhe ao busto.
Em lágrimas, Odila retirou-o instintivamente do leito, beijando-o enternecida.
Quando se lhe asserenou a desbordante emotividade, sentou-se ao nosso lado, trazendo o filho ao colo.
Júlio, completamente modificado, contava-lhe quanto lhe doía a garganta, mostrando-lhe a glote extensamente ferida.
E terminada que foi a hora comovente que nos empolgara a todos, Blandina abriu a conversação geral, acentuando, contente:
– Sabíamos que a Divina Bondade não deixaria o nosso doentinho sem a ternura maternal.
Júlio agora terá junto dele a insubstituível dedicação.
Odila, que se mostrava compreensivelmente conturbada, ante a posição orgânica do menino, nada respondeu; contudo, Clara considerou, afetuosa:
– Esperamos localizar nossa amiga no Parque, por algum tempo, e, certo, sentirá prazer em encarregar-se do pequenino.
– Sim, a Escola das Mães apresenta vastas disponibilidades – informou Blandina, prestimosa.
– Odila poderá entregar-se com segurança à tarefa assistencial que Júlio exige. Receberá todos os recursos...
– Aflige-me encontrá-lo assim – alegou a genitora preocupada, indicando o pequeno enfermo –, não posso atinar com a razão de uma úlcera tão grande, sem o corpo de carne... Não tenho bases para entender de uma só vez tudo quanto vejo, mesmo porque também eu andava louca, incapaz de raciocinar...
Reparei que o Ministro e a Irmã Clara se entreolharam, de modo expressivo, dando-me a idéia de que conversavam, através do pensamento.
Assinalando as doloridas referências maternas, a instrutora designou com a destra o nosso orientador, ajuntando bem humorada:
– Clarêncio tem a palavra elucidativa.
– Sim – ponderou o Ministro, cauteloso –, nossa irmã, como é natural, encontrará pela frente variados problemas ligados ao caminho de elevação que lhe é próprio. Achamo-nos todos infinitamente longe do Céu que fantasiávamos na Terra e cada qual de nós detém consigo deficiências que será preciso superar. O passado
reflete-se no presente.
Sorrindo, acrescentou:
– Nosso destino é assim como o rio. Por mais diferenciado se encontre, à distância da nascente que lhe dá origem, está sempre ligado a ela pela corrente em ação contínua...
– Procurarei compreender – disse Odila mais segura de si –, sou mãe e não posso desvencilhar-me da obrigação de amparar meu filhinho. Dispensar-lhe-ei todos os cuidados imprescindíveis ao seu bem-estar. Sinto que a felicidade pode ser conquistada no mundo a que fomos trazidos pela renovação... Trabalharei quanto
estiver ao meu alcance para ver Júlio integralmente refeito. Hoje, novos ideais me banham o coração. É imperioso esforçar-me.
Todos os que amamos virão ter conosco, mais cedo ou mais tarde...
Esperanças diferentes me animam o espírito. Amanhã, no porvir talvez próximo, terei meus familiares aqui, de novo, e não posso olvidar a necessidade de algo fazer para conseguir o abrigo de que necessitamos...
Passeou o olhar vago e cismarento pelo recinto, como se estivesse contemplando remotos horizontes, e concluiu:
– Um lar... a felicidade restaurada... a bênção do reencontro...
Por largo tempo, o comentário edificante brilhou na sala, aquecendo a chama da amizade e da confiança em nossos corações.
Blandina e Mariana prometeram cooperar, insistindo para que Odila se demorasse junto delas, até situar-se, em definitivo, no educandário a que se destinava.
A renovada senhora aceitou, reconhecidamente.
Despedimo-nos, felizes.
Após nos separarmos de Clara, retomando o caminho de volta ao nosso domicílio espiritual, julguei conveniente interpelar o instrutor, acerca dos problemas que me esfervilhavam no cérebro.
Porque não esclarecer Odila, com respeito ao pretérito de Júlio?
Seria aconselhável deixá-la entregue a informações deficientes, quando lhe conhecíamos extensamente os enigmas da organização familiar? Porque não lhe explanar francamente o impositivo da reencarnação do menino?
Clarêncio, como de outras vezes, ouviu sereno e generoso.
Quando acabei o interrogatório, replicou sem alterar-se:
– À primeira vista, seria efetivamente esse o caminho a seguir, entretanto as recordações do pretérito não devem ser totalmente despertadas, para que ansiedades inúteis não nos dilacerem o presente. A verdade para a alma é como o pão para o corpo que não pode exorbitar da quota necessária a cada dia. Toda precipitação
gera desastres. Além do mais, não nos cabe a vaidade de qualquer antecipação a providências que serão agradáveis e construtivas ao amor de nossa irmã. Sentindo-se ainda plenamente integrada no carinho materno, ela própria assumirá a responsabilidade do trabalho alusivo à reencarnação do pequeno. Advogando
ela mesma essa medida e destinando-se a criança ao seu antigo lar, encontrará no assunto abençoado serviço de fraternidade, ao mesmo tempo que se reconhecerá mais responsável. Se movêssemos as decisões, Odila observar-se-ia anulada em sua capacidade de agir, ao passo que, confiando a ela as deliberações que o caso
reclama, adquirirá novo interesse para auxiliar Zulmira, de vez que a segunda esposa de Amaro substitui-la-á na condição de mãe, oferecendo novo corpo ao filhinho...
Admirado com os apontamentos ouvidos, vi-me satisfeito na inquirição.
Clarêncio, todavia, com o sorriso natural que lhe marcava habitualmente o semblante, aduziu, calmo:
– A vida é uma escola e cada criatura, dentro dela, deve dar a própria lição. Esperemos agora alguns dias. Interessada em socorrer o filhinho doente, a própria Odila virá até nós, lembrando para ele a felicidade da volta à Terra.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

SEMANA - ESTUDO DO EVANGELHO CAPÍTULO 14 ÍTEM 8 - MARIA J. CAMPOS



FONTE BÁSICA

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

HONRAI A VOSSO PAI E A VOSSA MÃE

A Parentela Corporal e a Parentela Espiritual

1. Como se explica o vínculo que existe entre um pai e um filho?
O pai fornece ao filho apenas o invólucro corporal, uma vez que o espírito já existia antes da formação do corpo. Se estão unidos, é em razão dos laços de simpatia que já existiam anteriormente ao reencarne.

“O corpo procede do corpo, mas o espírito não procede do espírito.”
“Não é o pai quem cria o espírito de seu filho.”


2. Qual é o dever do pai, com relação ao seu filho?
Auxiliar o seu desenvolvimento físico, intelectual e moral, a fim de fazê-lo progredir, além de orientá-lo na prática do bem.

Filhos são espíritos a quem estamos ligados e que precisam do apoio dos pais para progredir.

3. Como se formam as famílias do passado, como filhos?
Pela união de espíritos ligados por anteriores relações de simpatia, que se expressam por uma afeição recíproca na vida terrena, ou pelo reencontro de espíritos afastados entre si por antipatias anteriores ou cumplicidade no mal, traduzidas por incompatibilidade entre os mesmos.

“Não são os da consangüinidade os verdadeiros laços de família, e sim os da simpatia e da comunhão de idéias”.

4. Podemos ter, então, inimigos do passado como filhos?
Sim. Daí, uma das finalidades da família terrena: proporcionar, pelos laços consangüíneos, reajustes de relacionamento entre espíritos inimigos, atendendo aos reclames da lei de Deus, que é de fraternidade.

“Dois seres nascidos de pais diferentes podem ser mais irmãos, pelo espírito, do que se o fossem pelo sangue.”

5. Como definimos a parentela corporal e espiritual?
A corporal é aquela constituída pelos braços frágeis da consangüinidade e da matéria, que se extinguem com o tempo e, muitas vezes, dissolve-se moralmente já na existência atual; a espiritual é aquela caracterizada pelos laços espirituais, fortalecida pela purificação, e se perpetua no mundo dos espíritos.

“Há, pois, duas espécies de famílias: as famílias pelos laços espirituais e as famílias pelos laços corporais.”

6. Que ensinamento nos transmitiu Jesus, ao dizer: “Eis aqui meus verdadeiros irmãos, referindo-se àqueles que não eram seus parentes?
Que os nossos verdadeiros irmãos são aqueles a quem nos ligamos pelos laços eternos e duráveis do espírito, caracterizados pela estima e simpatia mútua, e não necessariamente aqueles a quem nos vinculamos pelos laços frágeis e temporários da matéria.

Devemos nos esforçar para criar e/ou fortalecer os laços de simpatia entre os que constituem nossa parentela corporal, na atual existência.
Há pessoas que amamos mais do que os irmãos consangüíneos, mesmo nada sendo para nós.


Conclusão:

Os verdadeiros laços de família são os espirituais, não os da consangüinidade, uma vez que são espíritos que se amam ou se odeiam e não os corpos que, terminantemente, habitam. Assim, a nossa família é o ambiente de purificação, para onde somos atraídos pelos laços estabelecidos em existências anteriores.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

ESTUDO DO LIVRO NOSSO LAR - CAPÍTULO 45 - JULIANA SOLARE



No Campo da Música

À tardinha, Lísias convidou-me para acompanhá-lo ao Campo da Música.
- É preciso distrair-se um pouco, André! - disse ele, gentil.
Vendo-me relutante, acentuou:
- Falarei a Tobias. A própria Narcisa consagrou o dia de hoje ao descanso. Vamos!
Eu, porém, observava em mim mesmo singular fenômeno. Não obstante a escassez dos meus dias de serviço, já dedicava grande amor àquelas Câmaras. As visitas diárias do Ministro Genésio, a companhia de Narcisa, a inspiração de Tobias, a camaradagem dos companheiros, tudo isso me falava particularmente ao espírito. Narcisa, Salústio e eu
aproveitávamos todos os instantes de folga para melhorar o interior, aqui e ali, suavizando a situação dos enfermos, que estimávamos de todo o coração, como se fossem nossos filhos. Considerando a nova posição em que me encontrava, acerquei-me de Tobias, a quem o enfermeiro do Auxilio dirigiu a palavra com respeitosa intimidade. Recebendo a solicitação, meu iniciador no trabalho anuiu, satisfeito:
- Ótimo programa! André precisa conhecer o Campo da Música.
E, abraçando-me:
- Não hesite. Aproveite! Volte à noite, quando quiser. Todos os nossos serviços estão convenientemente atendidos.
Acompanhei Lísias, reconhecidamente. Atingindo-lhe a residência, no Ministério do Auxílio, tive a satisfação de rever a senhora Laura e informarme quanto ao regresso da abnegada mãe de Eloísa, que deveria regressar do planeta, na próxima semana. A casa estava repleta de contentamento.
Havia mais beleza no interior doméstico, novas disposições no jardim.
Despedindo-nos, a dona da casa me abraçou e falou, bem-humorada:
- Então, doravante, a cidade terá mais um freqüentador para o Campo da Música! Tome cuidado com o coração!...
Quanto a mim, ainda ficarei hoje em casa. Vingar-me-ei de vocês, porém, muito breve! Não me demorarei a buscar meu alimento na Terra!...
Em meio da geral alegria, ganhamos a via pública. As jovens faziam-se acompanhar de Polidoro e Estácio, com quem palestravam animadamente.
Lísias, a meu lado, logo que deixamos o aeróbus numa das praças do Ministério da Elevação, disse carinhoso:
- Finalmente, vai você conhecer minha noiva, a quem tenho falado muitas vezes a seu respeito.
- É curioso - observei, intrigado - encontrarmos noivados, também por aqui...
- Como não? Vive o amor sublime no corpo mortal, ou na alma eterna?
Lá, no círculo terrestre, meu caro, o amor é uma espécie de ouro abafado nas pedras
brutas. Tanto o misturam os homens com as necessidades, os desejos e estados inferiores, que raramente se diferenciará a ganga do precioso metal.
A observação era lógica. Reconhecendo o efeito benéfico da explicação, prosseguiu:
- O noivado é muito mais belo na espiritualidade. Não existem véus de ilusão a obscurecer-nos o olhar. Somos o que somos. Lascínia e eu já fracassamos muitas vezes nas experiências materiais. Devo confessar que quase todos os desastres do pretérito tiveram origem na minha imprevidência e absoluta falta de autodomínio. A liberdade que as leis sociais do planeta conferem ao sexo masculino, ainda não foi devidamente
compreendida por nós outros. Raramente algum de nós a utiliza no mundo em serviço de espiritualização. Amiúde, convertemo-la em resvaladouro para a animalidade. As mulheres, ao contrário, têm tido, até agora, a seu favor, as disciplinas mais rigorosas. Na existência passageira, sofrem-nos a tirania e suportam o peso das nossas imposições; aqui, porém, verificamos o reajustamento dos valores. Só é verdadeiramente livre quem aprende a obedecer. Parece paradoxo e, todavia, é a expressão da verdade.
- Contudo - indaguei -, tem você em mira novos planos para os círculos carnais?
- Nem podia ser de outro modo - explicou ele, pressuroso -, necessito enriquecer o patrimônio das experiências e, além disso, minhas dívidas para com o planeta são ainda enormes. Lascínia e eu fundaremos aqui, dentro em breve, nossa casinha de felicidade, crendo que voltaremos à Terra precisamente daqui a uns trinta anos.
Havíamos alcançado as cercanias do Campo da Música. Luzes de indescritível beleza banhavam extenso parque, onde se ostentavam encantamentos de verdadeiro conto de fadas.
Fontes luminosas traçavam quadros surpreendentes: um espetáculo absolutamente novo para mim.
Antes que pudesse manifestar minha profunda admiração, Lisias recomendou bem-humorado:
- Lascínia sempre se faz acompanhar de duas irmãs, às quais, espero faça você as honras de cavalheiro.
- Mas, Lísias. . - respondi, reticencioso, considerando minha antiga posição conjugal - você deve compreender que estou ligado a Zélia.
O enfermeiro amigo, nesse instante, riu a valer, acrescentando:
- Era o que faltava! Ninguém quer ferir seus sentimentos de fidelidade.
Não creio, no entanto, que a união esponsalícia deva trazer o esquecimento da vida social. Não sabe mais ser o irmão de alguém, André?
Ri-me, desconcertado, e nada pude replicar.
Nesse momento, atingimos a faixa de entrada, onde Lísias pagou gentilmente o ingresso.
Notei, ali mesmo, grande grupo de passeantes, em torno de gracioso coreto, onde um corpo orquestral de reduzidas figuras executava música ligeira. Caminhos marginados de flores desenhavam-se à nossa frente, dando acesso ao interior do parque, em várias direções. Observando minha admiração pelas canções que se ouviam, o companheiro explicou:
- Nas extremidades do Campo, temos certas manifestações que atendem ao gosto pessoal de cada grupo dos que ainda não podem entender a arte sublime; mas, no centro, temos a música universal e divina, a arte santificada, por excelência.
Com efeito, depois de atravessarmos alamedas risonhas, onde cada flor parecia possuir seu reinado particular, comecei a ouvir maravilhosa harmonia dominando o céu. Na Terra, há pequenos grupos para o culto da música fina e multidões para a música regional. Ali, contudo, verificava-se o contrário. O centro do campo estava repleto. Eu havia presenciado numerosas agregações de gente, na colônia, extasiara-me ante a reunião que o nosso Ministério consagrara ao Governador, mas o que via agora excedia a tudo que me deslumbrara até então.
A nata de "Nosso Lar" apresentava-se em magnífica forma.
Não era luxo, nem excesso de qualquer natureza, o que proporcionava tanto brilho ao quadro maravilhoso. Era a expressão natural de tudo, a simplicidade confundida com a beleza, a arte pura e a vida sem artifícios. O elemento feminino aparecia na paisagem, revelando extremo apuro de gosto individual, sem desperdício de adornos e sem trair a simplicidade divina.
Grandes árvores, diferentes das que se conhecem na Terra, guarnecem belos recintos, iluminados e acolhedores.
Não somente os pares afetuosos demoravam nas estradas floridas.
Grupos de senhoras e cavalheiros entretinham-se em animada conversação, valiosa e construtiva. Não obstante sentir-me sinceramente humilhado pela minha insignificância ante aquela aglomeração seletíssima, experimentava a mensagem silenciosa, de simpatia, no olhar de quantos me defrontavam.
Ouvia frases soltas, relativamente aos círculos carnais, e, contudo, em nenhuma palestra notei o mais ligeiro laivo de malícia ou de acusação aos homens. Discutia-se o amor, a cultura intelectual, a pesquisa científica, a filosofia edificante, mas todos os comentários tendiam à esfera elevada do auxílio mútuo, sem qualquer atrito de união. Observei que, ali, o mais sábio restringia as vibrações de seu poder intelectual, ao passo que os menos instruídos elevavam, quanto possível, a
capacidade de compreensão para absorver as dádivas do conhecimento superior. Em palestras numerosas, recolhia referências a Jesus e ao Evangelho, e, no entanto, o que mais me impressionava era a nota de alegria reinante em todas as conversações. Ninguém recordava o Mestre com as vibrações negativas da tristeza inútil, ou do injustificável desalento, Jesus era lembrado por todos como supremo orientador das organizações terrenas, visíveis e invisíveis, cheio de compreensão e bondade, mas
também consciente da energia e da vigilância necessárias à preservação da
ordem e da justiça.
Aquela sociedade otimista encantava-me. Diante dos olhos, tinha concretizadas as esperanças de grande número dos pensadores verdadeiramente nobres, na Terra.
Grandemente maravilhado com a música sublime, ouvi Lísias dizer:
- Nossos orientadores, em harmonia, absorvem raios de inspiração nos planos mais altos, e os grandes compositores terrestres são, por vezes, trazidos às esferas como a nossa, onde recebem algumas expressões melódicas, transmitindo-as, por sua vez, aos ouvidos humanos, adornando os temas recebidos com o gênio que possuem. O Universo, André, está cheio de beleza e sublimidade. O facho resplendente e eterno da vida procede originariamente de Deus.
O enfermeiro do Auxilio, todavia, não pôde continuar.
Fôramos defrontados por gracioso grupo. Lascínia e as irmãs haviam chegado e era preciso atender aos imperativos da confraternização.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 25 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



25 – Reconciliação

Amaro não registrou o convite da companheira desencarnada, em forma de palavras ouvidas, mas recebeu-o como silencioso apelo à vida mental.
Dirigiu-se a pequenina copa, pensando em Zulmira, com o insopitável desejo de comunicar-lhe o estranho contentamento de que se via possuído.
Não seria justo envolver a esposa doente na onda de alegria em que se banhava?
Vimos que Odila tremeu um instante, ao lhe observar a súbita felicidade com a perspectiva de restauração do carinho para com a segunda mulher. Compreendi o esforço que a iniciativa lhe reclamava ao coração feminino e, mais uma vez, reconheci que a morte do corpo não exonera o Espírito da obrigação de renovar-se. No
fundo, não podia sentir, de imediato, plena isenção de ciúme, entretanto, aceitava o ideal de sublimação que se lhe implantara no sentimento e não parecia disposta a perder a oportunidade de reajuste.
Anotando-lhe a queda de forças, Clara abeirou-se dela e falou, maternal:
– Prossigamos firmes. Todo bem que fizeres a Zulmira redundará em favor de ti mesma. Não esmoreças. Ajuda-te. A vontade, à procura do bem, realiza milagres em nós mesmos. O sacrifício é o preço da verdadeira felicidade.
O abraço afetuoso da benfeitora infundiu-lhe energias novas.
Os olhos dela brilharam outra vez.
Enlaçada ao marido, impeliu-o docemente ao leito em que a pobre doente repousava.
A enferma, por certo, desde muito perdera o contacto com qualquer manifestação afetiva por parte do companheiro e, assim, ao lhe ver o semblante carinhoso e feliz, exibiu larga nota de espanto.
– Zulmira! – perguntou ele, inclinando-se para o seu rosto ossudo e desconsolado – estás realmente melhor?
– Sim... sim... – suspirou a interpelada, hesitante.
– Escuta! Hoje, amanheci pensando em nós, em nossa felicidade...
Não julgas seja tempo de reagirmos contra o sofrimentoque nos cerca? Preocupo-me por ti, acamada e abatida, desde a morte de Júlio...
Notei que do tórax de Amaro emanava largo fluxo de energia radiante, assim como um jato de raios de luz verde-prateada que envolveram o busto de Zulmira, despertando-lhe emotividade incoercível.
A desventurada senhora começou a chorar, dando-nos a impressão de que os fluidos arremessados sobre ela lhe lavavam o coração.
Clarêncio, calmo, informou:
– Como vemos, a sinceridade dispõe de recursos característicos.
Emite forças que não deixam margem a enganos. O sentimento puro com que Amaro se dirige agora à esposa é fator decisivo para que ela se reerga e se cure.
O ferroviário, auxiliado por Odila, enxugou as lágrimas que corriam copiosas daqueles olhos macerados e tristes e continuou:
– Peço confies em mim! Afinal de contas, somos companheiros um do outro... Como poderei ser feliz sem o teu concurso?
Não nos casamos para chorar...
– Amaro! – exclamou a interlocutora agoniada, conservando ainda os últimos resíduos mentais do complexo de culpa em que se torturava – como te agradeço a alegria desta hora!... Entretanto, a imagem de Júlio não me sai da lembrança... Sinto que o remorso
me persegue. Não fiz tudo o que eu devia para salvar o filhinho que me confiaste!...
– Esqueçamos o passado – asseverou o esposo, decidido –, todos pertencemos a Deus e acredito que a Divina Vontade vive conosco, em toda parte. Indiscutivelmente, Júlio nos faz muita falta, mas não podemos renunciar à vida que o Céu nos concedeu.
É imprescindível lutar, procurando a vitória.
Ligado à mente da primeira esposa, que tudo fazia por ajudálo, prosseguiu com enternecedora inflexão de voz:
– Não olvides que pertencemos aos compromissos morais que assumimos... O carinho do meu caçula significava muitíssimo para o meu coração, contudo, não pode ser mais importante que o nosso amor!... Refaze-te! Vivamos nossa vida!... Temos Evelina e
a nossa felicidade!...
A doente sentou-se, de olhos reanimados e diferentes.
E, enquanto o esposo acomodava-se ao lado dela, vimos Odila, de fisionomia satisfeita, dirigir-se ao quarto da filha.
Instintivamente acompanhamo-la, de modo a assisti-la em qualquer dificuldade. Ela, porém, com inefável surpresa para nós, colocou a destra sobre a fronte da menina, solicitando-lhe a presença.
Findos alguns instantes, Evelina, em Espírito, voltou ao aposento em que seu corpo repousava.
Vendo a mãezinha, correu a abraçá-la.
Fundiram-se ambas num amplexo longo e comovedor, misturando-se as lágrimas.
– Enfim! enfim!... – clamou a jovem maravilhada.
– Minha filha! minha filha!
E, em seguida, a genitora descansou nela os olhos inflamados de esperança, pedindo súplice:
– Evelina, ajuda-nos! Se não nos unirmos sob a luz da compreensão e do trabalho, nossa casa desaparecerá... Teu pai e eu não podemos dispensar-te o concurso. Da saúde e da paz de Zulmira depende a feliz continuação de nossa tarefa... Deus não nos
reúne para a indiferença ou para o egoísmo e sim para o serviço salutar de uns pelos outros!...
– Mãezinha – explicou a jovem extática –, tenho orado, tenho pedido ao seu coração nos auxilie...
– Sim, Evelina, sei que em tua abnegação não te descuidas da prece. Jesus terá recebido teus rogos... Achava-me surda, vitimada pelo ruído destruidor de minha própria incompreensão. Sinto, porém, que minhalma desperta hoje... e vejo que nos compete algo fazer para restaurar o valor de teu pai e a alegria de nossa casa...
– Continuarei orando...
– Não olvides a prece, querida, mas a súplica que não age pode ser uma flor sem perfume. Peçamos o socorro do Senhor, algo realizando para contribuir em seu apostolado divino... Comecemos por refundir a confiança em tua nova mãe. Faze-te melhor para ela... Procura-a, desdobra-te no trabalho de preservação da
tranqüilidade doméstica, a fim de que Zulmira se veja segura de teu afeto e de teu entendimento filial... Uma rosa sobre a mesa, uma vassoura diligente, uma peça de roupa cuidadosamente guardada, uma escova no lugar que lhe compete, são serviços de Jesus, no santuário da família, com os quais devemos valorizar o pensamento
religioso... Não te detenhas tão somente nas boas intenções.
Movimenta-te no trabalho encorajador da harmonia. Sê o anjo do serviço em nossa casinha singela! Zulmira necessita de uma irmã, de uma filha!... Aproveita a oportunidade e faze o melhor!...
Evelina, com indefinível contentamento a iluminar-lhe o rosto, enlaçou a mãezinha com extremada ternura e beijou-a, muitas vezes.
Logo após, passando a obedecer à mensageira, retomou o corpo carnal e acordou deslumbrada.
Tão grande se lhe afigurava a própria ventura que detinha a impressão de estar descendo da esfera celestial.
A imagem de Odila, carinhosa e bela, ocupava-lhe, agora, todo o espelho da mente.
Estendeu as mãos em torno como se ainda pudesse tocar a genitora com os dedos de carne, conservando perfeita lembrança da inolvidável entrevista.
Intensamente feliz, ergueu-se de um salto e vestiu-se.
Finda a higiene rápida, vimos Odila recolhê-la nos braços, conduzindo-a igualmente até Zulmira.
Induzida pela influência materna, passou pela copa e chegou junto da madrasta, oferecendo-lhe pequena bandeja com a leve refeição da manhã.
Amaro e a companheira receberam-na, encantados.
– Meu Deus – disse a doente, sorrindo –, tenho a impressão de que um anjo penetrou nossa casa. Tudo hoje amanheceu contentamento e bom ânimo!...
Evelina alcançou o leito, reuniu os dois cônjuges num só abraço e falou, jubilosa:
– Sonhei com Mãezinha! Vi-a tão nítida, como se ainda estivesse conosco. Afirmou que necessitamos de amor e recomendou seja eu para Zulmira a filha que ela não tem!... Ah! que felicidade!...
Mamãe ouviu minhas preces!
O ferroviário anotou, satisfeito, a informação, guardando, porém, consigo mesmo as recordações da noite para não ferir as suscetibilidades da companheira, e Zulmira, a seu turno, embora lembrasse os repetidos pesadelos que atravessara, sentindo-se
atormentada pelos ciúmes de Odila, abafou as próprias reminiscências, para aderir com toda a alma ao otimismo daquele abençoado momento de paz e renovação.
Fixando a madrasta, com embevecimento, a menina acrescentou:
– Quero ser melhor, mais diligente e mais amiga!... Papai, você e eu seremos doravante mais felizes.
A pobre senhora suspirou reconfortada e aduziu:
– Sem dúvida alguma, Odila deve ser o nosso gênio protetor...
É muita alegria nesta manhã para que a nossa ventura seja simples sonho ou mera coincidência!
Aquele testemunho de gratidão, partido com a melhor espontaneidade da mulher considerada, até então, por inimiga, tocou as recônditas fibras da primeira esposa de Amaro que, incapaz de suportar a emoção, começou a chorar entre o reconhecimento e o regozijo.
Irmã Clara abraçou-a e falou, humilde:
– Chora, minha filha! Chora de júbilo! Em verdade, quando o amor sublime penetra em nosso coração, a luz do Senhor passa a reger os passos de nossa vida.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 24 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



24 – Carinho Reparador

Odila, sob o patrocínio da irmã Clara, foi internada numa instituição de tratamento, por alguns dias, e, durante sete noites consecutivas, visitamos Zulmira, em companhia de nosso orientador, a fim de auxiliar o soerguimento dela.
A segunda esposa de Amaro mostrava-se melhor. Mais silenciosa.
Mais calma. Não saíra, porém, da inércia a que se recolhera.
Alijara a excitação de que se via objeto, mas prosseguia entregue a extrema prostração. Subnutrida, apática, sustentava-se no mais absoluto desânimo.
Atendendo-nos à inquirição habitual, Clarêncio observou, prestimoso:
– Acha-se agora liberta, contudo, reclama estímulo para subtrair-se à exaustão. Falta-lhe a vontade de lutar e viver. Confiemos, no entanto. A própria Odila favorecer-lhe-á a recuperação. A medida que se lhe restaure a visão espiritual, a primeira esposa de Amaro aceitará o imperativo de renúncia e fraternidade para
construir o futuro que lhe interessa.
Zulmira, com efeito, continuava livre e tranqüila. As peças do corpo funcionavam com irrepreensível harmonia, mas, efetivamente, algo prosseguia faltando... A máquina mostrava-se reequilibrada, entretanto, mantinha-se preguiçosa, exigindo adequadas providências.
Transcorrida uma semana, Irmã Clara convidou-nos a breve entendimento. Comunicou-nos que Odila revelava grande transformação.
Submetida à assistência magnética, a fim de sondar o passado, reconhecera o impositivo de sua colaboração com o marido para alcançarem ambos a vitória real nos planos do espírito.
Suspirava pelo reencontro com o filhinho, dispunha-se a tudo fazer para ser útil ao esposo e à filhinha...
E, para tanto, combateria a repulsa espontânea que experimentava por Zulmira, a quem auxiliaria como irmã, reajustando-se devidamente para fortalecê-la e ampará-la.
A benfeitora mostrava-se satisfeita.
Recomendava-nos trouxéssemos Amaro, tão logo pudesse ele ausentar-se do veículo físico, na noite próxima, até à casa espiritual de refazimento em que Odila se encontrava.
Do entendimento entre ambos, resultariam decerto os melhores efeitos.
A mãezinha de Evelina estava reformada e daria provas do reajuste, efetuando o primeiro esforço para a reconciliação.
A solicitação de Clara foi alegremente atendida.
Depois de meia-noite, quando o ferroviário se rendeu à branda influência do sono, guiamo-lo ao sítio indicado.
No aposento claro e florido do santuário de recuperação em que Odila se localizava, aguardava-nos a instrutora junto dela.
O pai de Júlio, que seguia menos consciente ao nosso lado, em reconhecendo a presença da mulher que amava, ajoelhou-se, cobrou a lucidez que lhe era possível em tais circunstâncias, e exclamou, enlevado:
– Odila!... Odila!...
– Amaro! – respondeu a antiga companheira, então completamente transfigurada – sou eu! sou eu quem te pede coragem e fé, serenidade e valor na tarefa a realizar!...
– Estou farto, farto... – clamou ele, agora em lágrimas a lhe verterem, copiosas.
Odila, sustentada pela venerável amiga, levantou-se com alguma dificuldade e, alisando-lhe os cabelos, perguntou, em voz comovida:
– Farto de quê?
– Sinto-me entediado da vida... Casei-me, de novo, como deves saber, acreditando garantir a segurança de nossos filhos para o futuro, entretanto, a mulher que desposei nem de longe chega a teus pés... Fui ludibriado! Em lugar da felicidade, encontrei o desapontamento que não sei disfarçar!...
E, fitando-a com enternecedora expressão, comentou, triste:
– Nosso Júlio morreu num desastre, quando encerrava para mim as melhores aspirações, nossa filha se estiola num quarto sem alegria e a madrasta que lhes impus apodrece num leito!...
Ah! Odila, poderás compreender o que sofro? Tenho rogado a morte ao Céu para que nos reunamos na eternidade, mas a morte não vem...
A esposa, compreensivelmente mais bela pelos pensamentos redentores que agora lhe manavam do ser, com os olhos enevoados de pranto, falou-lhe com inflexão inesquecível:
– Sim, Amaro, compreendo! Também eu padeci muito, no entanto, hoje reconheço que a nossa dor é agravada por nós mesmos...
Porque havemos de converter a distância em rebelião e a saudade em venenoso fel? Porque não reconhecer a Majestade Suprema de Deus, na orientação de nossos destinos? Não temos sabido cultivar o amor que é sacrifício na Terra para a edificação de nosso paraíso espiritual... Temos exigido quando devemos dar, dilacerado quando nos cabe recompor!...
Amaro, é preciso acalmar o coração para que a vida nos auxilie a entendê-la, é indispensável ceder de nós, a fim de receber dos outros o concurso de que necessitamos... Na aspereza de meus sentimentos deseducados, vinha eu adubando o espinheiro do ciúme, atormentando-te o pensamento e perturbando a nossa casa! Mas, em alguns dias rápidos, adquiri mais ampla penetração em nossos problemas, usando a chave da boa vontade!... Quero melhorar-me, progredir, reviver...
O ferroviário contemplou-a, carinhoso e reverente, e acentuou, desalentado:
– Isso não impede a terrível realidade. Achamo-nos em dois mundos diferentes... Infortunado que sou! Sinto-me desarvorado e infeliz!...
– Achava-me igualmente assim; contudo, procurei no silêncio e na oração o roteiro renovador.
– Que fazer de Zulmira, colocada entre nós como empecilho à nossa verdadeira união?
– Não raciocines desse modo! Ela não permaneceria em tua estrada sem motivo justo.
Nesse instante, Clarêncio abeirou-se do ferroviário e, tocando-lhe a fronte com a destra, ofereceu-lhe ao campo mental o retorno imediato às recordações das dívidas por ele contraídas no Paraguai.
Amaro estremeceu e continuou escutando.
– Se Zulmira foi situada no templo de nosso amor – prosseguiu Odila, admiravelmente inspirada –, é que nosso amor lhe deve a bênção da felicidade de que nos sentimos possuídos...
– Sim... sim... – aprovava agora o interlocutor, de posse das reminiscências fragmentárias que lhe assomavam do coração.
– Interpretemo-la por nossa filha, por irmã de Evelina, cujos passos nos compete encaminhar para o bem. O lar não é apenas o domicílio dos corpos... É o ninho das almas, em cujo doce aconchego desenvolvemos as asas que nos transportarão aos cumes da glória eterna. Aceitemos a provação e a dor, como abençoadas instrutoras de nossa romagem para Deus...
– Todavia – ponderou o moço, triste –, sabes quanto te amo!...
– Não ignoras, por tua vez, que o teu coração constitui para mim o tesouro maior da vida, entretanto hoje vejo o horizonte mais largo... Valeria realmente o brilho dos oásis fechados? Serviria a construção de um palácio, em pleno deserto, onde estaríamos humilhando com a nossa saciedade os viajores que passassem por nós, mortificados de sede e fome? Como categorizar o carinho que se pervertesse no isolamento, a pretexto de conservar a ventura só para si?
Renovemo-nos, Amaro! Nunca é tarde para recomeçar o bem!... Trabalhemos, valorizando o tempo e a vida!...
Tocado talvez nas fibras mais íntimas, o pai de Evelina chorava convulsivamente, infundindo piedade... Odila enlaçou-o com mais ternura e Clara convidou-nos a excursão através do grande jardim próximo.
A breves instantes, achávamo-nos em plena contemplação do céu...
Os dois cônjuges instalaram-se em perfumado recanto para a conversação a sós.
Notamos que a orientadora se preocupava em deixá-los entregues um ao outro, para mais seguro ajuste espiritual. E, enquanto ambos se recolhiam a confortadoras confidências, distanciamonos, de algum modo, admirando a beleza da noite.
Maravilhoso, o firmamento cintilava.
Longínquas constelações como que nos acenavam, indicando glorioso futuro...
Virações suaves deslizavam, de leve, quais se fossem cariciosas e intangíveis mãos do vento, animando-nos a cabeça.
Flores de rara beleza vertiam do cálice raios de claridade diurna, como pequeninos e graciosos reservatórios do esplendor solar.
Irmã Clara fascinava-nos com a sua palavra brilhante. Com simplicidade encantadora, comentava suas viagens a outras esferas de trabalho e realização, exaltando em cada narrativa o amor e a sabedoria do Pai Celestial.
Por largo tempo, embevecidos, permutamos impressões acerca da excelsitude da vida que se nos revela sempre mais surpreendente e mais bela, em cada plano da Criação.
Avizinhava-se o novo dia...
Tornamos à presença do casal para devolver o companheiro ao lar terrestre. Ambos, ao término do grande entendimento, apresentavam o rosto pacificado e radiante.
Irmã Clara guardou a pupila nos braços e as duas seguiramnos a romagem de volta.
Em casa, Amaro despediu-se de nós, risonho e calmo.
Dispúnhamo-nos à retirada, quando a instrutora nos advertiu:
– Esperemos. Odila retomará hoje a tarefa.
O relógio marcava seis da manhã.
À maneira de colegial em dia de prova, a transfigurada mãezinha de Júlio fitava-nos com extrema expectação...
Amaro recuperou o corpo físico, descerrando os olhos com excelentes disposições.
Não conseguira relacionar os aspectos particulares da excursão, mas conservava no cérebro a indefinível certeza de que estivera com a primeira esposa em “algum lugar” e que a vira reanimada e feliz.
Distendeu os braços com a deliciosa tranqüilidade de quem encontra o fim de longa e aflitiva tensão nervosa.
Levantou-se, reparando que o dia começava alegre e lindo, sem dar conta de que a alegria e a beleza haviam renascido nele próprio.
Sentia vontade de rir e cantar...
E, depois de ausentar-se do banheiro, onde cantarolou baixinho uma canção que lhe recordava o tempo em que se consorciara pela primeira vez, tornou, sorridente, ao quarto de dormir.
Foi então que Odila o enlaçou carinhosamente e exclamou:
– Vamos, querido! Estendamos a nossa felicidade! Zulmira espera por nosso amor...

sábado, 11 de setembro de 2010

SEMANA - ESTUDO DO EVANGELHO CAPÍTULO 14 ÍTENS 1 A 3 - MARIA J. CAMPOS



FONTE BÁSICA

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

HONRAI A VOSSO PAI E A VOSSA MÃE

Piedade Filial

1. Qual o verdadeiro sentido do mandamento “Honrai a vosso pai e a vossa mãe?
Ele encerra toda a obrigação dos filhos perante os pais, traduzida pelo amor, respeito, atenção, submissão e condescendência com eles. É o dever da piedade filial.

Honrar pai e mãe é respeitá-los, assisti-los na necessidade, proporcionar-lhes repouso na velhice e cercá-los de todos os cuidados.

2. O que devemos entender por “piedade filial”?
É a obrigação incondicional que temos, perante nossos pais, de cumprir para com eles os deveres impostos pela lei de caridade e amor, de modo mais rigoroso que o demonstrado ao próximo em geral.

“O termo “honrai” encerra um dever a mais para com eles; o da piedade filial.”

3. Pais são apenas os que geram o corpo?
Não necessariamente. Os que fazem às vezes de pais estão aqui incluídos, com mais forte razão até, por expressar uma dedicação oriunda, muitas vezes, da prática da caridade desinteressada e do amor ao próximo.

“Esse dever se estende naturalmente às pessoas que fazem as vezes de pai e de mãe, as quais tanto maior mérito têm, quanto menos obrigatório é para elas o devotamento.”

4. Que razão nos leva a cumprir os deveres que abarcam a piedade filial?
Nossos pais são nossos irmãos a quem Deus nos confiou, nesta existência terrena, como responsáveis importantes pela nossa atual fase evolutiva.

A família é um cadinho de purificação onde aprendemos a legítima fraternidade.

5. Qual o nosso dever para com os pais pobres?
Para com esses é que se demonstra a verdadeira piedade filial. Devemos dar tudo o que há de melhor e mais confortável, além das atenções e dos cuidados amáveis.

Aos pais pobres, os filhos não só devem o estritamente necessário, mas também os pequenos nada supérfluos, as solicitudes e os cuidados amáveis.

6. O que ocorre com o mau filho, isto é, aquele que não cumpre os deveres da piedade filial, esquecendo os que o amparam em sua infância?
Será punido com a ingratidão e o abandono; será ferido nas suas mais caras afeições, algumas vezes já na existência atual, mas, com certeza, noutra, em que sofrerá o que houver feito aos outros.

Não compete aos filhos censurar os pais, porque talvez hajam merecido que estes sejam quais se mostram.

7. E os maus pais, que descuidam dos deveres que a sua condição impõe com relação aos filhos, como ficam?
Cada qual deve cumprir o seu papel. O do filho é honrar os pais, sempre, em qualquer circunstância. Quanto a esses pais, compete a Deus julgá-los e puni-los.

Alguns pais descuidam de seus deveres e não são o que deviam ser; mas a Deus é que compete puni-los, e não a seus filhos.

Conclusão:

A piedade filial encerra todo o dever dos filhos em relação aos pais e se exprime pelo amor, respeito, amparo, obediência e tolerância para com eles, independente de terem ou não cumprido os seus deveres, como pais.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 23 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



23 – Apelo Maternal

A paisagem doméstica, na residência de Amaro, não mostrava qualquer alteração.
Zulmira, atormentada por Odila, que realmente lhe vampirizava as forças, jazia no leito, apática e desolada, como estátua viva de angústia e medo escutando o vento que zunia, lá fora...
Mais magra e mais abatida, exibia comovedoramente a própria exaustão.
Irmã Clara, depois de expressivo entendimento com o nosso orientador, solicitou que nos mantivéssemos a pequena distância, e, abeirando-se da genitora de Evelina, que tanto quanto a enferma não nos percebia a presença, alongou os braços em prece. Sob forte emoção, acompanhei o formoso quadro que se desdobrou, divino, ao nosso olhar.
Gradativamente, o recinto foi invadido por vasto círculo de luz, do qual se fizera a instrutora o núcleo irradiante. Assemelhava-se nossa amiga a uma estrela repentinamente trazida à Terra, com os dois braços distendidos em forma de asas, prestes a desferir excelso vôo...
Cercava-a enorme halo de dourado esplendor, como se ouro eterizado e luminescente lhe emoldurasse a forma leve e sublime...
Dos revérberos dessa natureza, passavam as irradiações a tonalidades diferentes, em círculos fechados sobre si mesmos, caminhando dos reflexos de ouro e opala ao róseo vivo, do róseo vivo ao azul celeste, do azul celeste ao verde claro e do verde
claro ao violeta suave, que se transfundia em outros aspectos a me escaparem da apreciação...
Tive a idéia de que a irmã Clara se convertera no centro de milagroso arco-íris, cuja existência nunca pudera vislumbrar.
Fizera-se a casa excessivamente estreita para aquela abençoada fonte de raios balsamizantes e indefiníveis.
Reparei que a própria Odila se aquietara como que dominada por branda coação.
Extático, mal consegui articular alguns monossílabos, procurando esclarecimento em nosso instrutor.
– Irmã Clara – informou o Ministro, igualmente enlevado – já atingiu o total equilíbrio dos centros de força que irradiam ondulações luminosas e distintas. Em oração, ao influxo da mente enaltecida, emite as vibrações do seu sentimento purificado, que constituem projeções de harmonia e beleza a lhe fluírem do ser.
Se partilhássemos com ela a mesma posição evolutiva, entraríamos agora em relação imediata com o elevado plano de consciência em que se exterioriza e, então, em vez de somente observarmos este deslumbramento de luz e cor, perceberíamos a mensagem
glorificada que lhe nasce do coração, de vez que as irradiações sob nossos olhos são música e linguagem, sabedoria e amor do pensamento a expressar-se maravilhoso e vivo... A sintonia espiritual perfeita, porém, só é possível entre aqueles que se confundem na afinidade completa...
A mensageira transfigurada parecia mais bela.
Avançou para a primeira esposa de Amaro e cobriu-lhe os olhos com a destra lirial.
– Reparem – disse Clarêncio, feliz –: ela guarda o poder de ampliar a visão. Odila identificar-lhe-á a presença, assim como a vemos.
Com efeito, vimos que a genitora de Evelina, tocada por aqueles dedos celestes, proferiu um grito de encantamento selvagem e caiu de joelhos.
Naturalmente ofuscada pelo brilho de que se envolvia a visitante inesperada, começou a chorar, suplicando:
– Anjo de Deus, socorre-me! socorre-me!...
– Odila, que fazes? – interrogou a emissária com inesquecível inflexão de ternura.
– Estou aqui, vingando-me por amor...
– Haverá, porém, algum ponto de contacto entre amor e vingança?
Indicando timidamente a triste companheira que jazia acorrentada ao leito, Odila tentou conservar a atitude que lhe era característica, exclamando, cruel:
– Devo alijar a intrusa que me assaltou a casa! Esta miserável mulher tomou-me o marido e assassinou-me o filhinho!... Quem ama faz justiça pelas próprias mãos!...
– Pobre filha! – revidou Clara, abraçando-a. Quem ama semeia a vida e a alegria, combatendo o sofrimento e a morte...
Quando nosso culto afetivo se converte em flagelação para os que seguem ao nosso lado, não abrigamos outro sentimento que não seja aquele do desvairado apego a nós mesmos, na centralização do egoísmo aviltante. Achamo-nos à frente de infortunada irmã, arrojada a dolorosa prova. Não te dói vê-la derrotada e infeliz?
– Ela desposou o homem que amo!... – soluçou Odila, mais dominada pela influência magnética da mensageira que impressionada por suas belas palavras.
– Não seria mais justo – ponderou Clara sem afetação – considerar que ele a desposou?
E, acariciando-lhe a cabeça agora trêmula, a instrutora aduziu:
– “Odila, o ciúme que não destruímos, enquanto dispomos da oportunidade de trabalhar no corpo denso, transforma-se em aflitiva fogueira a calcinar-nos o coração, depois da morte.
“Acalma-te! A mulher de carne, que eras, precisa agora oferecer lugar à mulher de luz que deves ser. A porta do lar terrestre, onde te supunhas rainha de pequeno império sem fira, cerrou-se com os teus olhos materiais! A passagem na Terra é um dia na escola... Todos os bens que desfrutávamos no mundo de onde viemos constituíam recursos do Senhor que no-los concedia a título precário. Por lá, raramente nos lembramos de que o tesouro do carinho doméstico é algo semelhante a sementeira preciosa, cujos valores devemos estender...
“Começamos a obra de amor no lar, mas é necessário desenvolvê-la no rumo da Humanidade inteira. Temos um só Pai que é o Senhor da Bondade Infinita, que nos centraliza as esperanças...
“Somos, assim, todos irmãos, partes integrantes de uma família só... Já te imaginaste no lugar de Zulmira, experimentando-lhe as dificuldades e aflições? Já te colocaste na condição do esposo que asseveras amar? Se te visses no mundo, sem a companhia dele, com os filhinhos necessitados de consolo e sustentação, não
sentirias reconhecimento por alguém que te auxiliasse a protegêlos?
“Consideras somente os teus problemas... Entretanto, o homem amado permanece no cárcere de escuros padecimentos íntimos a debater-se com enigmas inquietantes, sem que te disponhas a socorrê-lo...”
– Não me fales assim! – imprecou a interpelada, com evidentes sinais de angústia – Odeio a infame que nos roubou a felicidade...
– Odila, reflete! Esqueces-te de que a mulher sempre é mãe?
O túmulo não te restituirá o corpo que a Terra consumiu e, se desejas recuperar a ternura e a confiança do companheiro que deixaste na retaguarda, é preciso saber amá-lo com o espírito.
Modifica os impulsos do coração! Não suponhas Amaro capaz de querer-te, transtornada qual te encontras, entre as farpas envenenadas do despeito, caso chegasse, de repente, até nós...
– Ela, porém, matou meu filho!...
– Como podes provar semelhante acusação?
– A intrusa invejava-lhe a posição no carinho de Amaro.
– Sim – concordou Clara, afetuosa –, admito que Zulmira assim se conduzisse. É inexperiente ainda e a ignorância enquanto nos demoramos na Terra pode impedir-nos a visão, mas não seria justo, tão somente por isso, atribuir-lhe a morte do pequenino...
Medita! A verdadeira fraternidade ajudar-te-á a sentir naquela que te sucedeu no lar uma filha suscetível de recolher-te o afeto e a orientação... Em lugar de forjares uma inimiga na sinistra bigorna da crueldade, edificarás uma dedicação nobre e leal para enriquecer-te a vida. Retirando a luz do teu amor das chamas comburentes
do inferno de ciúme em que padeces pela própria vontade, serás realmente para o homem querido e para a filha que clama por tua assistência uma inspiração e uma bênção!...
Talvez porque Odila, quase vencida, simplesmente chorasse, a mensageira afagava-lhe os cabelos, acrescentando:
– Sei que sofres igualmente como mãe atormentada... Recorda, contudo, que nossos filhos pertencem a Deus... E se a morte colheu a criança que estremeces, separando-a dos braços paternais, é que a Vontade Divina determinou o afastamento...
A mensageira amimava-lhe a fronte, dando-nos a impressão de que a submetia a suaves operações magnéticas.
Depois de alguns instantes em que apenas ouvíamos os soluços de Odila transformada, a venerável amiga acentuou:
– Porque não te dispões a clarear o próprio caminho, a fim de reencontrares o teu anjo e embalá-lo, de novo, em teus braços, ao invés de te consagrares inutilmente à vingança que te cega os olhos e enregela o coração?
Clara, certo, alcançara o ponto sensível daquela alma atribulada, porque a infortunada genitora de Evelina, qual se arrojasse para fora de si mesma todos os pesares que lhe senhoreavam os sentimentos, gritou, como fera jugulada pela dor:
– Meu filho!... Meu filho!...
E seu pranto convulsivo se fez mais angustiado, mais comovente.
A emissária do bem abraçou-a com maternal carícia e falou-lhe aos ouvidos:
– Rejubila-te, irmã querida! Grande é a tua felicidade! Podes ajudar e isso representa a ventura maior! Nada te impede auxiliar o companheiro da humana experiência, ao alcance de tuas mãos, e basta uma prece de amor puro, com o testemunho de tua compreensão e de tua piedade, para que venças a reduzida distância entre o teu sofrimento e o filhinho idolatrado!... Há vinte e dois séculos
espero por um minuto igual a este para o meu saudoso e agoniado coração, de vez que os meus amados ainda não se inclinaram para mim!
A voz de Clara parecia mesclada de lágrimas que não chegavam a surgir.
Dominada pelas vibrações da mensageira celeste, Odila agarrou-se a ela, prosseguindo em choro convulso, enquanto a instrutora repetia com desvelos de mãe:
– Vamos, filha! Vamos à procura de nossa renovação com Jesus!...
Amparando-a, Clara conduziu-a para fora, colada ao próprio peito.
Junto de nós, Clarêncio informou:
– Agora, Zulmira poderá recuperar-se. A adversária retirou-se sem a violência que lhe prejudicaria o campo mental.
E, acompanhando o nosso orientador, afastamo-nos por nossa vez, embora conservando a atenção presa à continuação de nossa edificante aventura.

domingo, 5 de setembro de 2010

SEMANA - ESTUDO DO EVANGELHO CAPÍTULO 13 ÍTEM 19 A - MARIA J. CAMPOS



FONTE BÁSICA

KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.

NÃO SAIBA A VOSSA MÃO ESQUERDA O QUE DÊ A VOSSA MÃO DIREITA

Beneficência Exclusiva

1. O que se entende por “beneficência”?
“Fazer aos outros o que desejamos nos seja feito”.

2. E por “beneficência exclusiva”, o que devemos entender?
A prática do bem dentro dos círculos restritos, ou seja, entre grupos de pessoas da mesma opinião, da mesma crença ou do mesmo partido:

“E se fizerdes bem aos que vos fazem bem, que recompensas tereis?
Também os pecadores fazem o mesmo”.



3. O que Jesus nos ensina, em relação à beneficência?

Em toda a sua vida terrena, Jesus nos ensinou, com o próprio exemplo, a beneficiar sempre os necessitados tanto de ajuda moral como material e, principalmente, os mais aflitos e miseráveis, fossem eles pessoas estranhas, amigos ou inimigos.

“A justiça faz-nos sentir que o supérfluo de nossa casa é o necessário que falta ao vizinho; que o irmão ignorante, tombado no erro, é alguém que nos pede os braços e que a aflição alheia amanhã poderá ser nossa”.

4. Tem algum valor a beneficência praticada entre pessoas afins, que se querem bem?
Tem. No entanto, em termos de elevação espiritual, pouco acrescenta, uma vez que não há doação, esforço de fraternidade.

Maior mérito existe em fazer o bem àqueles que nos insultam e caluniam, do que a quem nos ama.

5. Devemos auxiliar quem professa uma crença diferente da nossa?
Sim. Principalmente esse merece nossa melhor atenção, respeito e benefício.

“Obedeceria o cristão, porventura, ao preceito de Jesus Cristo, se repelisse o desgraçado por professar uma crença diferente da sua? Socorra-o, portanto, sem lhe pedir contas à consciência. .”

6. Por que a beneficência deve ser estendida para além dos grupos?
Porque é exercício de fraternidade para o nosso espírito, que vai se fortalecendo na medida em que rompe as barreiras do orgulho e do egoísmo.

“(...) precisamente o espírito de seita e de partido é que precisa ser abolido, visto que são irmãos todos os homens.”

7. Quando poderemos ser considerados discípulos de Jesus?
Quando nos amarmos uns aos outros, indistintamente.

“Nisto conhecereis que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros.”

Conclusão:

Amar e beneficiar exclusivamente aos que nos amam é dever. Amar o próximo é considerar todos os homens como nossos irmãos e estender-lhes os benefícios que estiverem a nosso alcance, sem escolher o objeto da nossa atenção nem esperar qualquer forma de retribuição.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

ESTUDO DO LIVRO NOSSO LAR - CAPÍTULO 44 - JULIANA SOLARE



As Trevas

Enriquecendo as alegrias da reunião, Lísias deu-me a conhecer novos valores da sua cultura e sensibilidade. Dedilhando com maestria as cordas da cítara, fez-nos lembrar velhas canções e melodias da Terra.
Dia verdadeiramente maravilhoso! Sucediam-se júbilos espirituais, como se estivéssemos em pleno paraíso.
Quando me vi a sós com o bondoso enfermeiro do Auxílio, procurei transmitir-lhe minhas sublimes impressões.
- Não tenha dúvida disse, sorrindo , quando nos reunimos àqueles a quem amamos, ocorre algo de confortador e construtivo em nosso íntimo. É o alimento do amor, André. Quando numerosas almas se congregam no círculo de tal ou qual atividade, seus pensamentos se entrelaçam, formando núcleos de força viva, através dos quais cada um recebe seu quinhão de alegria ou sofrimento, da vibração geral. É por essa razão que, no planeta, o problema do ambiente é sempre fator ponderável no caminho de cada homem. Cada criatura viverá daquilo que cultiva. Quem se oferece diariamente à tristeza, nela se movimentará; quem enaltece a enfermidade, sofrer-lhe-á o dano.
Observando-me a estranheza, concluiu:
- Não há nisto mistério. É lei da vida, tanto nos esforços do bem, como nos movimentos do mal. Das reuniões de fraternidade, de esperança, de amor e de alegria, sairemos com a fraternidade, a esperança, o amor e a alegria de todos; mas, de toda assembléia de tendências inferiores, em que predominam o egoísmo, a vaidade ou o crime, sairemos envenenados com as vibrações destrutivas desses sentimentos.
- Tem razão - exclamei, comovido -; vejo nisso, igualmente, os princípios que regem a vida nos lares humanos. Quando há compreensão recíproca, vivemos na antecâmara da ventura celeste, e, se permanecemos em desentendimento e maldade, temos o inferno vivo.
Lísias teve uma expressão de bom humor, confirmando a sorrir.
Foi, então, que me lembrei de interpelá-lo sobre uma coisa que, de algumas horas, me torturava a mente. Referira-se o Governador, quando nos dirigiu a palavra, aos círculos da Terra, do Umbral e das Trevas, mas, francamente, não tinha eu, até então, qualquer notícia deste último plano.
Não seria região trevosa o próprio Umbral, onde vivera, por minha vez, em sombras densas, durante anos consecutivos? Não via, nas Câmaras, numerosos desequilibrados e doentes de toda espécie, procedentes das zonas umbralinas? Recordando que Lísias me dera esclarecimentos tão valiosos da minha própria situação, no início da minha experiência em "Nosso Lar", confiei-lhe minhas dúvidas íntimas, expondo-lhe a
perplexidade em que me encontrava.
Ele esboçou uma fisionomia bastante significativa, e falou:
- Chamamos Trevas às regiões mais inferiores que conhecemos.
Considere as criaturas como itinerantes da vida. Alguns poucos seguem resolutos, visando ao objetivo essencial da jornada. São os espíritos nobilíssimos, que descobriram a essência divina em si mesmos, marchando para o alvo sublime, sem vacilações. A maioria, no entanto, estaciona.
Temos então a multidão de almas que demoram séculos e séculos, recapitulando experiências. Os primeiros seguem por linhas retas. Os segundos caminham descrevendo grandes curvas. Nessa movimentação, repetindo marchas e refazendo velhos esforços, ficam à mercê de inúmeras vicissitudes. Assim é que muitos costumam perder-se em plena floresta da vida, perturbados no labirinto que tracejam para os próprios pés.
Classificam-se, aí, os milhões de seres que perambulam no Umbral. Outros,
preferindo caminhar às escuras, pela preocupação egoística que os absorve, costumam cair em precipícios, estacionando no fundo do abismo por tempo indeterminado. Compreendeu?
As elucidações não poderiam ser mais claras.
Sensibilizado, porém, com a extensão e complexidade do assunto, ponderei:
- Entretanto, que me diz dessas quedas? Verificam-se apenas na Terra? Somente os encarnados são suscetíveis de precipitação no despenhadeiro?
Lísias pensou um minuto e respondeu:
- Sua observação é oportuna. Em qualquer lugar, o espírito pode precipitar-se nas furnas do mal, salientando-se, porém, que nas esferas superiores as defesas são mais fortes, imprimindo-se, conseqüentemente, mais intensidade de culpa na falta cometida.
- Entretanto - objetei -, a queda sempre me pareceu impossível nas regiões estranhas ao corpo terreno. O ambiente divino, o conhecimento da verdade, o auxílio superior figuravam-se-me antídotos infalíveis ao veneno da vaidade e da tentação.
O companheiro sorriu e esclareceu:
- O problema da tentação é mais complexo. As paisagens do planeta terrestre estão cheias de ambiente divino, conhecimento da verdade e auxílio superior. Não são poucos os que compartem, ali, de batalhas destruidoras entre as árvores acolhedoras e os campos primaveris; muitos cometem homicídios ao luar, insensíveis à profunda sugestão das estrelas; outros exploram os mais fracos, ouvindo elevadas revelações da verdade superior. Não faltam, na Terra, paisagens e expressões essencialmente
divinas.
As palavras do enfermeiro calavam-me fundo no espírito. De fato, em geral, os guerreiros estimam a destruição na primavera e no estio, quando a Natureza estende no solo e no firmamento maravilhas de cor, perfume e luz; os latrocínios e homicídios são praticados, de preferência, à noite, quando a Lua e as estrelas enchem o planeta de poesia divina. A maioria dos verdugos da Humanidade constitui-se de homens eminentemente cultos, que desprezam a inspiração divina. Renovando minha concepção referente à queda espiritual, acrescentei:
- Contudo, Lísias, poderá você dar-me uma idéia da localização dessa zona de Trevas? Se o Umbral está ligado à mente humana, onde ficará semelhante lugar de sofrimento e pavor?
- Há esferas de vida em toda parte - disse ele, solícito -, o vácuo sempre há de ser mera imagem literária. Em tudo há energias viventes e cada espécie de seres funciona em determinada zona da vida.
Depois de pequeno intervalo, em que me pareceu meditar profundamente, continuou:
- Naturalmente, como aconteceu a nós outros, você situou como região de existência, além da morte do corpo, apenas os círculos a se iniciarem da superfície do globo para cima, esquecido do nível para baixo. A vida, contudo, palpita na profundeza dos mares e no âmago da terra. Além disso, há princípios de gravitação para o espírito, como se dá com os corpos materiais. A Terra não é somente o campo que podemos ferir ou menosprezar, a nosso bel-prazer. É organização viva, possuidora de certas leis que nos escravizarão ou libertarão, segundo nossas obras. É claro que a alma esmagada de culpas não poderá subir à tona do lago maravilhoso da vida. Resumindo, devo lembrar que as aves livres ascendem às alturas; as que se embaraçam no cipoal sentem-se tolhidas no vôo, e as que se prendem a peso considerável são meras escravas do desconhecido.
Percebe?
Lísias, porém, não precisaria fazer-me esta pergunta. Avaliei, de pronto, o quadro imenso de lutas purificadoras, a desenhar-se ante meus olhos espirituais, nas zonas mais baixas da existência.
Como alguém que precisa ponderar bastante, para exprimir-se, o companheiro pensou, pensou... e concluiu:
- Qual acontece a nós outros, que trazemos em nosso íntimo o superior e o inferior, também o planeta traz em si expressões altas e baixas, com que corrige o culpado e dá passagem ao triunfador para a vida eterna.
Você sabe, como médico humano, que há elementos no cérebro do homem que lhe presidem o senso diretivo. Hoje, porém, reconhece que esses elementos não são propriamente físicos e sim espirituais, na essência.
Quem estime viver exclusivamente nas sombras, embotará o sentido divino da direção. Não será demais, portanto, que se precipite nas Trevas, porque o abismo atrai o abismo e cada um de nós chegará ao local para onde esteja dirigindo os próprios passos.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 22 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



22 – Irmã Clara

Na noite imediata às experiências que descrevemos, o Ministro convidou-nos a visitar a Irmã Clara, a quem pediria socorro em favor do esclarecimento de Odila.
Eu me sentia cada vez mais atraído para o romance vivo daquele grupo de almas que o destino enleara em suas teias.
Se me fosse permitido, voltaria de imediato para junto de Mário Silva rebelado, ou para junto de Amaro paciente, a fim de observar o desdobramento da história, cujos capítulos jaziam gravados nas páginas vivas de seus corações.
Todavia, era necessário esperar.
Enquanto buscávamos a intimidade de Clara, descia o luar em prateados jorros sobre a paisagem que se tapizava de flores.
Com o cérebro preso às preocupações resultantes do trabalho que nos exigia a atenção, algo indaguei de Clarêncio quanto à cooperação que pretendíamos solicitar.
Por que motivo rogaria ele o concurso de outrem, quando se dirigira com tanto êxito à mente de Esteves e Armando, reencarnados?
Não lhes favorecera o retrocesso da memória, até os recuados dias da luta no Paraguai? Porque não conseguiria doutrinar também a desditosa irmã enferma?
O Ministro ouviu-me, tolerante, e redargüiu:
– Iludes-te. Nem sempre doutrinar será transformar. Efetivamente, guardo alguma força magnética suficientemente desenvolvida, capaz de operar sobre a mente de nossos companheiros em recuperação; no entanto, ainda não disponho de sentimento sublimado, suscetível de garantir a renovação da alma. Sem dúvida, dentro de minhas limitações, estou habilitado a falar à inteligência, mas não me sinto à altura de redimir corações. Para esse fim, para decifrar os complicados labirintos do sofrimento moral, é imprescindível haver atingido mais elevados degraus na humana compreensão.
Dispunha-me a desfechar novo interrogatório, contudo, nosso orientador indicou-nos bela edificação próxima.
Cercada de arvoredo, que servia de enfeite a espaçosos canteiros de flores, a residência de Clara figurou-se-nos pequeno colégio ou gracioso internato para moças.
Até certo ponto, não nos enganáramos.
A nossa anfitriã não morava num estabelecimento de ensino, entretanto, mantinha em casa um verdadeiro educandário, tão grandes e luzidas eram as assembléias instrutivas que sabia organizar.
Recebeu-nos em extenso salão, onde era atenciosamente ouvida por quatro dezenas de alunos de variadas condições, que se instalavam à vontade, em grupos diversos, sem qualquer idéia de escola assinalando o ambiente em sua feição exterior.
De olhos rasgados e lúcidos a lhe marcarem magnificamente o semblante com os traços aristocráticos do rosto emoldurados pela basta cabeleira, Clara parecia uma jovem madona, detida entre os melhores dons da mocidade e da madureza. Estendeu-nos
as mãos pequenas e finas, respondendo-nos às saudações com alegria sincera.
Nosso orientador rogou escusas, pela nossa interferência no trabalho.
– Não se incomodem – acentuou a interlocutora, encantadoramente natural –, achamo-nos num curso rápido, acerca da importância da voz a serviço da palavra. Podem partilhá-lo conosco.
Nossa aula é uma simples conversação...
Fitando bondosamente o Ministro, rematou:
– Sentem-se. Sou eu quem pede perdão por fazê-los esperar mais um pouco. Em breves instantes, todavia, entraremos em nosso entendimento mais íntimo.
E, voltando à poltrona que nada tinha de cátedra, sem qualquer atitude professoral, tão grande era o doce ambiente de maternidade que sabia irradiar de si, começou a dizer para os aprendizes:
– Conforme estudamos na noite de hoje, a palavra, qualquer que ela seja, surge invariavelmente dotada de energias elétricas específicas, libertando raios de natureza dinâmica. A mente, como não ignoramos, é o incessante gerador de força, através dos fios positivos e negativos do sentimento e do pensamento, produzindo
o verbo que é sempre uma descarga eletromagnética, regulada pela voz. Por isso mesmo, em todos os nossos campos de atividade, a voz nos tonaliza a exteriorização, reclamando apuro de vida interior, de vez que a palavra, depois do impulso mental, vive na base da criação; é por ela que os homens se aproximam e se ajustam para o serviço que lhes compete e, pela voz, o trabalho pode ser favorecido ou retardado, no espaço e no tempo.
Dentro da pausa ligeira que se fizera espontânea, simpática senhora interrogou:
– Mas, para que tenhamos a solução do problema, é indispensável jamais nos encolerizarmos?
– Sim – elucidou a instrutora, calma –, indiscutivelmente, a cólera não aproveita a ninguém, não passa de perigoso curtocircuito de nossas forças mentais, por defeito na instalação de nosso mundo emotivo, arremessando raios destruidores, ao redor
de nossos passos...
Sorrindo bem humorada, acrescentou:
– Em tais ocasiões, se não encontramos, junto de nós, alguém com o material isolante da oração ou da paciência, o súbito desequilíbrio de nossas energias estabelece os mais altos prejuízos à nossa vida, porque os pensamentos desvairados, em se interiorizando, provocam a temporária cegueira de nossa mente, arrojando-a em sensações de remoto pretérito, nas quais como que descemos quase sem perceber a infelizes experiências da animalidade inferior. A cólera, segundo reconhecemos, não pode e nem deve comparecer em nossas observações, relativas à voz. A criatura
enfurecida é um dínamo em descontrole, cujo contacto pode gerar as mais estranhas perturbações.
Um moço, com evidente interesse nas lições, argumentou:
– E se substituíssemos o termo “cólera” pelo termo “indignação”?
Irmã Clara pensou alguns instantes e redarguiu:
– Efetivamente, não poderíamos completar os nossos apontamentos, sem analisar a indignação como estado d'alma, por vezes necessário. Naturalmente é imprescindível fugir aos excessos.
Contrariar-se alguém a propósito de bagatelas e a todos os instantes do dia será baratear os dons da vida, desperdiçando-os, de modo inconsequente, sem o mínimo proveito para si mesmo ou para os outros. Imaginemos a indignação por subida de tensão na usina de nossos recursos orgânicos, criando efeitos especiais à
eficiência de nossas tarefas. Nos casos de exceção, em que semelhante diferença de potencial ocorre em nossa vida íntima, não podemos esquecer o controle da inflexão vocal.
Assim como a administração da energia elétrica reclama atenção para a voltagem, precisamos vigiar a nossa indignação principalmente quando seja imperioso vertê-la através da palavra, carregando a nossa voz tão somente com a força suscetível de ser aproveitada por aqueles a quem endereçamos a carga de nossos sentimentos. É indispensável modular a expressão da frase, como se gradua a emissão
elétrica...
E, ante a assembléia que lhe registrava os ensinamentos com justificável respeito, prosseguiu, depois de ligeiro intervalo:
– Nossa vida pode ser comparada a grande curso educativo, em cujas classes inumeráveis damos e recebemos, ajudamos e somos ajudados. A serenidade, em todas as circunstâncias, será sempre a nossa melhor conselheira, mas, em alguns aspectos de
nossa luta, a indignação é necessária para marcar a nossa repulsa contra os atos deliberados de rebelião ante as Leis do Senhor.
Essa elevada tensão de espírito, porém, nunca deve arrojar-se à violência e jamais deve perder a dignidade de que fomos investidos, recebendo da Divina Confiança a graça do conhecimento superior. Basta, dentro dela, a nossa abstenção dos atos que intimamente reprovamos, porque a nossa atitude é uma corrente de indução magnética. Em torno de nós, quem simpatiza conosco geralmente faz aquilo que nos vê fazer. Nosso exemplo, em razão disso, é um fulcro de atração. Precisamos, assim, de muita cautela com a palavra, nos momentos de tensão alta do nosso mundo emotivo, a fim de que a nossa voz não se desmande em gritos selvagens ou em considerações cruéis que não passam de choques mortíferos que infligimos aos outros, semeando espinheiros de
antipatia e revolta que nos prejudicarão a própria tarefa.
Um amigo que acompanhava os ensinamentos, com interesse invulgar, perguntou, respeitoso:
– Irmã Clara, como devemos interpretar as perturbações da voz, como, por exemplo, a gaguez e a diplofonia?
– Sem dúvida – informou a instrutora, solícita –, os órgãos vocais experimentam igualmente lutas e provações quando reclamam reajuste. Por intermédio da voz, praticamos vários delitos de tirania mental e, através dela, nos cabe reparar os débitos contraídos.
As enfermidades dessa ordem compelem-nos ao trabalho de recuperação no silêncio, de vez que, sofrendo a alheia observação, aprendemos pouco a pouco a governar os próprios impulsos, afeiçoando-os ao bem.
A orientadora, que falava com absoluta simplicidade e à maneira de um anjo maternal dirigindo-se aos filhinhos, comentou, ainda por alguns minutos, o tema singular com surpreendente primor de definição.
Depois, finda a aula, permaneceram no belo domicílio tão somente algumas jovens que encontravam em nossa anfitriã desvelada benfeitora.
Clara convidou-nos a pequena peça contígua e o Ministro deu-lhe a conhecer o objetivo de nossa visitação. Alguém na Terra precisava ouvi-la, a fim de modificar-se. A interlocutora perguntou, com carinho, quanto às particularidades do serviço que pretendíamos realizar.
Clarêncio resumiu o drama que nos empolgava a atenção.
Quando se inteirou de que amargurada mulher devia renunciar ao companheiro que permanecia na Terra, vimos imensa compaixão se lhe estampar no rosto. Seus olhos enevoaram-se de lágrimas que não chegaram a cair...
Compreendi que a nobre instrutora, aureolada de soberanos valores morais, trazia consigo profundas mágoas imanifestas.
Certamente, buscávamos reconforto para um coração infeliz num coração que talvez estivesse padecendo ainda mais...
– Pobre criatura! – disse a orientadora, comovida.
E, afirmando-se com tempo bastante para ausentar-se, acolheu-nos o apelo e dispôs-se a seguir-nos generosamente.