quinta-feira, 18 de março de 2010

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 3 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



3 - OBSESSÃO


Penetramos o mais espaçoso aposento da casa, onde uma senhora de aspecto juvenil repousava abatida e insone.
Moça de vinte e cinco anos, aproximadamente, mostrava no semblante torturado harmoniosa beleza. O rosto delicado parecia haver saído de uma tela preciosa, todavia, com a suavidade das linhas fisionômicas contrastavam a inquietação e o pavor dos olhos escuros e o abandono dos cabelos em desalinho.
Ao lado dela, descansava outra mulher, sem o veículo físico.
Recostada num travesseiro de grandes dimensões, dava a idéia de proteger a moça indiscutivelmente enferma, contudo, a vaguidão do olhar e o halo obscuro de que se cercava, não nos deixavam dúvida quanto à sua posição de desequilíbrio interior.
Conservava a destra sobre a medula alongada da senhora vencida e doente, como se quisesse controlar-lhe as impressões nervosas, e fios cinzentos que lhe fluíam da cabeça, à maneira de tentáculos dum polvo, envolviam-lhe o centro coronário, obliterando-lhe os núcleos de força.
Indiferentes ambas à nossa presença, foi possível observá-las atentamente, identificando-se-lhes a posição de verdugo e de vítima.
Arrancando-nos da indagação silenciosa em que nos demorávamos, Clarêncio explicou:
– A jovem senhora é Zulmira, a segunda orientadora deste lar, e a irmã desencarnada que presentemente lhe vampiriza o corpo é Odila, a primeira esposa de Amaro e mãezinha de Evelina, dolorosamente transfigurada pelo ciúme a que se recolheu. Empenhada em combater aquela que considera inimiga, imanta-se a ela, através do veículo perispirítico, na região cerebral, dominando a complicada rede de estímulos nervosos e influenciando os centros metabólicos, com o que lhe altera profundamente a paisagem orgânica.
– Mas, porque não há reação por parte da perseguida? – inquiri, perplexo.
– Porque Zulmira, a nossa amiga encarnada, caiu no mesmo padrão vibratório – aclarou o instrutor –. Ela também se devotou ao marido com egoísmo aviltante. Amaro sempre foi pai afetuosíssimo.
O matrimônio anterior deixou-lhe um casal de filhinhos, mas o pequeno Júlio, formosa criança de oito anos, perdeu a existência no mar. A segunda mulher nunca suportou, sem mágoa, o carinho do genitor para com os órfãos de mãe. Revoltava-se,
choramingava e doía-se constantemente, diante das menores manifestações de ternura paternal, entrelaçando-se, por isso mesmo, com as desvairadas energias da irresignada companheira de Amaro, arrebatada pela morte. Em suas preocupações doentias, Zulmira chegou a desejar a morte de uma das crianças. Pretendia possuir o coração do homem amado, com absoluto exclusivismo.
E porque as atenções de Amaro se concentravam particularmente sobre o menino, muitas vezes emitiu silenciosamente o anseio de vê-lo afogar-se na praia em que se banhavam. Certa manhã, custodiando os enteados, separou Evelina do irmão, permitindo ao petiz mais ampla incursão nas águas. O objetivo foi atingido. Uma onda rápida surpreendeu o miúdo banhista, arrojando-o ao fundo.
Incapaz de reequilibrar-se, Júlio voltou cadaverizado à superfície.
O sofrimento familiar foi enorme. O ferroviário sentiu-se psiquicamente distanciado da segunda esposa, classificando-a como relaxada e cruel com os filhinhos. Zulmira, a seu turno, acabrunhada com o acontecimento e guardando consigo a responsabilidade
indireta pelo desastre havido, caiu obsidiada ante a influência perniciosa da rival que a subjugava do plano invisível.
Clarêncio fez ligeiro intervalo e continuou:
– O sentimento de culpa é sempre um colapso da consciência e, através dele, sombrias forças se insinuam... Zulmira, pelo remorso destrutivo, tombou no mesmo nível emocional de Odila e ambas se digladiam num conflito de morte, inacessível aos olhos
humanos comuns. É um caso em que a medicina terrestre não consegue interferência.
Calara-se o Ministro.
Qual se nos registrasse a presença por intuição, Odila movimentou-se e, agarrando-se à pobre senhora com mais força, gritou:
– Ninguém a libertará! Sou infeliz mãe espoliada... Farei justiça por minhas próprias mãos...
E contemplando a enferma com expressão terrível, acrescentava:
– Assassina! Assassina!... Mataste meu filhinho! Morrerás também!...
A doente abriu desmesuradamente os olhos.
Extrema palidez cobriu-lhe a face.
Não ouvia as palavras da adversária que lhe era invisível, mas, envolta na onda magnética que a enlaçava, sentia-se morrer.
Clarêncio afagou-lhe a fronte e disse, calmo:
– Pobre moça!...
Hilário e eu, instintivamente abeiramo-nos de Odila para afastá-la com a presteza possível, mas o instrutor generoso detevenos com um gesto, advertindo:
– A violência não ajuda. As duas se encontram ligadas uma a outra. Separá-las à força seria a dilaceração de conseqüências imprevisíveis. A exasperação da mulher desencarnada pesaria demasiado sobre os centros cerebrais de Zulmira e a lipotimia
poderia acarretar a paralisia ou mesmo a morte do corpo.
– Mas, então – clamou Hilário, contrafeito –, como extinguir essa união indébita? Não será justo afastar o algoz da vítima?
Clarêncio sorriu e ponderou:
– Aqui, o quadro é diverso. Na esfera carnal, a cápsula física é precioso isolante das energias desequilibradas de nossa mente, entretanto, em nosso plano de ação, no problema que observamos, essas forças desbordam ameaçadoras sobre a infortunada mulher, cujo corpo pode ser comparado a uma lâmpada de fraca receptividade,
sobre a qual seria perigoso arremessar uma corrente superior à capacidade de resistência a que se enquadra. A inutilização seria completa.
– Que poderíamos fazer? – indagou Hilário, desapontado.
– Precisamos atuar na elaboração dos pensamentos da infortunada irmã que tomou a iniciativa da perseguição. É imprescindível dar outro rumo à vontade dela, deslocando-lhe o centro mental e conferindo-lhe outros interesses e diferentes aspirações.
– E não podemos começar, exortando-a?
O Ministro, sereno, obtemperou sem alterar-se:
– Talvez, assim de momento, não pudéssemos ou não soubéssemos.
A preparação é indispensável.
– Nada custa uma conversação de censura... – alegou meu companheiro, admirado.
– Sim, uma doutrinação pura e simples seria cabível, contudo, não podemos esquecer que a organização cerebral da vítima permanece excessivamente martelada. Nossa intervenção no campo espiritual de Odila deve ser envolvente e segura para evitar choques e contrachoques, que repercutiriam desastrosamente sobre a outra. Nem doçura prejudicial, nem energia contundente...
O instrutor dirigiu piedoso olhar às duas mulheres e prosseguiu:
– A questão nesta casa surge realmente melindrosa. É necessário buscar alguém que já tenha amealhado na alma bastante amor e bastante entendimento para conversar com o poder criador da renovação.
Refletiu alguns instantes e aduziu:
– Contamos em nossas relações com a irmã Clara. Rogaremos o concurso dela. Modificará Odila com o seu verbo coroado de luz, inclinando-a ao serviço da conversão própria. Por agora, de nossa parte, somente nos é possível a dispensação de algum alívio e nada mais.
Recomendou a Eulália assistisse Evelina para o refazimento psíquico de que a menina necessitava e, em seguida, aplicou recursos magnéticos sobre Zulmira, em passes calmantes, de longo curso.
Qual se fosse brandamente anestesiada, a enferma passou da irritação à serenidade e pareceu dormir aos olhos do esposo que chegara, de mansinho, acomodando-lhe os travesseiros.

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 2 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



2 - NO CENÁRIO TERRESTRE

Numa sala ampla, em que numerosas entidades trabalhavam solícitas, Clarêncio recebeu da jovem um pequeno gráfico que passou a examinar, cauteloso.
Em seguida, comentou, espontâneo:
– Ainda agora, falávamos de responsabilidade. Eis um fato que nos ilustra os conceitos.
E, exibindo o documento que trazia nas mãos, explicou:
– Temos aqui uma oração comovedora que superou as linhas vibratórias comuns do plano de matéria mais densa. Parte de uma devotada servidora que se ausentou de nossa cidade espiritual, há precisamente quinze anos terrestres, para determinadas tarefas na reencarnação. Não seguiu, porém, desassistida. Permanece sob nossa orientação, O nascimento e o renascimento, no mundo, sob o ponto de vista físico, jazem confiados a leis biológicas de cuja execução se incumbem Inteligências especializadas, contudo, em suas características morais, subordinam-se a certos ascendentes do
espírito.
O Ministro deteve-se alguns instantes, analisando a pequenina e complicada ficha, todavia, como se provocasse a continuidade da lição que recebíamos, meu companheiro considerou:
– Mas, indiscutivelmente, na reencarnação há um programa de serviço a realizar...
– Sim, sem dúvida – aclarou o instrutor –, quanto mais vastos os recursos espirituais de quem retorna à carne, mais complexo é o mapa de trabalho a ser obedecido. Quase todos temos do pretérito expressivo montante de débito a resgatar e todos somos desafiados pelas aquisições a fazer. Nisso está o programa, significando
em si uma espécie de fatalidade relativa no ciclo de experiências que nos cabe atender; entretanto, a conduta é sempre nossa e, dentro dela, podemos gerar circunstâncias em nosso benefício ou em nosso desfavor. Reconhecemos, assim, que o livre arbítrio, também relativo, é uma realidade inconteste em todas as esferas
de evolução da consciência. Não podemos olvidar, contudo, que, em todos os planos, marchamos em verdadeira interdependência.
Nas linhas da experiência física, até certo ponto, os filhos precisam dos pais, os doentes necessitam dos médicos e os moços não prescindem do aviso dos mais velhos. Aqui, a habilitação depende dos educadores, o amparo eficiente exige quem saiba distribuí-lo e a transferência de domicílio para trabalho enobrecedor, quando
se trata de Espíritos sem méritos absolutos, reclama o endosso de autoridades competentes.
– Mas, que vem a ser uma oração refratada? – indagou o meu colega, mordido de curiosidade.
Hilário fora igualmente médico no mundo e, tanto quanto eu, permanecia em tarefas ligadas à responsabilidade de Clarêncio, adquirindo conhecimentos especializados.
– A prece refratada é aquela cujo impulso luminoso teve a sua direção desviada, passando a outro objetivo.
Inclinávamo-nos a desfechar novas perguntas, no entanto o orientador sossegou-nos, esclarecendo:
– Esperem. Reconhecerão comigo que nos achamos todos imanados uns aos outros.
Em seguida, falou para a jovem que o observava, respeitosa:
– Chame a irmã Eulália.
Alguns momentos passaram, rápidos, e a cooperadora mencionada apareceu irradiando bondade e simpatia.
– Irmã – disse Clarêncio, preciso –, este gráfico registra aflitivo apelo de Evelina, cuja volta ao aprendizado na carne foi garantida por nossa organização. Parece-me estar a pobrezinha em extremas dificuldades...
– Sim – concordou a interpelada –, Evelina, apesar da fragilidade do novo corpo, vem sustentando imensa luta moral. O pai, sobrecarregado de questões íntimas, tem a saúde periclitante e a madrasta vem sofrendo obstinada perseguição, por parte de nossa desventurada Odila.
– A genitora de Evelina?
– Sim, ela mesma. Ainda não se resignou a perder a primazia feminina no lar. Há dois anos empenho energia e boa vontade por dissuadi-la. Vive, porém, enovelada nos laços escuros do ciúme e não nos ouve. O egoísmo desbordante fá-la esquecida dos compromissos que abraçou. Zulmira, por sua vez, a segunda esposa de Amaro, desde a morte do pequenino Júlio caiu em profundo abatimento.
Como não ignoramos, o pequeno desencarnou afogado, consoante as provas de que se fez devedor. A madrasta, contudo, que chegou a desejar-lhe o desaparecimento por não amá-lo, encontrando-se sob as sugestões da mulher que a precedeu nas atenções do marido, crê-se culpada... Evelina, depois de perder o maninho em trágicas circunstâncias, acha-se desorientada, entre o genitor aflito e a segunda mãe, em desespero... Ainda anteontem, pude vê-la. Chorava, comovedoramente, diante da fotografia da mãezinha desencarnada, suplicando-lhe proteção. Odila, porém,
envolvida nas teias das próprias criações mentais, não se mostra capaz de corresponder à confiança e à ternura da menina. Ela, entretanto, tem insistido com tal vigor na obtenção de socorro espiritual que as suas rogativas, quebrando a direção, chegam até aqui, de tal modo...
Reparávamos o pequeno gráfico em Silêncio.
Sustando a pausa longa, o Ministro fixou Hilário e indagou:
– Compreendem agora o que seja uma oração refratada? Evelina recorre ao espírito materno que não se encontra em condições de escutá-la, mas a solicitação não se perde... Desferida em elevada freqüência, a súplica de nossa irmãzinha vara os círculos inferiores e procura o apoio que lhe não faltará.
Passeando em nós o olhar muito lúcido, concluiu:
– Desejariam cooperar conosco na tarefa assistencial?
Sem dúvida, o caso fascinava-nos a atenção.
O orientador, no entanto, recomendou esperássemos dois dias.
Desejava inteirar-se, a sós, de todas as ocorrências, para instruir-nos com segurança, quando estivéssemos a usufruir-lhe a companhia.
Nossa excursão, todavia, foi marcada e, no momento preciso, achávamo-nos a postos.
Sem delonga na viagem, Clarêncio, Eulália, Hilário e eu encontramo-nos em residência modesta, mas confortável, num dos bairros do Rio de Janeiro.
O relógio citadino acusava exatamente vinte e uma horas.
Entramos.
Em estreito compartimento, à guisa de gabinete de trabalho e biblioteca, um homem de trinta e cinco anos presumíveis lia, com visíveis sinais de preocupação, um manual de mecânica.
Na secretária singela, desdobravam-se publicações diversas, denunciando-lhe os estudos.
Clarêncio, assumindo com mais propriedade o papel de mentor do nosso grupo, informou, gentil:
– Este é Amaro, o chefe da casa. Tem, no longo pretérito, complicados compromissos. Em muitas ocasiões, usou projéteis e lâminas de ferro para o mal. Hoje, é servidor categorizado numa ferrovia...
Em seguida, passamos a gracioso quarto próximo.
Encantadora adolescente de catorze anos bordava iniciais num lenço de linho.
Magra e triste, parecia concentrar a mente nos olhos grandes e serenos. Não nos assinalou a presença, mas, ao contacto das mãos espirituais do Ministro, revelou indefinível contentamento interior.
Instintivamente, desviou o olhar do pano alvo e fixou-o num retrato de mulher que pendia da parede. Sorriu, enlevada, qual se conversasse com a imagem, enquanto Clarêncio nos dizia:
– Esta é a nossa Evelina, cuja reencarnação foi por nós organizada, faz alguns anos. A fotografia é uma lembrança da mãezinha que já partiu. Evelina está ligada aos pais, através de imenso amor, desde séculos remotos. Veio ao encontro de criaturas e
situações das quais necessita para a garantia da própria ascensão, mas trouxe também consigo a tarefa de auxiliar os progenitores.
No momento, acredita-se amparada pela mãezinha, entretanto, pelos méritos já acumulados na vida espiritual, é ela mesma quem continua socorrendo o coração materno, ainda em luta...
Abracei, comovido, a mocinha extática, que se guardava em luminoso halo de tranqüilidade e, por alguns instantes, meditei na grandeza do amor e na sublimidade da oração.

ESTUDO DO LIVRO ENTRE A TERRA E O CÉU - CAP. 1 - ORADOR ALEXANDRE X. CAMARGO



1 - EM TORNO DA PRECE

No Templo do Socorro1, o Ministro Clarêncio comentava a sublimidade da prece e nós o ouvíamos com a melhor atenção.
– Todo desejo – dizia, convincente – é manancial de poder. A planta que se eleva para o alto, convertendo a própria energia em fruto que alimenta a vida, é um ser que ansiou por multiplicar-se...
– Mas todo petitório reclama quem ouça – interferiu um dos companheiros. – Quem teria respondido aos rogos, sem palavras, da planta?
O venerando orientador respondeu, tranqüilo:
– A Lei, como representação de nosso Pai Celestial, manifesta-se a tudo e a todos, através dos múltiplos agentes que a servem.
No caso a que nos reportamos, o Sol sustentou o vegetal, conferindo-lhe recursos para alcançar os objetivos que se propunha atingir.
E, imprimindo significativa entonação à voz, continuou:
– Em nome de Deus, as criaturas, tanto quanto possível, atendem às criaturas. Assim como possuímos em eletricidade os transformadores de energia para o adequado aproveitamento da força, temos igualmente, em todos os domínios do Universo, os transformadores da bênção, do socorro, do esclarecimento... As correntes centrais da vida partem do Todo-Poderoso e descem a flux,transubstanciadas de maneira infinita. Da luz suprema à treva total, e vice-versa, temos o fluxo e o refluxo do sopro do Criador, através de seres incontáveis, escalonados em todos os tons do
1 Instituição da cidade espiritual em que se encontra o Autor. (Nota do
Autor espiritual).
Instinto, da inteligência, da razão, da humanidade e da angelitude, que modificam a energia divina, de acordo com a graduação do trabalho evolutivo, no meio em que se encontram. Cada degrau da vida está superlotado por milhões de criaturas... O caminho da ascensão espiritual é bem aquela escada milagrosa da visão de Jacob, que passava pela Terra e se perdia nos céus... A prece, qualquer que ela seja, é ação provocando a reação que lhe corresponde.
Conforme a sua natureza, paira na região em que foi emitida ou eleva-se mais, ou menos, recebendo a resposta imediata ou remota, segundo as finalidades a que se destina. Desejos banais encontram realização próxima na própria esfera em que surgem.
Impulsos de expressão algo mais nobre são amparados pelas almas que se enobreceram. Ideais e petições de significação profunda na imortalidade remontam às alturas...
O mentor generoso fez pequeno intervalo, como a dar-nos tempo para refletir e acentuou:
– Cada prece, tanto quanto cada emissão de força, se caracteriza por determinado potencial de freqüência e todos estamos cercados por Inteligências capazes de sintonizar com o nosso apelo, à maneira de estações receptoras. Sabemos que a Humanidade Universal, nos infinitos mundos da grandeza cósmica, está constituída pelas criaturas de Deus, em diversas idades e posições...
No Reino Espiritual, compete-nos considerar igualmente os princípios da herança. Cada consciência, à medida que se aperfeiçoa e se santifica, aprimora em si qualidades do Pai Celestial, harmonizando-se, gradativamente, com a Lei. Quanto mais
elevada a percentagem dessas qualidades num espírito, mais amplo é o seu poder de cooperar na execução do Plano Divino, respondendo às solicitações da vida, em nome de Deus, que nos criou a todos para o Infinito Amor e para a Infinita Sabedoria...
Quebrando o silêncio que se fizera natural para a nossa reflexão,
o irmão Hilário perguntou:
– Contudo, como interpretar o ensinamento, quando estivermos à frente de propósitos malignos? Um homem que deseja cometer um crime estará também no serviço da prece?
– Abstenhamo-nos de empregar a palavra “prece”, quando se trate do desequilíbrio – aduziu Clarêncio, bondoso –, digamos “invocação”.
E acrescentou:
– Quando alguém nutre o desejo de perpetrar uma falta está invocando forças inferiores e mobilizando recursos pelos quais se responsabilizará. Através dos impulsos infelizes de nossa alma, muitas vezes descemos às desvairadas vibrações da cólera ou do vício e, de semelhante posição, é fácil cairmos no enredado poço
do crime, em cujas furnas nos ligamos, de imediato, a certas mentes estagnadas na ignorância, que se fazem instrumentos de nossas baixas idealizações ou das quais nos tornamos deploráveis joguetes na sombra. Todas as nossas aspirações movimentam
energias para o bem ou para o mal. Por isso mesmo, a direção delas permanece afeta à nossa responsabilidade. Analisemos com cuidado a nossa escolha, em qualquer problema ou situação do caminho que nos é dado percorrer, porquanto o nosso pensamento
voará, diante de nós, atraindo e formando a realização que nos propomos atingir e, em qualquer setor da existência, a vida responde, segundo a nossa solicitação. Seremos devedores dela pelo que houvermos recebido.
O Ministro sorriu, benevolente, e lembrou:
– Estejamos convictos, porém, de que o mal é sempre um círculo fechado sobre si mesmo, guardando temporariamente aqueles que o criaram, qual se fora um quisto de curta ou longa duração, a dissolver-se, por fim, no bem infinito, à medida que se reeducam as Inteligências que a ele se aglutinam e afeiçoam. O Senhor
tolera a desarmonia, a fim de que por intermédio dela mesma se efetue o reajustamento moral dos espíritos que a sustentam, de vez que o mal reage sobre aqueles que o praticam, auxiliando-os a compreender a excelência e a imortalidade do bem, que é o inamovível fundamento da Lei. Todos somos senhores de nossas criações e, ao mesmo tempo, delas escravos infortunados ou felizes tutelados. Pedimos e obtemos, mas pagaremos por todas as aquisições. A responsabilidade é principio divino a que ninguém poderá fugir.
Nesse instante, uma jovem de semblante calmo penetrou no recinto e, dirigindo-se ao nosso orientador, falou algo aflita:
– Irmão Clarêncio, uma de nossas pupilas do quadro de reencarnações sob suas diretrizes pede socorro com insistência...
– É um apelo individual urgente? – indagou o Ministro, preocupado.
– É assunto inquietante, mas numa prece refratada.
O prestimoso instrutor convidou-nos a acompanhá-lo e seguimo-lo, atentamente.