segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

ESTUDO DO LIVRO " O ESPÍRITO DA VERDADE " - MARIA J. SANCHES


ORAÇÃO DA MIGALHA
Cap. XIII – Item 5 

Senhor! 
Quando alguém estiver em oração, referindo-se à caridade, faze que este alguém me recorde, para que eu consiga igualmente ajudar em teu nome. 
Quantas criaturas me fitam, indiferentes, e quantas me abandonam por lixo imprestável!... 
Dizem que sou moeda insignificante, sem utilidade para ninguém; contudo, desejo transformar-me na gota de remédio para a criança doente. Atiram-me a distância, quando surjo na forma do pedaço de pão que sobra à mesa; no entanto, aspiro a fazer, ainda, a alegria dos que choram de fome. Muita gente considera que sou trapo velho para o esfregão, mas anseio agasalhar os que atravessam a noite, de pele ao vento... Outros alegam que sou resto de prato para a calha do esgoto, posso converter-mena sopa generosa, para alimento e consolo dos que jazem sozinhos, no catre do infortúnio, refletindo na morte. 
Afirmam que sou apenas migalha e, por isso, me desprezam... 
Talvez não saibam que, certa vez, quando quiseste falar em amor, narraste a história de uma dracma perdida e, reportando-te ao reino de Deus, tomaste uma semente de mostarda por base de teus ensinos. 
Faze, Senhor, que os homens me aproveitem nas obras do bem eterno!... E, para que me compreendam a capacidade de trabalhar, dize-lhes que, um dia, estivemos juntos, em Jerusalém, no templo de Salomão, entre a riqueza dos poderosos e as jóias faiscantes do santuário, e conta-lhes que me viste e me abençoaste, nos dedos mirrados de pobre viúva, na feição de um vintém. 

Meimei 

domingo, 16 de dezembro de 2012

ESTUDO DO LIVRO " O ESPÍRITO DA VERDADE " - MARIA J. SANCHES


AS ESTATUETAS
Cap. X – Item 14 

O diálogo, à noite, entre as duas senhoras, continuava na copa: 
– Você, minha filha, deve perdoar, esquecer... Lá diz o Evangelho que costumamos ver o argueiro no olho do vizinho, sem ver 
a trave dentro do nosso... 
– Mas, mamãe, foi um insulto! O moço parou à frente da janela, viu as minhas estatuetas e atirou a pedra! 
E Dona Balbina, senhora espírita de generoso coração, prosseguia falando à filha, Dona Rogéria: 
– Ele é um pobre rapaz obsediado. 
– História! É uma fera solta, isto sim! 
– Mas Dona Margarida, a mãe dele, foi sempre amiga... 
– Isso não vem ao caso... Cada qual é responsável pelos próprios atos. A senhora sabe que ele é maior. 
– Precisamos perdoar para sermos perdoados... 
– Ser bom é uma coisa, e outra coisa é ser tolo! Darei queixa à polícia... Somente não queria fazê-lo sem ouvi-la; contudo, Fábio e eu estamos decididos. Meu Fábio já anda cansado do volante... 
Pobre marido!... Dinheiro cavado emcaminhão é duro de ganhar... 
– Meu conselho, filha, é desculpar e desculpar... 
– Mas o prejuízo é de dois mil cruzeiros, além da injúria! 
– Mesmo assim, o perdãoé o melhor remédio. 
– Ah! Que será do mundo, assim, sem corrigenda, sem justiça? 
Nesse instante, alguém bate à porta. 
Ambas atendem. 
O portador comunica: 
– Um desastre! O senhor Fábio trombou uma casa e a parede caiu! 
Mãe e filha correm para o local,que se encontra entulhado de multidão, e vêem a casa acidentada. É justamente a moradia de Dona Margarida, a mãe do rapaz que atirara a pedra. 
O caminhão, num lance estouvado, derribara uma parede lateral e penetrara, fundo, inutilizando todo o mobiliário da sala de refeições. 
Apagara-se a luz no quarteirão e as duas, sem que ninguém as reconhecesse, podiam escutar Dona Margarida, que sustentava uma vela acesa, diante do guarda de trânsito: 
– Peço-lhe – dizia ao fiscal – não abrir processo algum. Não quero reclamações. 
– Mas, Dona Margarida – insistia o funcionário –, a senhora vai ter aqui um prejuízo para mais de quarenta contos! 
– Não importa. Deus dará jeito. “Seu” Fábio e Dona Rogéria são meus amigos de muito tempo. 
As duas senhoras, porém, não puderam continuar ouvindo, pois a voz irritada de Fábio elevou-se da multidão e era necessário socorrê-lo, porque o infeliz estava ébrio. 

Hilário Silva

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

ESTUDO DO LIVRO " SEXO E DESTINO " - MARIA J. SANCHES E JULIANA SOLARE


SEGUNDA PARTE
Médium: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER

CAPÍTULO 2

Nogueira, reinstalado no aposento, ensimesmou-se, refletindo, refletindo...
Lá fora, a noite de chumbo e, com ele, o silêncio, apenas entremeado pela respiração sibilante da filha...
Se fosse unicamente Salomão o interventor inesperado! — pensava, cismarento —, e talvez não se permitiria maior detenção no assunto. Aquele vendedor de remédios que lhe confidenciara os sucessos da noite, inspirando-lhe, aliás, gratidão e simpatia, parecera-lhe excelente pessoa; entretanto, na simplicidade bonachona com que se apresentava, poderia não passar do crente de boa-fé, lamentavelmente emblocado na superstição... Agostinho, no entanto, agitava-lhe o espírito.
Comerciante abastado e instruído, não se deixaria enrolar em tapeações.
Conhecia-lhe a agudeza de raciocínio, a honestidade. Além disso, possuiria ocupações mais vantajosas em que aplicar atenção e tempo.
Que doutrina aquela, capaz de induzir um cavalheiro dinheiroso, a entrar em prece, num quarto de hospital, chorando de compaixão por arrasada menina, à beira da sepultura? Que princípios impeliam, assim, um homem educado e rico a esque-cer-se, no socorro aos infelizes, a ponto de tocar-lhes as matérias fecais, imbuído daquele amor, que somente os pais conhecem nas entranhas do coração?
Fitou Marita que dormia, calma, e recordou os dois homens abnegados que lhe haviam trazido alívio, sem nada perguntar... Ele que jamais se aproximara de ensinamentos religiosos, habitualmente tratados por ele com manifesta desconsideração, acolhia-se agora a vasta série de porquês.
Abafado, agoniava-se com a sede de algo... Sem o apoio  fluídico de Moreira, que dedicava todas as energias à moça em decúbito, lembrou o cigarro, mas dizia de si para consigo que não era mais o cigarro o objeto que desejava.
Aspirava a sair, correr ao encontro de Agostinho e Salomão, a fim de perguntar-lhes pela fé em Deus. Anelava inteirar-se de como conseguiam entesourar tanta crença. Ambos haviam suavizado a opressão que lhe supliciava a  filha... Naquele instante, indagava a si mesmo se não era igualmente digno de piedade. Marita repousava no sono das vítimas, que a justiça resguarda na paz inviolável da consciência, enquanto que ele se atormentava na vigília dos réus!... Reconhecia-se enfermo da alma, náufrago que afundava no redemoinho do desespero... Queria agarrar-se a alguém, a alguma coisa. Singela raiz de confiança mantê-lo-ia à margem da queda total!... A solidão asfixiava-o. Tinha fome de companhia.
Sugeri-lhe a leitura. Que ele abrisse o volume com que  fora brindado. O livro conversaria em silêncio, ser-lhe-ia companheiro. Não se comprometesse a digerir-lhe, de vez, todas as instruções.
Consultasse trechos, aqui e ali. Respigasse ideias, selecionasse conceitos.
Assimilou-me a indução e tomou a brochura, compulsando-a.Ainda assim, tentou reagir.
Acusava-se incapaz, inquieto. Não retinha a menor parcela  de serenidade para ler com aplicação ao assunto.
Insisti, porém.
Os dedos nervosos tatearam o índice. Relanceou o olhar, através das legendas.
No capítulo 11º, esbarrou com um item sob o título: «Caridade para com os criminosos». Aquelas sílabas invadiram-lhe o cérebro atribulado quais gazuas de fogo. Sentia-se descoberto por tribunal invisível. Sim! —  monologou, desconsolado — é imprescindível examinar-se. Na própria conceituação, qualificava-se por malfeitor, foragido da grade. Durante o dia inteiro fora visto e acatado, ali, sob aquele teto, como sendo pai carinhoso, mas sabia-se estuprador, filicida...
Carregava a dor irremediável de haver impelido a filha querida à loucura e à morte!... Que condenações enfileiraria aquele volume contra ele? Merecia escutar a própria sentença, junto daquela que lhe caíra sob o golpe aniquilador...
Procurou a folha indicada e oh! surpresa!... O livro nãolhe amaldiçoava a presença. Leu e releu, chorando, aquelas frases que ressumavam brandura e entendimento. Identificou-se à frente de um apelo à fraternidade e à compaixão, que não pintava os delinquentes por seres infernais, ausentes da órbita do Amor Divino.
A pequena mensagem concitava à tolerância e terminava rogando preces, a benefício dos que sucumbem na voragem do mal.
As lágrimas borbotaram-lhe mais profusamente dos olhos!... Aquelas palavras chamavam-no a razão. Percebia que o mundo e a vida devia mestrar banhados de profunda misericórdia.
Classificava-se por matador e achava-se ali, reconsiderando o próprio caminho, com suficiente lucidez para analisar-se e pensar... Aquele  primeiro contacto com as verdades do espírito fendia-lhe, de alto a baixo, a cidadela do ateísmo. Com a sofreguidão do sedento que atravessa longo deserto, mortificado de sede, atirou-se aos textos, de cujos caracteres ideias esclarecedoras e balsâmicas vertiam, sublimes, lembrando torrentes de água pura. Esquadrinhou vários temas...
Adquiriu conhecimentos rápidos acerca da reencarnação e da  pluralidade dos mundos, meditou nas maravilhas da caridade e nos prodígios da fé, através das chamas imortais do Cristianismo que ali renasciam para ele, reaquecendo-lhe o coração!...
Quando olhou o relógio, os ponteiros marcavam duas da madrugada.
Varara quatro horas, mergulhado no livro, sem perceber.Sentia-se outro, O cérebro clareara-se, crivado de pensamentos renovadores que  lhe suscitavam ardentes inquirições. Aquela era uma doutrina que lhe  permitia sentir e indagar livremente, qual filho no regaço de mãe... Em verdade,conjeturava, se Deus não existisse, se não houvesse uma vida, além da Terra, por que se entregava, daquele modo, a tão funda compunção? Se tudo na existência acabaria em animalidade e lodo, que razões lhe ditariam o suplício moral, diante  da filha, que lhe inspirava contraditórios sentimentos?
Amava tanto aquela menina desventurada!... Por que não lograra sustentar-se, na posição de pai, infenção aos impulsos do sexo? que forças o haviam arrastado até à condição do verdugo em que se aviltara? A ideia dar encarnação relampejou-lhe na cabeça. Ele e ela remanesciam de experiências anteriores...
Indubitavelmente, algemada a dominadoras alucinações afetivas, teriam vivido no passado, padecido e chorado juntos!... Aquela devoção por  Marita era para ele comparável ao iceberg que mostra reduzido fragmento, ocultando o peso enorme na vastidão das águas... Naquele momento, algo lhe dizia, na acústica do espírito, que ele, Cláudio, a trouxera, de novo, para o mundo, através da paternidade, a fim de orientá-la com limpeza e abnegação!... A sabedoria da vida restituíra-lhe o carinho, no sorriso filial, por algum tempo, para que retificasseos erros do tirano amoroso que deveria ter sido em épocas passadas e as paixões cujos rescaldos lhe calcinavam agora o coração... As realidades do destino se lhe alteavam do pensamento, belas e difusas, como o brilho dos raios de luz ao fundirem a névoa...
Ainda assim, não se desculpava. Reconhecia ter agravado os próprios débitos.
Entrevendo as realidades da vida Além-Túmulo, apelava para os amigos que vira partir!... Que se apiedassem dele e de Marita! que suplicassem a Deus para trocar-lhe a existência pela dela...
Ele que se classificava pai criminoso expiaria, no mundo espiritual, as próprias faltas, para, em seguida, renascer na Terra, mutilado,  ressarcindo os débitos contraídos. Que ele se afligisse, expungindo as nódoas da  alma; entretanto, que a filha vivesse e fosse feliz!... E, se lhe cabia continuar, ainda, no mundo, transportando no peito a angústia daquela hora, que a deixassem mesmo assim, abatida e muda, em seus braços! Teria forças para carregá-la’ Ser-lhe-ia apoio, refúgio!... Que ela ficasse! que se lhe desse oportunidade de transfigurar, junto dela, todos os caprichos de homem rude em manifestações de amor puro... Aconchegá-la-ia, de algum modo, ao coração. Obteria uma cadeira  de rodas, conduzi-la-ia a qualquer parte. Acolheria sem reclamar quaisquer obstáculos; entretanto, implorava à Providência Divina poupasse Marita ao gládio da morte  para que não faltasse a ele o ensejo de reajuste e reparação!...
Abracei-o, sugerindo-lhe esperança. Que não esmorecesse. Confiasse. Quem estaria na Terra, sem problemas? Quantos, naquela mesma  hora, em outros lugares, se achariam em lutas semelhantes? Aquele volume,  que lhe sacudia o pensamento, se mantinha, ali, qual sinal de trânsito, na estrada do destino. Valia interpretar o remorso por marca vermelha, suscitando parada.
Conviria frear o carro dos próprios desejos e pensar, pensar!... Todos atingimos um dia de reconciliação com a própria consciência; que não  desertasse da luz que lhe acendiam na marcha.
Compreendesse que a lei de Deus não se afirma em condenação, mas sim em justiça e que a justiça de Deus nunca se expressa sem piedade. Que ele meditasse,
concluindo que se nós outros, os homens imperfeitos, já conseguíamos adicionar compaixão à justiça, por que motivo Deus, que é o Amor Infinito, haveria de exercê-la, implacável? Ali, transpúnhamos a escuridão da noite... a alvorada não tardaria e, com ela, o sol diurno que chegava sempre novo!... Que levantássemos todos os sentimentos para a renovação que começava!...
Moreira, que me avistava enlaçado a ele, endereçou-me ansioso olhar, como a inquirir pelas idéias que eu lhe insuflava. Antes, porém, que me viesse substituir, cioso do lugar de conselheiro que me permitia ocupar, apelei para Cláudio, inclinando-o a iniciar, ali mesmo, a obra reparadora.
O bancário não vacilou.
Fundamente enternecido, levantou-se, caminhou na direção da cama e ajoelhou-se à cabeceira.
Confessava a si próprio que, pela primeira vez, depois de muito tempo, fitava o semblante da filha, sem que a mais leve tisna de fascinação sexual lhe alterasse os sentimentos.
Tremeu-lhe o coração, atormentado.
Acariciou-a com uma espécie de ternura que jamais experimentara, deixou que as próprias lágrimas lhe orvalhassem o rosto e suplicou, em surdina:
— Perdão, minha filha!... Perdão para seu pai!...
A rogativa desfaleceu na garganta que os soluços embargavam...
Marita evidentemente não respondeu; no entanto, o afago paternal instilou-lhe energia diferente e tanto Moreira quanto eu próprio registramos, espantados, o gemido que ela desferiu, denotando sinais de retorno asi mesma.
Cláudio, esperançado, desligou-se. O carinho impregnara-se nele de súbito respeito.
Intimamente comparou aquele afeto imaculado que lhe nascia ao lírio alvo que desponta num charco.
Outros gemidos repetiram-se imprecisos, dolorosos...
O genitor escutava-os, ralado de angústia. Daria o que tivesse para traduzir
aqueles vagidos de criança inconsciente... Conjeturou, porém, que eles exprimiam
padecimentos físicos inenarráveis e agoniou-se em choro convulsivo. O ex-vampirizador, transfigurado em servo diligente, ergueu-se, presto, e veio abraçá-lo, no intuito de propiciar-lhe reconforto, mas notei que  os dois amigos jaziam, agora, perto e longe um do outro. Juntos por fora e distantes por dentro. Ombros unidos e pensamentos opostos. Moreira fora atingido pelos acontecimentos, mas não tanto.
Patenteava enorme afeição por Marita, lutava por ela, mas, no fundo, não escondia o propósito de seguir controlando Cláudio, no resguardo de seu próprio interesse.
Identificando o parceiro tocado no coração pelos sentimentos edificantes que a leitura lhe sugerira, revelava o desapontamento semelhante ao de um pianista que surpreendesse o instrumento favorito com as teclas mudas.
Alarmado, desfechou-me perguntas. Sosseguei-o, afirmando que o cérebro de Nogueira se anulava, naquele instante, por arrasadoras comoções; entanto, no íntimo, certificara-me de que ele havia dado um passo adiante e de que o com-panheiro menos feliz deveria elevar-se no mesmo diapasão para desfrutar-lhe a convivência, se não quisesse perder-lhe a companhia.
A mente do bancário emergia daquelas horas reduzidas de  estudo compulsório, sob a tormenta moral, ao jeito de paisagem, quando varrida de terremoto. Nenhuma analogia com o que era antes.
Em razão disso, enfadava-se o outro, melindrado, triste.
Mesmo assim, Moreira retomou o trabalho de manutenção da jovem prostrada.
Nisso, porém, chegaram dois auxiliares, Arnulfo e Telmo,que vinham, da parte do irmão Félix, colaborar no auxílio à menina.
Ambos simpáticos, espontâneos.
Apresentei-os ao mantenedor magnético, surpreso, cuja posição espiritual reconheceram, de pronto; contudo, na gentileza característica dos corações generosos, envidaram todos os esforços para não constrangê-lo com qualquer linha divisória de tratamento. Rodearam-no de otimismo e bondade, qualificando-o na categoria de colega estimável.
Na antevéspera, aquele irmão, que se avalentoava no Flamengo, não aceitaria tal camaradagem; todavia, Marita ali respirava, entre dois mundos... Fatigada, dispneica...
Por Marita, suportava as alterações, sofreava os impulsos.
A madrugada abeirava-se do dia.
Acercamo-nos de Cláudio.
Indispensável fazê-lo descansar, dormir.
Moreira, com iniludível desgosto a se lhe estampar na fisionomia, observou-nos o cuidado, na administração dos passes balsâmicos, aos quais o  paciente aquiesceu sem qualquer contradita.
Aliás é de mencionar-se a sensação de alívio com que Cláudio nos respondeu ao toque sugestivo. Acabava de viver minutos de martírio inominável. Aspirava ao repouso, mendigava esmola de paz.
Todavia, enquanto se lhe relaxavam os nervos tensos à pressão do sono que lhe impúnhamos, brandamente, Moreira a tudo assistia, no crescente desagrado da pessoa que contempla a agitação e a mudança de sua casa, conturbada em serviços de reforma que não pediu. Lançava ondas de azedia  e amargura no sorriso amarelo. Tudo para ele surgia deslocado, revirado... Entre o amigo que lhe fugia ao comando e a jovem, cujo corpo físico se decidia a  preservar, sentia-se atônito, desenxavido...
Compreendendo que não lhe seria lícito incompatibilizar-se conosco, simplesmente à face da assistência que o esposo de Dona Márcia recolhia de nós, aplicou-se com mais veemência às atenções para com a moça, cujos pensamentos mais profundos empenhava-se agora por auscultar.
Marita, a seu turno, porque assimilasse mais amplo montante de força, acabou reassumindo o leme dos centros cerebrais, que ainda se lhe  mantinham à disposição. Recuperou a sensibilidade olfativa, percebia, raciocinava e ouvia com relativa segurança; contudo, estava hemiplégica, nada enxergava e extinguira-se-lhe a fala, de modo irreversível. A princípio, admitiu-se acordando no sepulcro. Ouvira muitas narrações, alusivas a mortos que despertavam no túmulo, lera depoimentos relacionando sucessos dessa ordem e assistira a vários filmes de  horror. De alma opressa, supunha-se num transe desses, estendida ali no leito que tomava por ataúde, no silêncio de aflições inapeláveis... Forcejava por gritar, reclamando socorro; no entanto, veio-lhe a ideia de haver esquecido o processo dearticular as palavras.
Sabia-se pensando com a própria cabeça, mas ignorava agora os movimentos coordenadores da voz. Apesar de tudo, reconhecia-se consciente.
Sentia, memorizava. Recordou os acontecimentos que lhe haviam inspirado o propósito de morrer. Arrependia-se. Se a vida continuava, para que provocar o fim do corpo? — considerava, desditosa. Lembrou as ocorrências da Lapa, a entrevista com Gilberto pelo telefone de Dona Cora, os comprimidos de Salomão, o sono à frente do mar, o desconhecido prestes a assaltá-la, a corrida para o asfalto, a queda
sob o automóvel em movimento... Depois, aquilo ali... O corpo estatelado que lhe parecia de pedra, a consciência ativa, as percepções aguçadas e a incapacidade de expressão... Intimamente, o esforço desesperado para fazer-se notar; no entanto, sentia-se entalada por gargalheira de chumbo. Irritou-se, debalde. Fremia de impaciência, de espanto, de dor... Mágoa e revolta, petitórios e indagações
esmaeciam-se-lhe, imanifestos, no âmago do ser.
Por mais se empenhasse a chorar, desoprimindo-se, as lágrimas se lhe represavam  no peito, sem nenhum canal que lhe extravasasse as agonias.Os olhos, tanto quanto a língua, se lhe figuravam desligados do corpo...
Estaria morta — perquiria a jovem num misto de perplexidade e sofrimento —, ou quase a morrer?
Escutou os passos da enfermeira de plantão e registrou a respiração sibilante do pai, sem a possibilidade de identificar-lhes a presença e,em vão, tentou pedir explicação para o cheiro nauseante que a cercava.
Transcorridas duas horas de angústia recôndita, que Moreira assinalava com acuidade e precisão, a moça como que se aquietou, mentalmente, e perscrutando-lhe, por minha vez, o campo intimo, notei que se fixava lamentavelmente em Marina.
O companheiro desencarnado que, até então, se fazia suporte psíquico de Cláudio e que necessitava de base moral para garantir o  próprio reequilíbrio, encontrou pasto robusto a nova desorientação.
Descobri o perigo, sem poder conjurá-lo.
Percebendo-se demitido da complacência do amigo que se lhe transformara em joguete, procurava-lhe na filha motivos outros em que se  lhe facultasse permanecer atrelado à demência.
De nossa parte, não era possível pressionar a menina acidentada, no sentido de lhe sustar as lamentações. Qualquer dispêndio de energias, além das estritamente necessárias ao seu sustento, poderia precipitar-lhe a desencarnação.
Insciente das complicações que gerava com semelhante procedimento, a filha de Aracélia reconstituiu na imaginação as aperturas da existência. Acusava a irmã por todos os infortúnios. Exibia-lhe a figura na tela  da memória como sendo a inimiga imperdoável... Marina a furtar-lhe as carícias maternas, Marina a surripiar-lhe as oportunidades, Marina a roubar-lhe as afeições. Marina a subtrair-lhe o eleito dos sonhos juvenis...
Não valeram ponderações que lhe endereçávamos, inquietos.
A influência de Moreira, que lhe amimalhava as incriminações, surgia naturalmente muito mais vigorosa para ela, que diligenciava encontrar simpatia e adesão.
Aquela desventurada menina desconhecia os poderes do pensamento. Não sabia que, fora da indulgência e da brandura, invocava desagravo e, assim procedendo, não apenas enredava a família em duras provações, mas igualmente punha a perder o valioso trabalho de recuperação daquele amigo necessitado de afeição e de luz.
O ex-assessor de Cláudio, ao absorver-lhe as confidências mudas, em que relacionava os pesares mais íntimos, dos quais não tivera ele conhecimento, retomava, a pouco e pouco, a brutalidade que, anteriormente, lhe marcava a expressão.
Esvaeciam-se-lhe as melhoras de espírito.
A pretexto de auxiliar a protegida, reavivava os instintos de vingador.
O olhar que se adoçara de compaixão, readquiriu a lividez dos alienados.
Sumiram-se todos os indícios de retorno à sensatez e à humanidade que patenteava, desde o momento em que renteara com a moça abatida.
Inútil seria qualquer tentame para reconduzi-lo à serenidade. Embebendo-se nos queixumes daquela que classificava como sendo para ele a mulher querida, restaurava em si mesmo a selvageria da fera sequiosa de sangue. Respondendo-nos às petições de calma e tolerância, clamava que não, que não... Ninguém o faria renunciar à guerra pela tranqüilidade daquela que amava; alegava desconhecer, até então, o martírio que a irmã lhe aplicara durante a  vida inteira e insistiria no das-forço...
Ao vê-lo abandonar o serviço a que voluntariamente se impusera, incapaz de refletir nas conseqüências da própria deserção, compreendi  que o ex-obsessor convertido em amigo fora assaltado por crise de loucura e  inclinei-me a considerar se o irmão Félix não errara solicitando a permanência de Marita no corpo
desarticulado, tal a extensão dos males que o ex-vampirizador seria capaz de estender, a partir daquela hora; no entanto, reprimi-me... Não! eu não detinha o direito de julgar o companheiro destrambelhado que se afastava de nós, enquanto o sol da manhã se aprumava no céu. O irmão Félix sabia o que fizera e, com certeza, em outro tempo, não me desequilibrara e nem desacertara em ponto menor...
Competia-me simplesmente trabalhar, socorrer. Transferi  nossos encargos às atenções de Arnulfo e Telmo e demandei a residência dos Torres, o único lugar para onde Moreira, a nosso ver, decerto rumaria.
Entrei...
Na casa silente, cochichava-se a medo. Lágrimas no semblante  dos servidores humildes.
Dona Beatriz, em coma, esperava a morte. 
Neves e outros afeiçoados do mundo espiritual rodeavam o leito. Dedicada enfermeira observava a senhora prestes a mergulhar no grande repouso, diante de Nemésio, Gilberto e Marina, que se acomodavam a pequena distância.
Aturdido, porém, verifiquei que Moreira não se achava ainda aí. A surpresa, entretanto, se desfez para logo, de vez que, transcorridos  alguns momentos, o ex-acompanhante de Cláudio, seguido por quatro camaradas truculentos e carrancudos, penetrou, desrespeitosamente, o recinto... E,sem a menor comiseração pela agonizante, acercou-se da filha de Dona Márcia e gritou, encolerizado:
— Assassina!... Assassina!.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

LIVRO: VOLTEI DE CHICO XAVIER PELO ESPÍRITO DE FREDERICO FIGNER


MODIFICAÇÃO

O desvanecimento da força física determinava fenômeno singular em minha alma.
Surpreendia-me enternecido e sentimentalista. Acostumara-me a tratar com o  mundo, dentro do maior senso prático. Estimava a pregação da caridade, convicto, porém, de que a energia seca era indispensável nas relações humanas.
Muita vez, na intimidade de companheiros encarnados e entidades desencarnadas, sentira-me ríspido, contundente.  Fazia  frequentemente  o possível 
por não desmerecer a confiança dos que me  estimavam, entretanto, nem sempre 
sabia ser doce na extensão da personalidade.
Semelhante traço individual, que as lutas ásperas, da experiência humana me  impuseram, representava motivo de não poucos dissabores para mim, porque, no íntimo, aspirava a servir à fraternidade legítima, em nome do Cordeiro de Deus.
“OBREIROS DA VIDA ETERNA” – Nota do autor espiritual. 
Prostrado agora; inesperada sensibilidade passou a dirigir-me.  A renovação de caminhos obrigava-me a esquecer negócios e interesses terrenos.
Não me  era mais possível governar o leme do barco material e esse impositivo, ao que me pareceu, proporcionava-me acesso a mim mesmo.
Afetava-me a necessidade de ternura e compreensão, como se naquelas horas estivessem ingressando na idade juvenil.
O homem da ativa humana, obrigado a defender-se e a preservar o bem dos que lhe eram caros, através de mil modos diferentes, estava passando...
Quanto a isto, a morte gradual era uma realidade.
Redescobria-me, afinal.  Não era eu mais que um homem comum, reclamando socorro e carinho. Trazia  o coração opresso por aflições indizíveis. Se a dispneia  me roubava a  tranquilidade, os  temores povoavam-me o espírito de tristezas  e sombras. Jamais experimentara, antes,  tamanha sensação de exílio e deslocamento.
Na terra, estava cercado de benditas dedicações, por parte das filhas queridas e dos amigos abnegados e, a rigor, não me seduzia o regresso à juventude do corpo.
Seriam saudades do Além o fator determinante da inquietude que me martirizava?
Também não. Reconhecia os meus títulos de homem imperfeito que, de modo algum,  deveria sonhar como paraíso. Esperava-me, naturalmente, laborioso futuro em  qualquer parte.  No entanto, ansiedades dolorosas pesavam-me na alma abatida. Eu, que fazia  guerra às lágrimas, reconhecia-lhes, agora, o sumo poder; represavam-se-me nos  olhos, com frequência, quando, a sós, me entregava às longas meditações. Orava,   fervoroso, mas, ao correr da prece solitária, sentimentalizava-me qual criança. Entrara nas vésperas da total exoneração quanto aos deveres terrestres. Via-me  prestes a deixar o ninho planetário que me abrigara 
por dilatados anos...
A que porto demandaria?!...

domingo, 9 de dezembro de 2012

ESTUDO DO LIVRO " O ESPÍRITO DA VERDADE " - MARIA J. SANCHES


SE TENS FÉ
Cap. XXVII – Item 11 

Em Doutrina Espírita, fé representa dever de raciocinar com responsabilidade de viver. 
Desse modo, não te restrinjas à confiança inerte, porque a existência em toda parte nos honra, a cada um, com a obrigação de servir. 
Se tens fé, não permitirás que os eventos humanos te desmantelem a fortaleza do coração. 
Transitarás no mundo sabendo que o Divino Equilíbrio permanece vigilante e, mesmo que os homens transformem o lar terrestre em campo de lodo e sangue, não ignoras que a Infinita Bondade converterá um e outro em solo adubado para que a vida refloresça e prossiga em triunfo. 
Se tens fé não registrarás os golpes da incompreensão alheia, porquanto identificarás a ignorância por miséria extrema do espírito, e educarás generosamente a boca que injuria e a mão que apedreja. 
Ainda que os mais amados te releguem à solidão, avançarás para frente, entendendo e ajudando, na certeza de que o trabalho te envolverá o sentimento em nova luz de esperança e consolação. 
Se tens fé, não te limitarás a dizê-la simplesmente, qual se a oração sem as boa obras te outorgasse direitos e privilégios inadmissíveis na Justiça de Deus, mas, sim, caminharás realizando a vontade do Criador, que é sempre o bem para todas as criaturas. 
Se tens fé, sustentarás, sobretudo, o esforço diário do próprio burilamento, através das pequeninas e difíceis vitórias sobre a natureza inferior, como sendo o mais alto serviço que podes prestar aos outros, de vez que, aperfeiçoando a nós mesmos, estaremos habilitando a consciência para refletir, com segurança, o amor e a 
sabedoria da Lei. 

Emmanuel

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

LIVRO: VOLTEI DE CHICO XAVIER PELO ESPÍRITO DE FREDERICO FIGNER


À FRENTE DA MORTE

Todos nós, que estudamos o Espiritismo, consagrando-lhe as forças do coração, somos comumente assediados pela ideia da morte.
Como se opera a desencarnação? Que forças atuam no grande momento? 
De vez que quando, abordamos a experiência de pessoas respeitáveis e concluímos pela expectativa indagadora.
Por minha vez, lera descrições e teses preciosas, relativamente ao assunto, inclusive Bozzano e André Luiz. Desse último, recolhera informações que me sensibilizaram profundamente. Pouco antes de abrigar-me no leito da morte, meditara-lhe  as narrativas acerca da desencarnação de alguns companheiros e,  perante os  sintomas que me assaltavam, não tive qualquer dúvida. Aproximava -se o fim do corpo.

PREPARATIVOS

Não obstante o valor com que passei a encarar a situação e apesar do velho  hábito de convidar os amigos para o meu enterramento, em observações xistosas dos  dias de bom humor, descansei o organismo extenuado, na posição horizontal, mesmo porque me era totalmente impossível agir de outro modo.
O Irmão Andrade, Espírito benemérito dedicado à Medicina, com quem tive a  alegria de colaborar alguns anos, recomendara absoluto repouso e tão insistente se  fizera o conselho que fui obrigado a abandonar as últimas atividades doutrinárias.
O repouso físico, porém, agravava-me a preocupação mental. O impedimento  das mãos impunha-me verdadeira revolução íntima. No silêncio do quarto, os pensamentos como que se me evadiam do cérebro, postando-se ao meu lado a  argumentarem comigo. Alguns em posição simpática, outros em atitude adversa: “Velho Jacob –  proclamavam no fundo  –, você agora deixará as ilusões da carne. Viajará de regresso à realidade. Prepare-se. Que possui na bagagem? Não se esqueça de que a justiça tudo vê, tudo ouve, tudo sabe”.
Por vezes, interpunha recursos. A consciência compelia-me a retroceder aos  problemas nos quais funcionara com desacerto. Todavia, buscava atenuantes às próprias faltas. Alegava incertezas e imperativos da vida.
Confesso, no entanto, que as incursões, dentro de mim mesmo, angustiavam-me o ser. Se a vigília se tornara menos agradável, o sono fizera-se-me doloroso. Não  chegava a penetrar a região dos sonhos. Dispondo-me a dormir, supunha ingressar num modo inabitual de ser, em que a verdade se me patenteava com mais clareza.
Via-me noutra paisagem, noutro clima, ante, conhecido e desconhecido, qual se  estivera perante enorme multidão de pessoas desejosas de se fazerem compreendidas por mim.
De outras ocasiões, minha memória, recusava no tempo. Revia situações alegres e tristes, confortadoras e embaraçosas, de há muito extintas. Novamente no  corpo exausto, sentia extremas dificuldades  para reter as imagens e descrevê-las. O  cérebro acusava vida intensa, mas, no serviço de comunicação com o exterior, sentia-me  esgotado, tal qual um limão espremido.  A fé preparava-me o espírito, ante a grande transição; todavia, os receios  avultavam, as preocupações cresciam sempre.

domingo, 2 de dezembro de 2012

ESTUDO DO LIVRO " O ESPÍRITO DA VERDADE " - MARIA J. SANCHES


LIÇÕES DO MOMENTO 
Cap. V – Item 4 

Deus é amor invariável e o amor desafivela os grilhões do espírito. 
Se há repouso na consciência, a evolução da alma ergue-se, desenvolta, dos alicerces insubstituíveis do sacrifício. 
Quem não se bate pelo bem, desce imperceptivelmente para as fileiras do mal. 
Junto à correção sempre existe o desacerto, exaltando o mérito do dever na conduta digna. 
Identifique, na dificuldade, o favor da Providência Divina para dilatar-lhe a paz,sentindo, no imprevisto da experiência mais grave, o fulcro de incitamento à perseverança na boa intenção e vendo, na tibiez de quantos imergiram na invigilância, o exemplo indelével daquilo que não deve ser feito. 
Quanto maior a sombra em torno,mais valiosa a fonte de luz. 
Desse modo, a alegria pura viceja entre a dor e o obstáculo; a resignação santificante nasce em meio às provas difíceis; a renúncia intrépida irrompe no seio da injustiça das emulações acirradas, 
e a pureza construtiva surge, não raro, em ambiente de viciação mais ampla. 
Eis por que, em seu círculo pessoal, se entrecruzam mensagens importantes e diversas a lhe doarem o estímulo e a consolação, o entendimento e a claridade de que você carece para ajustar-se espiritualmente, através das lides variadas de cada instante. 
O chefe irritadiço é instrumento providencial da corrigenda. 
O companheiro problemático deixa-nos livre caminho à sementeira da fraternidade sem mescla. 
O engano é precioso contraste a ressaltar as linhas configurativas da atitude melhor. 
A tortuosidade do caminho demonstra a excelência da estrada reta. 
Faça, pois, do momento que transcorre, a lição recolhida para o momento a transcorrer, verificando quantas vezes, em vinte e quatro horas, você é requisitado a auxiliar os semelhantes, e não regateie cooperação. 
Na oficina de trabalho, buscam-lhe a gentileza no amparo de muitos corações que se sentem ao desabrigo. 
Na via pública, esbarram-lhe o passo companheiros que vão e vêm buscando encontrar o sorriso que você pode ofertar-lhes como incentivo à esperança. 
No recesso do lar, o alvorecer encontra-lhe a presença, em novas possibilidades de exaltar a confiança nos Desígnios da Altura. 
Na conversação comum, requisições ostensivas auscultam-lhe a disposição de estender conhecimento e virtude, na enfermagem das chagas morais, entrevistas na modulação das vozes e nos traços dos semblantes, afora variegados ensejos de assistir o próximo, a lhe desafiarem a eficiência e a vigilância, tais como a necessidade interior estampada no silêncio do visitante, o azedume do colega menos feliz, o doente a buscar-lhe os préstimos, o sofredor a rogar-lhe compreensão, a abordagem da criancinha desvalida, a surpresa menos agradável, a correspondência a exigir-lhe a atenção ou o noticiário intranquilo que a imprensa propala. 
Pureza inoperante é utopia igual a qualquer outra e, em razão disso, ignorar a poça infecta é manter-lhe a inconveniência. 
Não menospreze, assim, a lição do momento, na certeza de que renovamos idéias, experiências e destinos, cada dia, segundo as particularidades das manifestações de nosso livre-arbítrio. 

André Luiz